Não há dúvidas de que Armando Emílio Guebuza é uma figura de incontornável revelo na história política e socioeconómica de Moçambique. Em suas biografias, o arrojo de um jovem peregrino que larga tudo e segue por tortuosos (des)caminhos ao encontro do movimento de libertação de Moçambique é dramaticamente narrado com apelos de exaltação messiânica a um predestinado salvacionista.
O percurso político de AEG, muito antes do apogeu a que ascendeu como PR, já estava lapidado nas múltiplas tarefas que assumira ao longo da conjuntura socialista que o país "escolheu" percorrer, independentemente das reflexões a que hoje nos damos ao luxo de, retrospetivamente, fazer sobre um mundo polarizado entre "socialismo" e "capitalismo", com aberturas e escolhas limitadas para os países emergentes. AEG, como muitos outros que lideraram o "inglório roteiro socialista", excederam-se nas tarefas que lhes foram atribuídas, que executaram sem dúvidas com zelo e até gozo, num campo de actuação onde o direito a existência era tão susceptível à volatilidade de apetites e humores de indivíduos e enrustidos em mantos de institucionais. Ontem, como hoje.
AEG leva a fama de ter recuperado a ideia de "disciplina partidária", ao desencadear movimentos de surdina, que culminaram com a renovação do apoio político ao partidão a partir das bases, reacendendo a veia de "comissário político".
Já na presidência, procurou assegurar tais lealdades políticas ao instituir o simultaneamente inovador e mal parado projecto dos 7 milhões de meticais por distrito. Enquanto se aprimora o entendimento da abordagem clientelista como inibidora de uma cultura bancária, que não se perca de vista a possibilidade de os 7 milhões terem servido como fermenta de aposta na compra de consciências e lealdades de base e que se metamorfoseiam em função das circunstâncias. Ainda estão por contar eventuais "histórias de sucesso" dos que se beneficiaram dos famigerados 7 milhões e que possam posar a investidores que saldaram suas dívidas relacionadas com o que, em princípio, supunha-se ser um empréstimo e que, se tenham firmado como "empresários de sucesso", qual rótulo reivindicado por pais presidentes a enaltecerem filhos nem tão pródigos.
Antes mesmo da vermelhidão das comichões que os 7 milhões deixaram, o curioso é lembrar da bandeira que AEG içou bem alto no processo de firmamento da sua liderança: O "combate ao deixa andar". A simbolizar a sua determinação, altos funcionários vinculados a posições de segurança do Estado, como ex-Ministro do Interior, foram presos. Ainda que vagamente, quando a tempestade bateu na sua canoa, AEG deixou o seu "mea culpa" quando aludiu a seus próprios excessos quando retrucava de discurso de camarada seu que não alinhava com sua postura. Além de alegar desconhecer os nhangumeles da vida, incomodou-me a possibilidade de aludir a perda de memória e potencial inimputabilidade da/na função de PR. Mas o trágico não é só isso. É não conhecer os massagistas que lhe teriam facilitado as "bolada" de protecção costeira que, na "casa do povo", arrogou predisposição para repetir.
Ironicamente, o seu sucessor, escolhido a dedo e criado no colo, na primeira oportunidade que teve de dar uma entrevista recomendou, convenientemente, o oposto: "o melhor deixar", o que é sintomático dos reveses que caracterizam o mundo que AEG legou a seu sucessor, que agora se desdobra em inconciliáveis papéis de protector e traidor, no difícil jogo de equilíbrio que tem de fazer para manter-se no trono que se sustenta em corda bamba.
No imaginado mundo de AEG, havia patos como "assets" (activos) para a prosperidade e 50 milhões de galinhas geridos por filhos e acionados como óleo da ternura para massagear sistemas. Não espanta que o legado de AEG tenha criado um bando de deputados relaxados e afrouxados, agora potencialmente incapazes de o proteger. Tão pouco se pode fiar no G40 da vida, instituído como guarda pretoriana para inventar base ideológica e/ou filosófica para sustentar insaciável apetite de poder e dinheiro trasvestido em compromisso patriótico. Tão patriótico quão egocêntrico que não teve dificuldades de vir dizer, em sede de assembleia, que, se as circunstâncias fossem as mesmas "teria agido da mesma maneira".
Volvidos quase 5 anos sem AEG no poder, as ditas circunstâncias (político-militares), não se alteram substancialmente, salvo pela partida do aguerrido e beligerante opositor AD. Nestas circunstâncias, se lhe fosse dada oportunidade, estaríamos a falar em 100, e não em 50, milhões de frangos para lubrificar o sistema e alimentar uma estrutura político governativa assente em pés de barro, dinheiro, falsos moralismos e lealdades político partidárias adoçadas à colherinhas à boca do caldeirão de sopa.
Hoje, na resiliente estrutura de protecção de AEG, que perpassa FJN, pactos são feitos e intentonas de construção do quiméricos perfis de presidenciáveis "menos maus" são vocalizados, a ponto de se promover uma vaga ideia de falta de escolha. Um cenário de fatalidade regressiva, a que se tem de voltar (ou votar!?) nos mesmos de sempre, que na verdade nem sempre foram eleitos, salvo pelos arranjos e cumplicidade do "corpo de salvação eleitoral" que até ousa ignorar a racionalidade matemática, à luz do dia, agarrando-se a apriorismos políticos e autoritários.
