Foi através do seu habitual comunicado de imprensa semanal que o Comando Geral da Polícia da República de Moçambique (PRM) anunciou ter detido, na primeira semana do mês em curso, uma cidadã de 49 anos, no distrito de Bilene, província de Gaza, indiciada de ter raptado um menor de 10 anos de idade.
Sem dar detalhes, relativamente ao caso, o documento, partilhado nesta quarta-feira, refere ainda que, na ocasião, a corporação apreendeu, na posse da indiciada, uma viatura de marca Toyota Surf, com a chapa de matrícula AFV 758 MC.
Segundo os dados da PRM, de 01 a 07 de Fevereiro, foram apreendidas, em todo o país, sete armas de fogo e 41 munições, na posse de indivíduos estranhos. As armas, de acordo com as autoridades, foram apreendidas nas províncias de Manica, Gaza, Maputo e cidade de Maputo.
Na cidade de Maputo, diz a PRM, uma arma, do tipo AK-47, com o n° 74175, foi apreendida no bairro das Mahotas, enquanto outra, da marca TAURUS, com n° 63484, tinha oito munições. Já na província de Maputo, uma, de tipo pistola, foi apreendida no bairro T3, com uma munição; outra, tipo Short Gun, na Ponta D’Ouro com seis munições; e a última, em Nkobe, sendo da marca Makarov, mas com o número viciado e contendo três munições.
Em Gaza, foi apreendida uma AK-47, n° 257860, com 23 munições e, em Manica, uma pistola. Estas armas juntam-se a outras nove apreendidas na semana anterior, período em que a PRM também apreendeu 50 munições, em todo o território nacional.
No que se refere à sinistralidade rodoviária, a PRM afirma ter registado, em sete dias, 15 óbitos (uma média de 2.1 mortes por dia), em consequência de 21 acidentes de viação, que resultaram também no ferimento de outras 65 pessoas, entre graves (19) e ligeiros (46).
Numa altura em que o país continua a viver um ambiente de tensão, com os ataques na zona centro do país e na província de Cabo Delgado, as Forças de Defesa e Segurança (FDS) afirmam estar “em prontidão combativa permanente, em várias linhas operacionais, levando a cabo acções de patrulha ostensiva, visando combater e neutralizar os malfeitores”. (Marta Afonso)
A existência de esquemas de corrupção, fraca fiscalização e o facto de alguns dirigentes do governo e do sector florestal serem “árbitros e jogadores” são apontados como os maiores problemas que afectaram o então Ministério da Terra, Ambiente e Desenvolvimento Rural (MITADER), que desde 2015 – 2020 foi dirigido por Celso Correia. Esta posição foi defendida por diferentes ambientalistas ouvidos pela “Carta” nos últimos dias.
A entrevista, cujo epicentro era analisar os desafios do sector de florestas, um dos mais devastados pela “mafia chinesa” em Moçambique, uma vez que mais de 90% da madeira explorada em Moçambique vai para aquele país, com algumas espécies (mesmo proibidas, tal como a Nkula) continuando a ser delapidadas, num esquema que envolve quadros do sector florestal e do governo.
De acordo com o Engenheiro ambiental, Luís Nhamucho, é importante disciplinar o sector. Ou seja, o governo deve reiniciar as actividades no sector de florestas, porque “a saga da exploração ilegal voltou e no último quinquénio foi visível a existência de árbitros e jogadores ao mesmo tempo”. Para Dulce Brás, Oficial de Monitoria e Avaliação da Associação de Apoio e Assistência Jurídica às Comunidades (AAAJC) com sede em Tete, a falta de mapeamento e informatização no sector de florestas facilita a acção dos furtivos.
