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Política

Por ocasião dos quatro anos da sua presidência, o Presidente Filipe Nyusi redigiu uma mensagem, onde reafirma “o nosso compromisso assumido, a 15 de Janeiro de 2015, de servir o povo com humildade, dedicação e objectividade”. O Presidente garante que se mantém fiel ao programa de governação, “com realce nas áreas prioritárias com o propósito de promover a segurança alimentar e nutricional, promover mais o acesso à energia, viabilizar o desenvolvimento da economia, o aumento de rendas das famílias moçambicanas e o desenvolvimento humano através de um maior acesso à educação, saúde, água e saneamento, entre outras”.

 

Ele diz que sua governação continuará a dar atenção às crianças, jovens, mulheres e idosos. “Estamos conscientes dos enormes desafios que se colocam no cumprimento deste programa, mas sempre contamos com o apoio e o trabalho árduo de todos os compatriotas, incluindo o sector privado nacional, a quem vai a nossa sincera gratidão por se empenharem no nosso projecto comum que é de paz, aumento da produção e produtividade, sobretudo no sector da agricultura”.

 

O combate à corrupção, à criminalidade e aos ataques protagonizados por insurgentes em Cabo Delgado são, também, abordados na mensagem do PR. “Continuaremos a dedicar as nossas energias ao combate à corrupção porque estamos cientes dos seus efeitos nefastos na nossa agenda de desenvolvimento sustentável e inclusivo… contamos com o apoio de todos no combate, sem tréguas, à criminalidade e na eliminação dos ataques protagonizados por malfeitores no norte da província de Cabo Delgado, onde lamentamos a perca de vidas e destruição de bens de moçambicanos conseguidos com grande sacrifício”.

 

Filipe Nyusi disse ainda que “continuamos, igualmente, firmes na promoção da exploração sustentável dos nossos recursos naturais, sempre procurando criar as condições para que cada moçambicano tenha um quinhão no seu usufruto, embora reconheçamos tratar-se de um processo gradual e permanente”. A mensagem do PR encerra com a referência a "uma demonstração da vontade suprema de trabalhar para a construção de uma Nação moçambicana próspera e forte." (Carta)

A prisão de Manuel Chang caiu que nem uma bomba e uma vasta maioria da opinião pública alimentou logo uma percepção, compreensível mas errônea, segundo a qual nada estava a acontecer na investigação lançada internamente em Janeiro de 2017. Que tudo estava bloqueado pelo poder político. Mas não era bem assim. Não foi. A PGR, com seus limitados recursos, sem meios e peritos, procurou cumprir o seu papel. Esbarrou-se em muitos bloqueios. O mais complicado foram as próprias entidades do Estado. O calote foi orquestrado no coração da secreta nacional. Como tal, os investigados usavam e abusavam dos seus poderes, mostrando arrogantemente que eram uns intocáveis. Essa atitude foi tomada por boa parte dos arguidos do processo interno de corrupção.

 

O bloqueio à investigação nunca veio ostensivamente do centro do poder político em Moçambique. Veio dos principais actores do calote, que sempre usaram o nome da Frelimo para exibir que tinham a devida protecção política. E até certo ponto tiveram. O Governo e o Parlamento deram o calote por legal mesmo depois de evidências que mostravam o contrário, incluindo todo o burburinho nos mídia e o incansável expediente das organizações da Sociedade Civil. Só depois do relatório de auditoria realizada pela Kroll em nome da PGR é que uma parte da classe política, alinhada com o actual poder, é que começou a se render às evidências de que a economia tinha sido delapidada. O coro de vozes exigindo a responsabilização judicial foi aumentando a partir desse momento. Mas, nas hostes mais profundas do frelimismo da táctica da avestruz, havia sempre a apetência para uma resistência frugal.