O fazedor de poeira é esse indivíduo que, em nome da nação, assumiu pactos comerciais que favoreceram filhos e subordinados, que não tem pudor em ignorar o questionamento que lhe é feito sobre as suas escolhas e decisões; que diz nunca ter lido o relatório de auditoria feito sobre a negociatas que aprovou e que hoje expressa revolta pela quantidade de poeira (muita poeira) que mal sabe de onde possa ter surgido, se "espontaneamente ou se por objectivos escusos". Quem te viu e quem te vê! Quem diria que o Régulo das ocultas, o verdadeiro Soba do obscurantismo, o PR das dívidas ocultas, que teve o desplante de afrontar o parlamento e dizer que se pudesse faria de novo, solte a língua e fale de "motivações escusas", que aparentemente lhe ultrapassem? Mas quem ousa levantar tanta poeira a ponto de ofuscar o brio de AEG, o "construtor", o "filho mais querido" de tal pérola do índico?
Partilho do desaconchego. Mais do que falar de partículas indefinidas de poeira no ar, o PR mais adulado e celebrado pelo aparato de protecção e celebração de si, já criado, que saía do lugar comum de escudar-se no obscurantismo que quis estabelecer como vestimenta que carateriza este imbróglio das dívidas, sacuda a poeira e venha a terreiro explanar das suas cristalinas verdades. Enquanto tiver mãos, que não meça esforços para sacudir tal poeira e revelar verdades que, a seu ver, nos faltam.
Pois, pelo curso dos acontecimentos, não haverá poeira que baste para tecer inescrutável indumentária para este rei, fazedor de poeira, que anda cada vez mais despido. Quase nu.
Se o "Indivíduo" que provocou deliberadamente o calote diz que sente que "há muita poeira, uma espontânea e outra, provocada", imagina então malta nós que fomos apanhados de surpresa. Se ele que o filho recebeu 50 milhões de dólares vê poeira nisto tudo, imagina então malta nós que não vimos nenhuma folha.
Este texto é escrito a respeito da febre de enchimentos que grassa o país. Todo o mundo quer encher alguma coisa: os lábios, os glúteos, os seios, os bicípites e outros músculos, incluindo o músculo que está a pensar. Isto a nível do corpo humano. Por outras esferas: os bolsos, as estatísticas, as facturas, o “chapa”, as urnas de votação, a lista das “marandzas” e por ai em diante. Uma autêntica e veloz corrida aos enchimentos. Na senda, partilho abaixo um episódio interessante (acho) de um dos empolamentos mais procurados da florescente indústria de enchimentos em Moçambique.
Há uns anos um grupo de quatro funcionários de uma instituição da capital do país esteve em Lichinga, província de Niassa, numa jornada laboral. Um bónus de um final de semana pelo meio - intencionalmente encaixado para uns dias extras de ajudas de custo e de lazer com as contas pagas – foi aproveitado pelos viajantes para uma merecida tarde de sossego no Lago Niassa. E já agora: encherem a lista de locais visitados e as redes sociais com as melhores imagens (fotos e vídeos).
Chegados ao Lago e devidamente instalados numa sombra de pau-a-pique os colegas foram passando a tarde na companhia de líquidos nacionais e do delicioso peixe local que é uma das atracções da bela praia do Lago. O ambiente estava agradável e o papo seguia a mesma onda. Cada um foi descrevendo peripécias de viagens anteriores em trabalho e o devido aproveitamento para uns dias de turismo. Um deles contou que certa vez conseguiu enquadrar a família numa dessas viagens de trabalho. Um outro colega disse que fez o mesmo com a diferença de ter enquadrado uma “Emília” e não a família. Em fim, outros enchimentos e com as contas pagas.
A dada altura, um senhor de idade - que por ali zanzava com um saco e ares de quem estivesse em actividades de pesquisa - tomou a direcção dos “vientes” (não da terra/província). Depois de anunciar a entrada, pousou o saco e cumprimentou o grupo com honras militares. Uns minutos depois já estava palavreando sobre a sua vida, ressaltando na fala a troca do “r” pelo “l”. Na sua trajectória sobressai o facto de ter sido, no tempo do governo de Salazar, um marinheiro da armada naval portuguesa. E para quem quisesse tirar a prova dos nove o velho prometeu mostrar a farda e o álbum de fotografias.
Depois de algum tempo a entreter o grupo com a sua história – uma estratégia de “marketing” – o velho exibiu o conteúdo do saco: um suposto produto que tornava resiliente o membro masculino. Segundo as palavras do velho “o membro enchia e não caia” (pressupondo a queda em combate), ditas enquanto mostrava e descrevia outras maravilhas do mágico produto. E para dar mais crédito recorreu da própria experiência, anotando que mantinha a sua mulher – bonita e muito jovem - graças ao produto e por nenhum outro motivo. A-propósito: o nome do tal produto foi ocultado para não influenciar as vendas e o potencial risco de alguns indicadores do sector da saúde sofreram uma subida negativa e considerável.
