Começo este pequeno rabisco com um trecho da música do renomado grupo moçambicano de HIPHOP – Gpro-Fam. Um clássico com mais de 20 anos, e que permanece actual pela sua forte mensagem de caris socio-político e pela futurologia que estes rapazes emprestaram ao momento.
Com o título (País da Marrabenta), a música diz logo no início: “Passe o tempo que passar, um nome ficará eternamente gravado na história de Moçambique – O Nome de Samora Moisés Machel (…)
O País da Marrabenta vai de mal a pior, mas paciência Moçambicanos tem de melhor”.
A música é uma clara alusão ao Patriotismo de Samora Machel, figura incontornável do nosso Moçambique; e também ao espírito de paciência e optimismo do povo Moçambicano.
Terminado o ciclo governativo liderado pelo Presidente Armando Guebuza, inaugurou-se um novo ciclo; ciclo este sob liderança de Filipe Jacinto Nyusi. Diga-se, um ciclo inaugurado com um tema antigo e candente, que ocupa lugar de destaque dentro e fora do país, e domina a agenda do dia – as dívidas ocultas. Dívidas estas que colocaram o país numa situação degradante e com um descrédito internacional nunca antes visto.
A já difícil vida da população da Pérola do Índico piorou exponencialmente; a retirada do apoio dos principais financiadores do Orçamento Geral do Estado colocou o país numa situação bem mais difícil, com contas por pagar e processos internacionais por gerir; a nova carga fiscal, o agravamento dos preços de produtos básicos começaram a asfixiar o bolso do cidadão ordinário que já vivia em situação contingencial.
A escolha de Filipe Jacinto Nyusi para candidato pelo partido do batuque e da maçaroca, colocou imediatamente a máquina de propaganda a trabalhar dia e noite – era importante garantir que a socialização acontecesse dentro do tempo e que a aceitação popular fosse uma certeza inequívoca.
Gerou-se uma grande expectativa em torno destes dois mandatos. Dez anos em que a popularidade chegou a ser das mais altas no início, muito por conta do seu discurso incisivo e arrebatador da tomada de posse e, pragmatismo promissor na formação do seu primeiro governo. Mas a popularidade foi se enfraquecendo a medida em que sua governação dava marcas de pouca assertividade.
A forte, audaz e inteligente a máquina de campanha do seu partido fez milhões de moçambicanos, do Rovuma ao Maputo e do Zumbo ao Índico cantarem, dançarem e acreditarem que a confiança depositada brotaria em mudanças práticas e visíveis para o país, e que de facto o país tinha tudo para dar certo.
Confesso que para mim, particularmente as duas campanhas destes dois mandatos foram das mais bem conseguidas em termos de envolvimento e cadência – parecia haver uma sintonia inegável entre as músicas e as mensagens de prosperidade e de confiança. Por isso escutamos, cantamos e dançamos todos o “Eu confio em ti Nyusi”.
Nyusi chega ao poder com muita responsabilidade enquanto estadista; carrega um fardo que ele mesmo ajudou a encher enquanto Ministro da Defesa Nacional. Apresenta-se como um Presidente de ruptura com o guebuzismo, e auto proclama-se empregado do povo – para o delírio de milhões de moçambicanos que se sentiram patrões do Presidente.
Vivemos, nos últimos dez anos, dois mandatos de muita sagacidade governativa com muitas experiências para mais tarde lembrar e tirar as devidas ilações.
A meias com um fardo pesadíssimo e super delicado – das ocultas, sua governação foi também marcada pelo recrudescimento da insurgência que grassa Cabo Delgado desde 2017, pela passagem de ciclones altamente destrutivos e mortais, sofisticação do crime organizado, aprimoramento das redes de raptos e pela carestia do nível de vida no seu todo. Estes são apenas alguns dos aspectos que me ressaltam trazer em revista.
Cinco anos mais tarde, a máquina brindou o eleitorado com mais um hit forte e envolvente - “É contigo que dá certo”. É o último mandato e, era preciso corrigir e melhorar o que não correu bem no primeiro mandato. Mas entre a teoria e prática há uma distância considerável.
No ano em que mais um reinado chega ao fim, penso que como sociedade devemos lançar um debate público, sincero e honesto sobre o actual estágio do nosso país; sobre o país que queremos deixar para os nossos filhos e netos. Precisamos de um manifesto social que deve guiar todo e qualquer governante que pretenda governar e promover o desenvolvimento, a justiça social, os direitos humanos e o respeito pela dignidade da pessoa. Este manifesto deve necessariamente conter as demandas, os anseios e sonhos deste povo amordaçado, sofrido, porém resiliente.
Na hora do adeus, podemos dizer que foram dez anos em que aprendemos a adjectivar e a positivar o Estado Geral da Nação; tivemos muita melodia, muita dança e poucos resultados governativos.