 

No entanto, a PGR tinha todo o aval para avançar. E foi fazendo o que pôde, esbarrando-se sempre em bloqueios. O relatório da Kroll mostrara que cerca de 500 milhões de USD haviam sumido sem deixar rastos. Isto implicava que, para além das evidências colhidas em Moçambique, era preciso rastrear contas bancárias (nos Emirados Árabes Unidos) e transacções em USD (nos EUA), envolvendo a Privinvest e os alegados implicados moçambicanos. No caso dos Emirados, havia uma particularidade: por causa do seu sistema judicial, os pedidos de informação do Ministério Público de cá ao Ministério Público de lá tinham de ser feitos por via do Ministério da Justiça de lá. Isso implicava uma colaboração profícua do representante diplomático de Moçambique para os Emirados, no caso o Embaixador Francisco Cigarro. Mas sua postura foi assombrosa. Cigarro bloqueou completamente todos os esforços da Justiça. Quando se espera que ele fosse uma ponte estendida entre Maputo e Dubai, Cigarro agiu como uma cortina de ferro. Encontrava as artimanhas possíveis e imagináveis para impedir que a nossa PGR obtivesse detalhes das contas bancárias dos moçambicanos que estavam na lista de beneficiários do calote. Cigarro é um dos responsáveis políticos do atraso das investigações, embora ele não esteja hoje na lista dos arguidos.

 

Com os Estados Unidos da América houve, também, um aparente bloqueio. Como explicou a PGR, na semana passada, as cartas rogatórias enviadas para o Whashington, com pedido de detalhes sobre o uso do sistema financeiro americano por parte dos caloteiros moçambicanos nunca foram respondidas. A PGR pretendia ter informação detalhada sobre movimentos bancários. Os americanos não responderam em tempo e, nalgumas vezes, alegaram que os investigadores moçambicanos estavam a fazer “fishing”, pescando no escuro; que deviam ser mais concretos, indicando detalhadamente nomes, números de contas e bancos de domicílio, para que pudesse haver cooperação. Mas isso era uma artimanha para sonegação de informação à nossa PGR.

 

Na acusação, agora feita, contra Manuel Chang e companhia, o Departamento de Justiça revelou estar na posse de muitos dos detalhes solicitados pela PGR, os quais sem a sua cooperação, dificilmente seriam conhecidos pela justiça moçambicana. Essa postura de sonegação da justiça americana fez atrasar a investigação local, atirando para as costas da PGR Beatriz Buchile o ónus da inércia e da complacência. Injustamente! A sonegação americana pode ser, agora, interpretada também como um bloqueio, calculado de forma milimétrica, com fins pouco claros. Por um lado, a falta das “evidências americanas” na investigação moçambicana seria interpretada como incompetência e julgada como se a nossa PGR não estivesse a fazer algo.

 

É o que se vê! Hoje a percepção de que a PGR está agora a agir a reboque da justiça americana ficou enraizada na opinião pública, muito embora os 18 arguidos locais já haviam sido constituídos e notificados antes da prisão de Manuel Chang a 29 de Dezembro. Por outro lado, ao atrasar a investigação local, os americanos ganhavam a corrida do confisco alargado dos bens de todos os acusados. Alguns desses bens estão em Moçambique e podem ser levados para fora. Isso é ilegítimo! E deve ser evitado! O principal prejudicado pelo calote da dívida oculta não foram os investidores americanos. Foi a economia e o povo moçambicanos. E por essa razão, o confisco dos bens deve beneficiar em primeiro lugar aos moçambicanos.  (Marcelo Mosse)

terça-feira, 15 janeiro 2019 05:48

Nyusi/Ramaphosa: Um comunicado “cor de rosa”

O comunicado de imprensa sobre os assuntos abordados por Filipe Nyusi e Cyril Ramaphosa, na cimeira de ontem, foi divulgado depois das 19 horas. Segundo o documento, os progressos na implementação do acordo sobre o Desarmamento, Desmobilização e Reintegração dos elementos armados da RENAMO foi um dos assuntos centrais na conversa. Ramaphosa congratulou o PR moçambicano pelos avanços verificados. 

 

Por outro lado, os dois Chefes de Estado observaram a necessidade de aguardar pelo curso normal da justiça e deixar as instituições competentes realizarem o seu trabalho no âmbito da separação de poderes, numa referência explícita sobre a detenção na República da África do Sul, de Manuel Chang, por mandado da Interpol, e do cidadão sul-africano Andrew Hannekon, indiciado pelas autoridades judiciárias moçambicanas de colaboração com os insurgentes que protagonizam ataques na região norte da província de Cabo Delgado.

 

A visita inseriu-se, segundo o comunicado, no âmbito do reforço e aprofundamento dos laços de solidariedade, amizade e cooperação política, económica, social, cultural entre os dois países.