Dulce Brás disse que em Tete existem vários estaleiros e serrações nas proximidades de áreas de conservação, uma situação que na sua óptica facilita o abate de espécies de madeira, incluindo a protegida por lei. Por sua vez, Olinda Cuna, Coordenadora de programas na área de recursos florestais na Livaningo, considera que os grandes desafios do sector florestal no quinquénio que ora inicia passam por melhorar na fiscalização e nos métodos de compensação às comunidades residentes nas zonas de exploração florestal, “porque as mesmas já estão a ficar frustradas já que maior parte delas ainda não se beneficiou dos proventos oriundos da exploração dos recursos florestais”.
Os pontos acima mencionados estarão, ao que tudo indica, sob gestão do Ministério da Terra e Ambiente, liderado por Ivete Maibase, recentemente empossada pelo Presidente da República, Filipe Nyusi. Entre outros diversos desafios existentes, os ambientalistas ouvidos pela “Carta” convergiram em questões ligadas à corrupção, fiscalização, reforma legislativa, gestão dos 20%, entre outras.
Combate à corrupção e fiscalização
Os dois pontos positivos que marcaram o quinquénio passado, 2015-2019, foram, primeiro: iniciativa da avaliação dos operadores florestais e que teve duas edições, embora tenha mostrado a vulnerabilidade e uma questionável qualidade dos inquéritos e a contribuição do modelo usado para o que é ultimato desejado para a gestão sustentável, um ponto de partida para saber-se onde se está e para onde se pretende chegar.
Nhamucho disse que a queda do número de operadores não teve nada a ver com o mau desempenho, mas, sim, estava associada a questões económicas, uma vez que o mercado da madeira na China tremeu e nós também conhecemos como funciona o mercado da madeira em Moçambique.
“Na verdade, nós conhecemos como funciona o mercado da madeira em Moçambique, temos, no final do dia, os ditos madeireiros que são lobistas. Os tais madeireiros são meros intermediários, que adquirem licenças cujo valor sequer conhecem, através da protecção política que os mesmos possuem e mais tarde transacionam as licenças. Antes as mesmas eram vendidas para chineses, sendo que neste quinquénio isso não se verificou, porque eram poucos chineses interessados neste negócio”, afirmou Nhamucho.
Para Dulce Brás, a questão da fiscalização precisa de suporte a todos os níveis, principalmente a fiscalização interna, sendo que um dos grandes problemas no sector é a corrupção, com fiscais e tomadores de decisão envolvidos. Na Província de Tete, houve no mandato passado várias buscas de exploração ilegal da madeira “Nkula”, um negócio que envolvia alguns tomadores de decisão. Dulce Brás disse que pelo facto de as comunidades não sentirem nenhum benefício, acabavam vendendo a preço de banana as diferentes espécies da madeira.
Olinda Cuna aponta a questão da burocracia na legalização dos comités como um dos grandes entraves no sector, porque acaba deixando as comunidades frustradas com a situação e as respectivas empresas que pagam os impostos, mas não notam o desenvolvimento das comunidades.
Cuna defende que é preciso melhorar a comunicação entre o governo e as comunidades, porque no mandato que findou houve um distanciamento entre estas partes, sobretudo, a coordenação, levando com que as comunidades não tenham conhecimento dos procedimentos para ter acesso aos valores, uma vez que o governo é um dos principais intermediários no processo da criação dos comités e posterior facultação dos valores provenientes da exploração florestal.
Para Cuna, a fiscalização é um dos principais “calcanhares de Aquiles” no sector florestal, aliado à falta de recursos humanos e materiais, facto que leva a activista a exortar a coordenação entre as entidades governamentais, privadas, OSC e as comunidades.
Gestão dos 20% e reformas institucionais
Para Olinda Cuna, “um dos grandes desafios que existiu no sector de florestas foi a questão da transparência na gestão florestal, concretamente, na canalização dos benefícios às comunidades, entre eles, os 20% que, mesmo plasmados na lei, acontecem num passo muito lento”.
Olinda Cuna disse que muitas comunidades, nas províncias de Niassa, Nampula, Sofala e Zambézia, não chegaram de beneficiar-se dos 20%. A ambientalista questiona para onde foram os valores canalizados pelos operadores florestais.