No “Eu confio em ti”, o povo até chegou a confiar em ti e no seu governo Senhor Presidente. Mas no “É contigo que dá certo”, parece que deu tudo, menos certo.
Por: Hélio Guiliche
“Ainda hoje, muitos não sabem que foi um livro que deu origem ao acontecimento que mudou o País em 1974 e que bastou ao mais prestigiado General Português de então apenas uma frase-choque para derrubar em poucos dias o Regime (a vitória exclusivamente militar é inviável). Essa declaração do General António de Spínola, no seu livro (Portugal e o Futuro), sobre a guerra no Ultramar, arrasou por completo a credibilidade do Governo de Marcelo Caetano e provocou um autêntico terramoto no País”
Mas coloca-se a questão: esse livro foi muito lido? Se teve algum impacto na sociedade Portuguesa?
A resposta a essa pergunta é dada por Leonidio Paulo Ferreira, do Diário do Noticias de Portugal, Lisboa.
“Sim, muito lido e com grande impacto. Spínola não era um oposicionista nesta altura. Era uma figura do regime, que tinha comandado as forças armadas na Guiné e que ocupava o cargo de Vice-Chefe do Estado Maior das Forças Armadas. Por isso, o livro representou a admissão por parte de uma figura militar cimeira de que Portugal não conseguiria vencer as guerras militarmente e de que o futuro teria de passar necessariamente por uma solução política. É certo que Spínola não é a primeira pessoa a dizê-lo, mas isto dito e publicado, repito, por uma figura de destaque, funcionou como uma verdadeira pedrada no charco e teve grande acolhimento em meios políticos e militares, em círculos diplomáticos e empresariais, na sociedade em geral.”
In Leonídio Paulo Ferreira, Diário do Noticias
Em Moçambique e de uma forma geral, fala-se muito pouco sobre as reais causas do 25 de Abril de 1974, provavelmente, para não ofuscar a Luta de Libertação Nacional, desencadeada pela FRELIMO – Frente de Libertação de Moçambique, contudo, julgo eu que o não aprofundamento das causas do 25 de Abril de 1974, simplesmente, nos empobrece como nação, porque ficamos com um saber amputado.
Na recente passagem por Portugal, como é meu hábito, percorri algumas Livrarias de Lisboa, à procura de Literatura sobre o 25 de Abril. Recebi muitas recomendações, de amigos e até de alguns convivas de ocasião, mas em nenhum momento me falaram do Livro do General António de Spínola, com o título “Portugal e o Futuro”, lançado no dia 22 de Fevereiro de 1974. Também ninguém me falou da obra do João Ceu e Silva, com o título “O General que começou o 25 de Abril, dois meses antes dos capitães”, cuja 1ª edição aconteceu em Fevereiro de 2024.
Segundo o autor do Livro “O General que começou o 25 de Abril dois meses antes dos Capitães” João Ceu e Silva, com destaque no primeiro parágrafo desta reflexão, efectivamente, são muito poucas pessoas que relacionam o 25 de Abril de 1974, com a obra do General António de Spínola, com o título “Portugal e o Futuro” mesmo em Portugal, mas o mais relevante nesse livro é o reconhecimento do General António de Spínola de que “a vitória, exclusivamente militar, é inviável”. Portanto, isto, dito por um militar do nível do General, naturalmente, provoca um grande impacto na sociedade no geral e nos militares de baixa patência, por isso caberia aos capitães a materialização de um Golpe de Estado que deita abaixo o Estado Novo de Marcelo Caetano.
Se o Livro com o título “Portugal e o Futuro” teve um impacto tremendo no seio da sociedade Portuguesa, quer me parecer que as “Províncias Ultramarinas” se mantiveram indiferentes às correntes de então. Só assim se pode justificar a reacção dos portugueses residentes em Moçambique, em relação aos Acordos de Lusaka, assinados entre Portugal e a FRELIMO – Frente de Libertação de Moçambique.
Nos acordos de Lusaka, resultado das reuniões de 05 a 07 de Setembro de 1974, o Governo Português fez-se representar pelas seguintes figuras que assinaram o documento: Ernesto Augusto Melo Antunes (Ministro sem Pasta), Mário Soares, (Ministro dos Negócios Estrangeiros), António de Almeida Santos (Ministro de Coordenação Interterritorial), Victor M. Trigueira Crespos (Conselheiro do Estado), Antero Sobral (Secretário do Trabalho e Segurança Social do Governo da Província de Moçambique) Nuno Alexandre Lousada (Tenente Coronel de Infantaria), Vasco Fernando Leote de Almeida e Costa (Capitão Tenente da Armada) e Luís António de Moura Casanova Ferreira (Major de Infantaria). Por parte de Moçambique, rubricou Samora Moisés Machel, na qualidade de Presidente da FRELIMO – Frente de Libertação de Moçambique.
