Com o crescimento do ambiente “hostil e turbulento” às liberdades de expressão e de imprensa, no país, tal como avançou o MISA-Moçambique, no seu Relatório sobre o “estado das liberdades de imprensa e de expressão em Moçambique (2019-2020)”, os jornalistas de diversas rádios comunitárias, espalhadas por todo o território nacional, mostram-se preocupados com o aumento do número de casos de violação dos seus direitos, durante o exercício das suas funções.
Falando esta quinta-feira, durante a “conferência nacional sobre segurança para jornalistas e, em particular, das rádios comunitárias”, organizado pelo Fórum Nacional das Rádios Comunitárias (FORCOM), estes contaram estarem a trabalhar com medo, depois das experiências vividas em ambientes eleitorais, assim como na cobertura dos ataques terroristas, na província de Cabo Delgado.
Um dos jornalistas que partilhou a sua experiência é Amade Abubacar, que, até 2019, trabalhava para a Rádio Comunitária de Nacedje, no distrito de Macomia, província de Cabo Delgado. Abubacar contou que, nos últimos dias, tem trabalhado com medo, por estar num território que regista conflitos, referindo-se aos ataques terroristas, que ceifam vidas naquela província do norte do país.
Aliás, devido a sua cobertura jornalística aos ataques terroristas, Amade Abubacar foi detido pelas Forças Armadas de Defesa de Moçambique (FADM), a 05 de Janeiro de 2019, quando fotografava famílias que abandonavam a região com receio de novos ataques armados. Dias depois, concretamente, a 06 de Fevereiro de 2019, foi a vez do seu colega Germano Adriano, também ser detido pelas FADM.
“Não há segurança no nosso trabalho e nenhum jornalista estava preparado para trabalhar neste tipo de cenário. Pedimos a quem é de direito para que interceda por nós”, apelou a fonte.
Quem também clama pela segurança é a jornalista Madalena Issufo, da Rádio Comunitária do Niassa, que admite ficar preocupada sempre que sai para exercer a sua profissão, porque não tem quem garanta a sua integridade física.
“Dificilmente nos sentiremos seguros nesta profissão, principalmente, nós que trabalhamos nas rádios comunitárias, porque estamos nas zonas mais recônditas, onde não há segurança”, sublinhou.
Na sua intervenção, a Directora Executiva do FORCOM, Ferosa Zacarias, afirmou que, em 2020, houve relatos de agressões físicas a jornalistas das rádios comunitárias, dando o exemplo do ataque à vila-sede do distrito de Muidumbe, em Cabo Delgado, que culminou com a destruição da Rádio Comunitária São Francisco de Assis. Na ocasião, alguns jornalistas tiveram de se refugiar nas matas.
“Todos os indicadores de segurança para jornalistas não estão a ser devidamente respeitados em Moçambique, o que afigura uma grave ameaça aos direitos dos jornalistas, em geral, e os das rádios comunitárias em particular”, considera a fonte, para quem quando o jornalista é negado o direito de aceder a informações sobre assuntos políticos, “tomamos isso também como uma ameaça ao exercício do jornalismo comunitário”.
Convidado para o evento, António Boene, Presidente da Comissão dos Assuntos Constitucionais, Direitos Humanos e de Legalidade, na Assembleia da República, afirmou que o parlamento irá verificar se a correcção destes problemas passa por uma eventual revisão legal dos instrumentos legais existentes ou que os mesmos precisam ser efectivados.
Realçar que há mais de um ano que não há informações sobre o desaparecimento do jornalista e locutor da Rádio Comunitária de Palma, Ibraimo Mbaruco, raptado no dia 07 de Abril de 2020, quando regressava de mais uma jornada laboral. (Marta Afonso)