Luís Nhamucho enalteceu a evolução do quadro legal, uma vez que anteriormente se trabalhava com regras ou leis desajustadas com a realidade actual, sendo que neste mandato houve um enquadramento legal dos crimes florestais, em que se verificou uma harmonização do Código Penal e a Lei de Florestas. Relativamente aos pontos negativos, Nhamucho disse que houve um escancaramento de um cancro conhecido que é a fraca qualidade dos serviços de fiscalização que o país tem.
“A Operação Tronco é o culminar disso tudo e há quem pense que esta foi um sucesso, mas, para mim, a operação demonstrou uma fragilidade, porque a pergunta seria, ‘como é que na tua casa tu deixas a porta aberta e encontras alguém que vive lá a fazer desmandos que você conhece e dizes peguei ladrão’. Para mim, a ‘Operação Tronco foi um teatro’. Não sei se a dissociação da Agência de Controlo de Qualidade com o sector de florestas trouxe algo resultado concreto”, questionou Nhamucho.
Dulce Brás louvou a questão da reforma institucional, uma vez que no mandato passado começou-se a revisão de alguns dispositivos legais, mas que não foram fechados, cabendo ao novo executivo terminar os mesmos. Entretanto, existe receio de não vir a ocorrer, uma vez que é comum, a cada mandato, o ministro que entra mudar a coisa ao seu bel-prazer.
De acordo com Dulce Brás, é importante mudar a questão da constituição dos comités de gestão dos recursos florestais, que no mandato findo acabaram não sendo criados, uma vez que o processo é moroso, “uma vez que a lei prima que só é canalizado o valor inerente a 20% quando existe um comité de gestão, este elemento levou com que muitas comunidades não se beneficiem dos valores provenientes dos 20%”.
Digitalização do Sector de florestas e as perspectivas do quinquénio 2020-2024
Dulce Brás reiterou a necessidade de informatização do sector para permitir que se combata o contrabando da madeira, como acontece em países como Brasil e outros. A activista revelou que a Província de Tete teve vários casos de contrabando de madeira da espécie Nkula que saía para países vizinhos como Zâmbia e Zimbabwe, onde era organizada em contentores e voltava a entrar em Moçambique, através de esquemas que facultavam certificados internacionais e posteriormente exportada, numa operação em que Moçambique saía a perder.
Para Dulce Brás, é importante colmatar os problemas acima mencionados para que se possa gerir os escassos recursos florestais existentes no país. O segundo ponto negativo foi “a falta de posicionamento do executivo, principalmente os gestores do sector de florestas perante os resultados apresentados, mesmo com aparição do Ministro do pelouro informando que depois da avaliação dos operadores florestais caíram 300 madeireiros dos mais de 1000 existentes”.
Para Nhamucho, “o governo teve uma oportunidade de ser mais contundente, mas não houve uma entrega desejada”. De acordo com o entrevistado, houve uma redução na exploração da madeira de 500mm cúbico para 300mm cúbico, um facto que demonstra que o recurso diminuiu. Por outro lado, o governo deve definir quem é madeireiro e quem não é, mesmo que seja para refazer certas coisas que foram acordadas. Nhamucho defende que deve haver uma reforma séria no sector, principalmente no novo executivo que estará em frente entre 2020-2024.
Luís Nhamucho disse que o executivo moçambicano deve informatizar o sector, porque sem isso, mesmo que haja vontade e projectos, sem o uso das novas tecnologias nada será feito. Para Nhamucho, o novo executivo tem o desafio de tornar o sector florestal sustentável e criar inventários localizados ou detalhados e não exploratórios como se verificou no mandato passado e a valorização das comunidades que não se beneficiaram nem dos 20% e muito menos dos 50% para os denunciantes.