Encerrada a sessão de “marketing” passou a de certificação do produto. Para tal cada um ligou para familiares e amigos a nível nacional. Muitas chamadas foram para Tete e Sofala, províncias com fama no tipo de produto em causa. Aliás e para recordar, numa das recentes edições da Facim, a principal feira de negócios de Moçambique, foi um produto semelhante – e de uma das duas províncias – que foi o mais procurado, tendo esgotado nos primeiros dias quando não nas primeiras horas.
Concluído o “due diligence” o resultado favoreceu as finanças do velho. Com a aquisição os quatro colegas - animados com o produto e encorajados com o respectivo “no objection” popular - delineiam os respectivos planos e o “casting” para a necessária estreia. Pelo desfecho do “casting” o produto não se destinaria ao consumo caseiro, contrariando a experiência do velho quanto as vantagens do seu uso doméstico. Contudo, as duas abordagens concorriam para o mesmo objectivo: a manutenção.
Cumprido o objectivo da ida ao Lago Niassa e na efusiva solenidade de despedida do velho marinheiro – pela companhia e pelo mágico produto - este fez questão de fazer um aviso à navegação quanto ao uso do produto adquirido. A advertência foi clara e sombria: o produto apenas funciona para situações de complemento (reanimação) e não de falecimento (ressuscitação) do ente querido. (Se) “Molleu, Molleu!”: foram as fulminantes palavras do velho marinheiro enquanto batia em retirada. Uns passos depois, notando que o grupo estava com sérias dificuldades de digestão e para que não ficasse nenhuma réstia de dúvidas, o velho - em tom jocoso e bem audível - enfatizou: Molleu, Molleu!
PS (i): o recurso a certos sectores da florescente indústria de enchimentos pode ser satisfatório em curto prazo e estar a ocultar situações que possivelmente careçam de outro tipo de intervenção e para outro tipo de resultados em médio e longo prazo. Apostar em soluções de ressuscitação talvez fosse melhor e sustentável do que as de reanimação. E pelos vistos ninguém/o país não se dá ao trabalho de investir (não se enche de ideias) para criar as condições necessárias nesse sentido, incluindo o velho marinheiro do Lago Niassa.
PS (ii): num texto anterior e a reboque de eleições que se avizinham, mormente quanto aos polémicos dados e ditos empolados da província de Gaza sugeri, a título de ajuda, aos gestores das eleições (CNE/STAE) que declarassem a inclusão, no recenseamento eleitoral, de dados da Faixa de Gaza (médio-oriente),quiçá, uma extensão ultramarina – e por reivindicar - do antigo Império Nguni (de Gaza). Na sexta-feira passada, a CNE veio a terreiro confirmar os dados de Gaza. Na prática a CNE reiterou a posição inicial que entra (pelo que se consta) em colisão com os dados/previsões do INE, Instituto Nacional de Estatísticas. Resumindo: Tudo na mesma. E na mesma continua também a minha sugestão.
O PR Filipe Nyusi acaba de exonerar Edmundo Carlos Alberto do cargo de Procurador-Geral adjunto da República. Só espero que não seja para nomeá-lo Procurador-Geral da República porque ele é, de facto, uma figura completamente inútil ao sector da Justiça. Nunca ninguém soube o que ele faz. Desde os tempos em que foi vice-Ministro do Interior, Carlos Alberto tornou-se mais conhecido pela sua ausência e incompetência. Aliás, nessa altura houve um episódio em que ele sonegou informação numa investigação do jornalista Carlos Cardoso sobre roubo de carros. Nessa altura, sua credibilidade foi muito afectada porque pareceu ter ficado claro que ele estava a defender os larápios. Era uma espécie de polícia protegendo ladrões.
Ya! Compatriotas, gostaria apenas de recordar-vos que Abel Xavier era simplesmente a pessoa que tinha sido encarregue de SELECIONAR-A-DOR. Não é ele a nossa DOR. A DOR, que ele teimava em SELECIONAR e TREINAR, ainda continua connosco.
O que eu quero dizer é o seguinte: o facto de Abel Xavier ter deixado os Mambas não significa que começaremos a ter melhor prestação. Não! Significa que temos que começar a debater o nosso futebol seriamente. Significa que temos que combater as causas do nosso fracasso. O afastamento do Abel é - talvez - a primeira fase de um processo que se espera longo e difícil. É um bom começo, diga-se!
A Universidade Pedagógica de Maputo (UP-Maputo), na sua nova versão, tem a honra de voltar a homenagear um dos mais talentosos e nobres músicos moçambicanos, Gabriel Ruben Chiau. Octogenário e cuja paixão pela música se estende desde a longínqua década de 50, na missão Suíça, pela mão pastor Daniel Clerc. Gabriel Chiau, como carinhosamente o conhecemos, tem, ao longo de décadas, personificado, com mestria, os propósitos do homem e da sua mente.