O jornalista Nuno Rogério há vezes que não enxerga direito, fechadinho na sua caixa preconceituosa de lugares-comuns. A propósito do navio russo, Lady R, que cavalga águas territoriais moçambicanas, tendo fundeado na costa beirense e depois atracado no porto de pesca da Beira, proveniente de SimonsTown (Cape Town) e rumando para Tanzânia com material bélico, o jornalista pergunta ao Presidente Nyusi o que faz tal embarcação em Moçambique, uma vez que foi alvo de sanções por parte dos EUA no contexto do conflito Rússia-Ucrânia.
Completamente descabido. Quer se goste quer não, Moçambique não aplicou sanções a ninguém e assumiu uma posição de neutralidade como Estado soberano. De modo que a presença dessa embarcação é coberta por essa neutralidade. O que faz o Lady R na Beira? Imagina que a Rússia não tivesse invadido a Ucrânia? Pois!
Aliás, Maputo já clarificou que todos os 61 navios sancionados pelos EUA podem entrar em Moçambique. (Veja nota embaixo).
Nisto eu destaco a postura corajosa do Governo. Uma afronta soberana aos EUA. Pena é que essa coragem não é usada para sancionar o Israel pela agressão à Palestina ou para dize “Não’ a políticas perversas do Banco Mundial e à corrupção desenfreada encrustada no ADN da classe política local. (Marcelo Mosse)
A corrupção e a máfia já se instalaram como uma metástase cancerosa nos órgãos vitais do Estado e da Sociedade. Não vou divagar. O áudio que partilho é assombroso. Trata-se de uma vítima da máfia encrustada na emissão de Bilhetes de Identidade. Através de um BI falsificado, com seu nome aposto mas com fotografia doutra pessoa, a vítima caiu numa trama que envolve bancos e telefonias móveis. Tiraram-lhe dinheiro da conta. Não fosse uma gestora honesta, e o homem ia sofrer um rombo de milhões.
Os tentáculos da criminalidade organizada têm raizes plantadas em empresas de quem se suponha altos níveis de controlo de fraude interna. Não vou colocar nomes.
A vítima nomeia ele próprio os bois. Mas, no caso concreto dos BIs, o alarme devia envolver uma revisão do contrato com a Malbauer, uma empresa alemã (certamente com lobbistas e parceiros políticos locais), que entre 2018/19, substituiu a Semlex (uma multinacional de fundador sírio-belga), que entrou em litígio com o Governo por alegada incapacidade.
A nova provedora mostra-se porosa, a crer nos dados em nossa posse.
Outro exemplo crasso da podridão é a descoberta há dias de uma rede local de uso de identidade alheia retirada de BIs, tal como as imagens documentam, numa prevaricação à jusante.
A coisa foi-me descrita assim:
“Os BI's são recebidos na Direcção provincial de Identificação Civil, alguém tira e entrega a vários indivíduos estranhos que usam para registar cartões SIM, depois devolvem a DIC e estes mandam para os distritos e entregam aos legítimos titulares”.
Batemos bem no fundo e duvido que isto um dia se repare. Com uma Frelimo empenhada no culto da autoridade e não na governanção, uma oposição que se reduziu aos espetáculo do VM7 e uma sociedade caladinha da silva, medricas e conformada, nosso destino é indecifrável.
Tirem as vossas ilações…
Quando os professores exigem melhor enquadramento salarial e ameaçam com greve, a Frelimo responde exibindo carros de luxo adquiridos para os seus primeiros secretários provinciais.
Os funcionários públicos choramigam, a Frelimo exibe fartura: um Nissan Patrol de última linha oferecido a um cacique provincial. Custo: 8.800.000 Mts.
Ao mesmo tempo que pede paciência aos professores, o Presidente Nyusi rega com Moët & Chandon um reluzente Toyota Prado VX oferecido a um Primeiro Secretário acusado judicialmente de corrupção, no caso concreto, o cacique de Tete. Custo: 9.300.000 Mts.
A Frelimo mostra que está nadando em fartura e que se lixem os médicos, os professores e toda a turma de assalariados do Estado. Caso contrário, o partido seria comedido, fingindo solidariedade com os professores. Mas já não tem vergonha na cara. E o presidente lá foi chancelar a faustosa oferenda, um sumptuoso banquete de exibicionismo e novo-riquismo torpe.
Mas é estranho que, em véspera de eleições, os conselheiros e assessores da Frelimo não tenham enxergado eventuais danos políticos desta exposição, que acentua a percepção de desigualdade extrema entre a classe política dirigente e o eleitorado.