Olinda Cuna entende que é de vital importância que se digitalize o sector e se adquira novas tecnologias e formação dos fiscais e das comunidades para estancar o problema da fraca fiscalização. A coordenadora de programas florestais considera que, devido ao atraso nos desembolsos, maior parte das comunidades estão a ficar cansadas e frustradas, por não estarem a beneficiar-se dos desembolsos, levando inclusive alguns a aliarem-se aos exploradores ilegais que lhes pagam valores irrisórios.
Olinda Cuna disse que é preciso que o governo promova a venda da madeira apreendida para carpintarias locais, juntamente com membros das comunidades, ou que a mesma seja usada para construir carteiras, uma vez que os alunos residentes em comunidades com madeira apreendida estudam sentadas no chão. Cuna defendeu que o governo deve envolver as comunidades nas reformas políticas e a revisão dos diplomas legais porque muitas vezes tem falhado, porque as comunidades não têm sido incluídas nos processos de organização das políticas. (Omardine Omar)
O Centro de Integridade Pública (CIP) exige à Procuradoria-Geral da República (PGR) informação transparente sobre gastos com honorários de advogados das “dívidas ocultas”. A exigência, que é feita em nome do povo moçambicano, vem após a PGR comunicar que “instruiu os advogados para retirarem os dois pedidos pendentes nos tribunais sul-africanos” referentes aos recursos para a extradição do antigo ministro das Finanças, Manuel Chang, para Moçambique.
“No entanto, a PGR não informou quanto este processo custou aos cofres do Estado”, critica o CIP, em comunicado recebido ontem na nossa Redacção. “Enquanto instituição que investiga as ‘dívidas ocultas’ e é guardiã da legalidade, a PGR não deve realizar despesas que não são do conhecimento público, sob pena e risco de perder a legitimidade aos olhos do cidadão”.
Com a exigência, o CIP deixa transparecer o quão onerosos são os honorários de advogados das “dívidas ocultas” para os moçambicanos. Aliás, lembre que, em Janeiro último, publicou informação com evidências documentais, mostrando que a PGR pagou mais de 100 milhões de Meticais em honorários aos advogados que representam o Estado moçambicano no caso de extradição de Manuel Chang.
Na ocasião, o CIP defendeu que a PGR devia desistir da sua pretensão de tentar, a todo o custo, extraditar Manuel Chang para Moçambique.
Com o comunicado da última segunda-feira, a organização congratula a PGR por ter desistido do processo que estava a custar milhões de meticais aos cofres do Estado. Todavia, “com este avanço dado, o CIP é do entendimento que, agora, a PGR deve publicar informação detalhada sobre quanto o país despendeu com o pagamento de honorários ao escritório de advogados sul-africano, contratado para defender a extradição de Manuel Chang para Moçambique. A informação deve ser tornada pública a bem da transparência e da prestação de contas aos cidadãos”, insiste o CIP na nota.
Entretanto, num outro desenvolvimento, aquela organização da sociedade civil diz ser incompreensível que a PGR tenha pago 20 milhões de rands (cerca de 90 milhões de meticais), em Dezembro de 2019, para submeter recursos ao Tribunal Superior de Recurso e ao Tribunal Constitucional, ambos da África do Sul, e, em Fevereiro de 2020, mande retirar os mesmos recursos.
“Isto pode revelar que, ou a PGR não analisou, com a necessária ponderação e sentido de responsabilidade, o caso em litígio, mesmo antes de interpor recursos, ou algo de mais grave se passa”, acrescenta o comunicado que temos vindo a citar.
Além de gastos com honorários de advogados sul-africanos, o CIP lembra que a PGR iniciou outro processo judicial no THE HIGH COURT OF JUSTICE, no Reino Unido, tendo como réus o Credit Suisse e seus antigos colaboradores envolvidos na contratação das “dívidas ocultas” e a Privinvest e suas empresas subsidiárias envolvidas na produção e venda dos equipamentos para as três empresas EMATUM, MAM e ProIndicus.
Desse processo, reitera a fonte, sabe-se que a PGR contratou a firma de advogados Peters & Peters para representar o Estado neste caso, mas desconhece-se o custo do mesmo.