No texto do acordo, saliento os dois primeiros pontos que são:
“1- O Estado Português, tendo reconhecido o direito do Povo de Moçambique à Independência, aceita por acordo com a Frente de Libertação de Moçambique a transferência progressiva dos poderes que detém sobre o território nos termos a seguir enunciados.
As reacções de grupos radicais não se fizeram esperar, no entanto, contra a reacção dos colonos radicais de Lourenço Marques, houve uma reacção à altura de pretos pro-Frelimo, residentes na Cidade de Lourenço Marques (poucos) e muitos outros nos arredores da Cidade, com destaque para o popular Bairro da Mafalala. Aqui veja o que encontrei na internet sobre o assunto:
“Alguns membros do grupo Galo eram militantes clandestinos da FRELIMO desde a criação do movimento nacionalista em 1962. Outros eram soldados no Exército colonial português, alguns na reserva e outros ainda em serviço. Mas a grande maioria parece ter aderido a partir das várias células de esclarecimento e mobilização postas a funcionar pelos grupos pró‑FRELIMO logo após o 25 de Abril. A posição anti‑FRELIMO do sector colonial mais radical, integrando grupos extremistas e paramilitares, bem como do movimento Frente Independente de Convergência Ocidental – FICO (todos integrantes do MML), também teve um efeito na popularidade da FRELIMO entre a população africana de Lourenço Marques e arredores. Tudo leva a crer que a euforia da liberdade, a esperança do fim do regime colonial, a confrontação aberta entre os grupos contra e pró‑FRELIMO tenham reavivado a memória das humilhações coloniais entre a população africana de Lourenço Marques. É neste quadro que se pode situar a grande onda de violência que os africanos levaram a cabo entre 7 e 10 de Setembro e, mais tarde, a 21 de Outubro, em resposta à ainda mais brutal actuação dos grupos coloniais extremistas paramilitares. Mas a violência do 7 de Setembro foi, em geral, um efeito “natural” do fim de um regime colonial que sempre assentou na violência. Como sublinhou Frantz Fanon, a descolonização é sempre um fenómeno violento (2004: 35)”.
In Revista Críticas de Ciências Sociais nº 106 de 2015, Galo amanheceu em Lourenço Marques.
Por tudo isto, penso que vale a pena aprofundarmos o nosso conhecimento sobre o 25 de Abril de 1974 em Portugal. Na teoria, éramos mesmo País, simplesmente, nós estávamos no Ultramar. Os acontecimentos em Portugal, naturalmente, afectam-nos, como nos afectou o 25 de Abril de 1974 de forma positiva. O reconhecimento deste facto não coloca em causa o mérito da Luta de Libertação Nacional, antes pelo contrário, valoriza a nossa luta. Nós, africanos falantes do português, somos a causa do 25 de Abril, devemo-nos orgulhar disso.
Adelino Buque
Já que estes dias estamos, o país inteiro, a falar de perfis - perfil aqui, perfil acolá -, gostaria de sugerir que o nosso próximo chefe de estado seja alguém com eles no lugar. Grandes e bons. Com eles bem no lugar para renegociar os contratos que o Estado moçambicano tem com as várias multinacionais chafurdando no nosso solo pátrio. Todos eles favorecendo-lhes em tudo: quantidades, receitas, lucros, impostos e nem sequer obrigando-as ao processamento interno das matérias primas. Em quase nada beneficiam o nosso Estado; não beneficiam o Governo, não beneficiam Moçambique, muito menos os moçambicanos. Pelo contrário, só legitimam a espoliação desenfreada das nossas riquezas!
Um dos grandes saltos que a Tanzania de John Magufuli (2015 a 2021) deu nos últimos anos foi justamente nesta matéria. O falecido chefe de estado tanzaniano pegou nos contratos com multinacionais, renegociou-os e estabeleceu termos que beneficiam de verdade o seu país e os seus compatriotas. Revisou projectos ferroviários, arrancando-os de chineses para turcos; reformulou contratos nos sectores de mineração, petróleo e gás - justamente o que temos em mão -, nalguns casos obrigando ao processamento interno; e introduziu reformas nas finanças públicas, na saúde e educação. Hoje, Tanzania está a dar passos fabulosos!
Enquanto não formos capazes de pegar o búfalo pelos chifres, continuaremos a oferecer ao desbarato os nossos imensos e abundantes recursos naturais, não daremos passos significativos no almejado desenvolvimento.