 

O Presidente da República da África do Sul, Cyril Ramaphosa, fez-se acompanhar de uma delegação composta pelos Ministros da Defesa e Veteranos Militares, da Polícia e o da Segurança do Estado e outros quadros da Presidência e do Governo da República da África do Sul. No fim, da conversa, longa, Cyril Ramaphosa convidou ao seu homólogo para a próxima Sessão da Comissão Binacional a ter lugar em Pretória, ainda no presente ano, em datas por acordar através do canal diplomático. (Carta)

A casa comprada por Renato Matusse, antigo conselheiro político do ex-Presidente Armando Guebuza, com dinheiros de subornos que recebeu da Privinvest, foi cedida a duas firmas distintas, apurou uma investigação de “Carta de Moçambique”. Trata-se da Okanga Representações Limitada, em transmissão de posse feita em Fevereiro de 2014, e Situr, Serviços, Imobiliária e Turismo, em processo realizado em Julho no mesmo ano. Quando em 2013 Matusse comprou o apartamento num quinto andar do Prédio Xenon (correção: não é o prédio de construção recente, mas aquele que sempre esteve implantado do lado direito do antigo cinema, designadamente onde recentemente se hospedou o franchise local da Pizza Hut) ele recebeu da vendedora, a jurista Neuza de Matos, uma procuração de plenos poderes irrevogáveis, através da qual assumiu a posse do imóvel.

 

De acordo com documentos vistos pela nossa investigação, Renato Matusse enviou à Privinvest dois números de contas de Neuza de Matos, um em Moçambique e outro em Portugal (na CGD), onde ela viveu anos como estudante na Universidade Clássica de Lisboa. Matusse ordenou à Privinvest que o pagamento fosse feito em prestações, a última das quais excedeu o montante que devia ser transferido. Documentos em nossa posse mostram que Neuza de Matos transferiu prontamente o valor em excesso da última prestação para Renato Matusse. O montante não regressou, pois, ao banco de proveniência. Foi enviado para uma conta indicada por Matusse.

 

Uma fonte da investigação disse à “Carta” que em Abril de 2017, poucos dias depois de a lista da PGR, solicitando a quebra de sigilo bancário de 19 figuras que supostamente terão recebido dinheiro das Privinvest, ter sido vazada, Neuza de Matos, cujo nome constava entre os visados, contactou a PGR para contar a sua história, mostrando que não tinha nada a ver com o escândalo das dívidas ocultas e que apenas recebeu de Renato Matusse valores devidos em função da venda da sua casa. A jurista escreveu, por iniciativa própria, um depoimento detalhado, onde juntou os “borderaux” das transferências ordenadas por um banco do Dubai em nome da Privinvest. “Carta” sabe que Renato Matusse é um dos arguidos que será acusado por corrupção e branqueamento de capitais.

 

Neuza de Matos também terá sido arrolada como arguida apesar de que, de acordo com um parecer legal, quem apenas recebeu dinheiro de proveniência duvidosa através da venda de um bem não pode ser, legalmente, considerado como estando envolvido no processo de lavagem, como escrevemos numa edição recente de “Carta”. Neuza de Matos foi a chefe do gabinete jurídico de Armando Guebuza durante os dois mandatos, depois de ter servido também no consulado do ex-Presidente Joaquim Chissano. De acordo com uma investigação de “Carta”, Neuza abriu em 2011 um negócio de venda de roupa de mulheres, onde é sócia do marido. Chama-se NCoisas, Lda, e tem duas lojas em Maputo, nomeadamente no Maputo Shopping e no Glória Mall. “Carta” tentou infrutiferamente obter um depoimento seu. (M.M.)

segunda-feira, 14 janeiro 2019 05:39

Renamo escolhe sucessor de Dhlakama esta semana

As primeiras eleições gerais, sem a presença de Afonso Dhlakama, continuam uma incógnita nos círculos com tradicionais eleitores do ex-líder, que morreu em Maio de 2018, por diabetes, numa das bases do partido na Gorongosa. Nas vésperas do Congresso da Renamo, que se realiza esta semana e vai eleger o seu sucessor, vários habitantes de Macadera, um povoado fustigado pelo último conflito político-militar entre as forças governamentais e o braço armado da Renamo, no distrito de Vanduzi, em Manica, consideram que a ausência da habitual cara de Afonso Dhlakama nos boletins de voto “poderá confundir” os eleitores mais idosos.