Sobre esse processo, o CIP exige também que os moçambicanos sejam informados sobre os gastos efectuados e até da previsão daqueles que possam vir a ser realizados, uma vez que há pelo menos, ainda, um processo conhecido que está em curso e que irá, indubitavelmente, acarretar o dispêndio de mais valores monetários. (Carta)
Uma vez mais falhou o arranque do julgamento do caso “LAM-Executive”, que tem no banco dos réus dois antigos gestores das Linhas Aéreas de Moçambique (LAM), nomeadamente, António Pinto (então Presidente do Conselho Executivo) e Hélder Fumo (ex-Administrador Financeiro), e a Directora da Executive Moçambique, Sheila Temporário.
Se em Novembro do ano passado o adiamento do julgamento foi a pedido da defesa dos três arguidos do caso, esta terça-feira, foi mesmo por decisão “unilateral” do Juiz da causa, Rui Dauane.
Rui Dauane, juiz da 7ª Secção do Tribunal Judicial da Cidade de Maputo (TJCM), decidiu pelo adiamento do julgamento, sob o argumento da falta de “capacidades físicas” para dirigir a sessão. Dauane disse que estava ainda a recuperar de uma doença de que padecia, que inclusivamente ditara, num passado não muito distante, o seu internamento numa unidade hospitalar.
“Não tenho capacidades físicas para hoje dirigir o julgamento. Sou obrigado a adiar o início da sessão para uma data por definir”, disse Rui Dauane, visivelmente debilitado.
O início do julgamento do caso, tal como disse Dauane, ficou adiado para uma data por anunciar, estabelecendo, na sequência, os próximos 15 dias como o horizonte temporal para a marcação de uma nova data.
A decisão do adiamento da sessão veio depois de pouco mais de duas horas de espera. A sessão, que estava prevista para as 9:00 horas, só veio a iniciar quando já passavam poucos minutos das 11:00 horas. Rui Dauane entrou na sala, procedeu à identificação dos presentes (réus) e depois anunciou que ainda não estava suficientemente recuperado a ponto de conduzir os trabalhos. Na sala de sessões estavam presentes os três réus do caso, acompanhados dos seus respectivos advogados.
António Pinto, Hélder Fumo (que não esteve presente na audição de 11 de Novembro último) e Sheila Temporário aguardam pelo julgamento em liberdade. Todos, tal como demanda a acusação do Ministério Público, são acusados do cometimento do crime de peculato.
Os antigos gestores da LAM são acusados de terem desviado pouco mais de 50 milhões de meticais, figurando a Executive, responsável pela produção da revista de bordo da LAM, a Índico, peça-chave para a dissipação dos fundos da companhia área de bandeira.
Falando a jornalistas momentos após a comunicação do adiamento da sessão, Abdul Gani, advogado de Sheila Temporário, apesar de lamentar os moldes como o processo foi gerido, isto no que à eficaz comunicação diz respeito, disse ser perfeitamente compreensível a situação. Gani não deixou de realçar, por exemplo, que para o caso da sua cliente, no rol dos constrangimentos decorrentes do adiamento, consta uma testemunha que teve de viajar de Luanda (Angola) para Maputo só por causa deste julgamento.
Por seu turno, a advogada de António Pinto, Janete Assulai, disse, igualmente, serem compreensíveis as razões apresentadas pelo juiz para fundamentar o adiamento da sessão de julgamento. No entanto, Assulai disse ser “um transtorno” porque estavam preparados para o início dos trabalhos no dia de ontem. (I.B.)
O garimpo ilegal é um fenómeno com “barba branca” em Moçambique. A mineração ilegal tem ceifado várias vidas, semeando luto em muitas famílias moçambicanas. Envolvendo também estrangeiros, o negócio tem lesado o Estado em biliões de Meticais.
