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"Eu não conheço o [Teófilo] Nhangumele". Dizem que foi esta a reacção do camarada Armando Guebuza, antigo Presidente desta república, quando perguntado como foi possível ele [o Guebuza] ser enganado por um indivíduo como o Teófilo Nhangumele para assinar um calote que fez o país se ajoelhar desta maneira. Dizem que o camarada Guebuza não gostou nem tampouco da brincadeira, e com razão. 

 

Por Domingos M. do Rosário*

 

 “Como se pode ver a partir das constatações das equipas de monitoria presentes nos 161 distritos do país, existem ainda inúmeros problemas de inoperacionalidade dos materiais de registo eleitoral, que resultaram não só na lentidão no registo de eleitores, mas também no fecho de muitas brigadas de recenseamento eleitoral..”

 

A Justiça moçambicana decidiu extraditar Tanveer Ahmed para os Estados Unidos da América. Tanveer Ahmed é um cidadão paquistanês preso em Moçambique por posse de droga e procurado pelos americanos por tráfico de drogas pesadas. Quando os gringos pediram o seu bandido, nós entregámo-lo sem cerimónias.

 

É mesmo isto que vai acontecer. Com o aproximar dos 90 anos do nosso Lilinho Micaia, o poeta de “Mãe negra...embala seu filho”, ou seja, para os não conhecem sua versão literária, os 90 anos de Marcelino dos Santos, figura que se confunde com a génese da Frelimo e do Estado-nação que hoje somos, combatente nacionalista de primeira hora, na véspera do seu nonagenário, a Frelimo e o Estado vão sai à rua para exultá-lo, reerguê-lo ao pedestal mais alto do heroísmo nacional. Vai sair toda uma nata de ”frelimos” exaltando Marcelino. Contando suas façanhas e sua abnegação à luta. É normal que assim seja. Mas, mas não devia ser!

 

- O palácio do Governador de Nampula (residência oficial), Victor Borges, tinha muitos ratos e cobras;

 

- Então, o Gabinete do Governador decide fazer uma "Carta de Compromisso e de Cadastro" (que não foi assinada pelo próprio Chefe do Gabinete) a um hotel de luxo e caro da cidade para alojar o governante e sua família num período não especificado garantindo que o próprio Gabinete do Governador (portanto, o Estado através do erário público) pagaria todas as despesas de alojamento e alimentação dos seus inquilinos mediante apresentação da factura; 

 

- Daí que, o governador, sua esposa e seus dois filhos carregaram nas suas "xi-djumbas" e foram viver para o hotel; 

 

- Enquanto isso, decorriam obras de reabilitação do palácio para eliminar malta Jerry e as "sineiques" invasoras; 

 

- Acontece que, trinta dias depois, o exílio da família palaciana virou notícia e motivo de piada, chacota, zombaria e crítica da opinião pública;

 

- Sendo assim, os palacianos decidiram pegar de volta nas suas "xi-djumbas" e regressaram ao palácio ainda em obras finais; 

 

- Foi daí, então, que, no dia seguinte, o governador convocou uma conferência de imprensa para informar, em primeira mão, que o valor da factura (de cerca de um milhão e trezentos e cinquenta mil meticais) referentes as despesas de alojamento e alimentação do período do exílio e o valor da outra factura referente às obras de reabilitação do palácio sairiam do seu bolso, ou seja, que o Victor Borges, ele próprio, iria recorrer a um financiamento bancário para pagar as despesas. 

 

Nesta estória algo não bate certo. Escapa-nos uma peça. Nunca vi nem ouvi sobre alguém que pede financiamento bancário para pagar dormida e reabilitação de um palácio (depois de ter dormido e depois das obras terem iniciado). É muito estranho! 

 

Eu diria que tentaram tramar o cota. O antigo Ministro da Justiça, Abdurremane Lino de Almeida, caiu neste tipo de ciladas: despesas que parecem pequenas, decisões levianas e tufa. Parece-me que tentaram montar um ramo seco para Borges sentar. A sorte do Borges é ser humilde e granjear simpatias da opinião pública. Borges conseguiu romantizar este conto patético e saiu-se lindamente. 

 

É ano eleitoral este: haverá eleição de governadores. Todo cuidado é pouco! 

 

- Co'licença!

Acabo de falar ao telefone com Sangare Okapi, e ele recorda-me um verso que me remete ao silêncio: não me aguarde, basta que penses em mim. Outro verso perturbador já o tinha ouvido de Fernando Manuel: agora vivo de sons. Na verdade, Fernando não tem outra escolha senão aceitar este futuro que já encara de frente, com palavras sem fim em formigueiro nas mãos trémulas queimadas pelo tabaco. Ele está apressado em lançar toda essa enxurrada depositada no sentimento mais profundo, porque o tempo que tem pela frente é inesperado.

 

Quando nasceu não sabia de nada, mas já estava escrito que tudo consumar-se-ia na pesada penumbra. Quer dizer, a cegueira, cansada de esperar na vigília furtiva iniciada no ventre da sua linda mãe, abateu-se – mais de seis décadas depois - com estrondo sobre um cronista que agora respira entre os sopés e os cumes. Sem saber exactamente o que pensam as pessoas à sua volta, porque não vê o rosto delas. E o rosto, segundo o poeta, é um pouco a janela da alma.

  

Estou sentado frente a frente com Fernando Manuel na sala do seu apartamento na Avenida Guerra Popular, em Maputo, onde vários charcos de mijo espalham-se por um município fedorento. Onde os cheiros nauseabundos são exaltados pelas canções repetidas no silêncio dos dementes desmazelados, que gozam a liberdade infindável oferecida pelas velhas acácias. E pela rebeldia dos meninos de rua que não sabem para onde vão. Nem de onde vêm os ventos frios que varrem seus ossos nas noites e nas madrugadas.

 

Há muito que não nos víamos, e ele nunca mais há-de me ver. Mesmo assim não me compadeço com o cego que está à minha frente, apesar de saber que estes olhos grandes jamais voltarão a vislumbrar a cor das manhãs. O que me arrepia porém é que o cronista parece escutar-me com esses mesmos globos oculares ora escurecidos. Já não é o mesmo homem que conheci, que saía a correr da Redacção para trazer a reportagem inadiável, posteriormente burilada com saber. Já não é aquele boémio incapaz de controlar a boca que ao mesmo tempo bebia e dava azo às bojardas que só ofendiam a quem não entendesse efectivamente os tecidos da vida.

 

Fernando Manuel agora é um personagem resignado perante todas as derrotas infligidas pelos desfiladeiros íngremes calcorreados um a um. Passa a vida a escutar Rádio e a ouvir música, como se isso fosse lhe devolver a pujança dos músculos. Qual! O que lhe sobra é alma. E as palavras que lhe alagam as mãos. Em turbilhão.

 

A nossa conversa rodopia em torno do eixo do passado. É o próprio Fernando Manuel quem assim o diz, lá para frente não há nada. Tudo começa daqui para trás. Ou da trás para aqui. Aqui é o limite. É aqui onde terminam todas as paródias. Pior quando não há vinho por sobre a mesa. A vida torna-se um muchém de sal insípido, como se transformou a mulher de Lote, libertada de Sodoma e Gomorra.

 

É isso: a iris do Fernando Manuel perturba-me. Parece inquirir-me.  E eu digo assim ao meu amigo, vou trazer-te um par de óculos escuros para esconderes esses olhos de águia em fúria, porque já não servem para nada. E ele responde-me assim, os olhos da águia são a tónica máxima da liberdade. Depois da águia não há outro animal. Ou seja, na audácia da águia está a audácia de Deus.