A nossa energia da HCB, os sul-africanos apossam-se dela a preços de banana - ainda bem que o contrato está a terminar, 2029 está já ali, altura propícia para estabelecer novos termos e preços que beneficiem de verdade Moçambique e seu povo! Já que estamos em Tete… o nosso carvão a ser autenticamente esbulhado e nós pura e simplesmente a contemplarmos até o sofrimento do nosso povo, os concidadãos em Tete, mal reassentados, não compensados e sem quaisquer benefícios sérios, senão as inacabáveis poeiras e buracos colossais.
Temos aqui nas nossas barbas a MOZAL a entreter os nossos compatriotas de Beluluane e as autoridades do país há cerca de 30 anos com escolinhas primárias e postinhos de saúde, enquanto vai pagando o mínimo dos mínimos de impostos, embora arrebatando biliões e biliões de dólares de lucros. Como todas as outras multinacionais, até tem a coragem de nem sequer pôr em condições as estradas que os seus camiões usam e estragam para escoar para o estrangeiro o alumínio que produz… Se os tivéssemos no lugar, há muito que naquelas bandas teríamos tido ou um hospital de verdade, de nível provincial; ou uma escola técnica de nível superior; ou, no mínimo, a MOZAL a participar na manutenção daquelas estradas à volta e as que levam os seus produtos. Como não os temos…
As areias pesadas… em todo o lado onde se está a extrair as areias pesadas, só avulta descontentamento, fúria, zanga e revolta popular, ante a cobardia das nossas autoridades, locais e não locais, elas próprias só a ver navios. Em Chibuto, os chineses, depois de um reassentamento e compensações insultuosos, revoltantes, não só não põem em condições as vias por onde passam e estragam os seus camiões transportando areias pesadas, como nem hospital ou escola ousaram por lá construir; ou pelo menos ajudar a vila municipal de Chibuto a resolver os eternos problemas de água. Neste momento, está-se como se não estivesse ali a Deng Sheng; no entanto, esta vai esbulhando o minério como quer e pode, sem controlo, nem fiscalização (aliás, nunca ouvi dizer que deputados da nossa AR uma vez lá tivessem ido fiscalizar….). De Moma, os gritos de descontentamento, fúria, revolta e zanga são igualzinhos… e nem para lá um deputado foi/vai pôr pé!
De fazer deitar lágrimas está a situação das multinacionais que estão a extrair o gás, a começar pela SASOL, conosco há cerca de 20 anos. Primeiro, só ela é que sabe que quantidades de gás tira de Moçambique; segundo, é a SASOL-filha que extrai gás em Moçambique e manda para a SASOL-mãe na África do Sul; terceiro, a SASOL-filha vende o gás à SASOL-mãe a um preço muito abaixo do praticado internacionalmente. No mercado, cada gigajoule custa cerca de oito (8) dólares norte-americanos, mas o nosso gás as SASOL’s vendem-se a 2.1 (dois ponto um) dólares norte-americanos cada gigajoule!... quarto, dos lucros, segundo os acordos, o Estado moçambicano devia receber APENAS 5%, que subiriam gradualmente até 40%, algo que nunca aconteceu!... ademais, a SASOL pode deduzir nesses míseros cinco por cento despesas de exploração, operacionais e outras, o que tem feito religiosamente… Como se tudo isto que as nossas autoridades conhecem de olhos fechados não fosse abominável, abjecto, revoltante, e não tugem, nem mugem; o reassentamento que realizou é da maior indignidade possível; Pande e Temane são das regiões mais pobres de Inhambane e de Moçambique! Ou seja, estão como se encontram regiões do país onde não se explora gás: hospital sério, escola técnica séria, estradas, energia eléctrica e água… NADA! É como se a SASOL não existisse!
Da exploração de gás na bacia do Rovuma… nem sabemos quantos carregamentos já foram feitos, soubemos apenas do primeiro! E muitíssimo pouco sabemos dos pagamentos!
Tudo isto e muito mais só acontece porque nós não os temos. A nossa política de atracção de investimentos precisa de uma grande reformulação, está completamente descontextualizada. Precisa de uma revolução, urgente e radical. Não podemos continuar a oferecer de bandeja os nossos recursos sob pretexto de que estamos a atrair investimentos; se alguém vem investir em Moçambique é porque quer ganhar dinheiro. Não podemos continuar a isentar de pagamento de impostos a qualquer que seja o investidor indefinidamente sob pretexto de mobilização de investimentos. Magufuli aumentou os impostos e pôs Tanzania a receber metade dos lucros. Moçambique tem que receber CINQUENTA POR CENTO (50%) dos lucros da exploração dos seus recursos naturais.
Para tanto, precisamos de um governo com eles. De um chefe de estado com eles no lugar para inverter este horrível, ignóbil, frustrante, revoltante cenário em que Moçambique e os moçambicanos só estão a chuchar!
Eis o meu recado ao próximo Presidente da República!