 

“A cara de (Afonso) Dhlakama guiava os fiéis e tradicionais eleitores", defendeu Ana Vulande, uma camponesa, se expressando num português “fino”, habitante de um povoado onde os traços da destruição, são ainda visíveis. A zona sofreu demasiado supostamente por ter “albergado atacantes” das escoltas militares no troço Vanduzi-Changara.

 

Outro morador, Mateus Raimundo, observa que as eleições gerais deste ano vão decorrer após profundas mudanças na Lei Eleitoral conseguidas por Afonso Dhlakama, sustentando que o seu sucessor deverá estar “à altura do carisma de Dhlakama”.

 

A Renamo deverá eleger esta semana, no seu VI Congresso, que decorre de 15 a 17 de Janeiro na Gorongosa, o sucessor de Afonso Dhlakama, que será igualmente o candidato do partido nas eleições presidenciais de Outubro. Recentemente, aquando da reunião do seu Conselho Nacional, a Renamo definiu que o sucessor de Afonso Dhlakama deve ter a nacionalidade moçambicana, ter ocupado a função de Secretário-Geral, ter 15 anos de militância e ser membro idóneo e de reconhecido mérito. Além disso, o próximo líder deve ser uma figura que combateu pela Renamo na Guerra Civil dos 16 anos, que opôs o braço armado do partido e as forças governamentais.

 

Na mesa estão quatro nomes, apesar de ainda não serem candidatos oficiais. Um deles é Elias Dhlakama, irmão mais novo de Afonso Dhlakama, que entrou para a reserva em Outubro, após vários anos servindo o exército governamental. Os outros três apontados à sucessão de Afonso Dhlakama são Ossufo Momade, Coordenador-Interino da Renamo, Manuel Bissopo, actual Secretário-Geral, e Hermínio Morais, que em Outubro concorreu para a chefia da edilidade de Maputo, tendo perdido para Eneas Comiche. Num tweet este domingo, Ivone Soares, Chefe da Bancada da Renamo na Assembleia da República (AR), escreveu: “Eu acredito que Deus nos irá iluminar para que vença a genuína vontade da maioria de homens e mulheres que confiam num Moçambique bem governado”.  E acrescentou: “É possível”. Soares é tida como uma grande apoiante de Elias Dhlakama, seu tio. Pelo menos 700 pessoas, entre delegados e convidados vão participar do VI Congresso da Renamo, que reúne numa das bases localizadas próximas donde morreu Dhlakama. (Osvaldo Matambira)

O antigo Ministro do Plano e Finanças, Tomaz Salomão, defendeu hoje que Manuel Chang deve ser julgado pelos crimes de que é acusado. Numa entrevista à RM, Salomão disse: “Eu não estou preocupado com o lugar onde ele vai ser julgado. Ele vai ser julgado, quer seja em Moçambique, quer seja na África do Sul, nos EUA ou em Haia. Ele vai ser julgado em algum sítio. E é bom que seja julgado, para que isso sirva de exemplo e referência para que coisas dessas não se repitam”.

 

O antigo ministro, que também já foi Secretário Executivo da SADC, defendeu que a justiça, além de julgar os envolvidos nas “dívidas ocultas”, deve ajudar Moçambique a recuperar os bens que foram delapidados.

 

Para Salomão, o debate sobre a detenção e julgamento de Manuel Chang não pode ser resumido ao local de julgamento. O essencial é que do julgamento se vai perceber se o país tem ou não uma dívida por pagar.“Se calhar chegaremos a conclusão de que nós não temos nenhuma dívida a pagar; nós como país; nós como cidadãos deste país. É o que penso, é minha opinião pessoal”.

 

Para o economista, instituições como o Ministério das Finanças, devem transmitir credibilidade, transparência e respeito perante os cidadãos. “Não se pode em circunstância nenhuma permitir que esta instituição seja assaltada por indivíduos de pensamentos maquiavélicos e que estão ali para montar, urdir planos que desgastem a imagem do país, a imagem das instituições, e as contribuições dos cidadãos, algumas delas feitas com muito sacrifício no meio da pobreza que temos”. Salomão acrescentou que “não se pode permitir que aquele edifício nobre [Ministério da Finanças] seja assaltado por pessoas de pensamentos ou motivações criminosas. Devemos proteger a nobreza de uma instituição como o Ministro das Finanças”. (Carta)