Enquanto problema social, urge combatê-lo e, para tal, é chamado o trabalho árduo e abnegado durante este quinquénio, do reconduzido Ministro dos Recursos Minerais e Energia, Max Tonela. O desafio provém de empresários e sociedade civil que operam no sector de mineração, hidrocarbonetos e energia.
Escolhido pelo “Empregado do Povo”, Tonela tem dezenas de desafios por resolver, no que ao seu sector diz respeito. De entre vários, os empresários e activistas sociais que operam no sector dos recursos minerais e energia destacam os seguintes:
Combate cerado ao garimpo ilegal
Com a mineração ilegal no país, pelo menos 21 pessoas morreram soterradas de Janeiro a esta parte. Do número reportado, 10 morreram à procura de ouro na província de Manica, numa mina concessionada à empresa australiana Explorator. Do total, os restantes 11, dos quais um era bissau-guinense, tombaram à busca de rubi, na província de Cabo Delgado.
Além de mortes, nesses incidentes há registo de feridos graves e ligeiros. A presença de estrangeiros no garimpo ilegal, no país, é vista pelo Inspector-geral do Ministério, Obete Matine, como sinal de que o negócio, que lesa o Estado em biliões de Meticais, é transnacional.
Ciente deste problema, que assola a sociedade há vários anos, o empresário Chivambo Mamadhusen desafiou o Ministro Tonela a combatê-lo. O agravante, para o empresário, é que as mortes entre outros efeitos da mineração ilegal superam as estatísticas reportadas de vez em quando.
“Com o garimpo ilegal, morre-se todos os dias. Mas, nem todos os incidentes são reportados. Aliado a isso, vários minérios saem ilegalmente das fronteiras, incluindo dos aeroportos”, ressalvou Mamadhusen defendendo o combate urgente do problema.
Em entrevista à “Carta”, o empresário apontou como um dos factores do garimpo ilegal a falta de estruturação da banca comercial (nacional) para financiar os privados, interessados em investir no sector. “Ao nível da banca comercial, há falta de estruturação para o financiamento do sector”, afirmou a fonte.
Segundo Mamadhusen, a falta de capacidade da banca comercial dificulta a criação de um sector mineiro privado e legal, facto que tem levado os empresários a buscar parceiros estrangeiros.
Como outra forma de acabar com o garimpo ilegal, o empresário defendeu a inclusão dos cidadãos que praticam a actividade, na estrutura acionista das exploradoras. A isso, a fonte acrescentou o treinamento e permissão para que os integrantes tenham acesso a tecnologias que lhes permitam continuar o trabalho, de forma legal, mesmo depois de as multinacionais abandonarem o país.
Ainda na mineração, o nosso interlocutor disse ser urgente a instalação em todo o país de centros de comercialização para a compra e venda de produtos de pedras e metais preciosos. Para Mamadhusen, esses centros poderão contribuir, em grande medida, para a maior tributação do negócio ao Estado.
Garantir operacionalização dos projectos de gás do Rovuma
Para os nossos entrevistados, neste quinquénio, outro desafio para Max Tonela é garantir a implementação, em tempo (ou plano) previsto, dos projectos em instalação na Bacia do Rovuma, província de Cabo Delgado, norte do país. Trata-se principalmente dos projectos FLNG Coral Sul, Mozambique LNG e o projecto Rovuma LNG, cujo financiamento ronda os 50 biliões de USD e que o início de produção de cada deve ser ainda neste quinquénio.
Dos três, os dois primeiros operadores já tomaram, junto com o Governo, as Decisões Finais de Investimento, estando a decisão do projecto Rovuma LNG prevista para Abril próximo.
Segundo Inocência Mapisse, economista e investigadora do Centro de Integridade Pública (CIP), uma organização da sociedade civil que, há 15 anos, advoga a transparência, anti-corrupção e integridade em Moçambique, o grande desafio de Max Tonela centra-se no projecto FLNG Coral Sul, que deverá iniciar a produção do Gás Natural Liquefeito (GNL), em 2022.
Para Inocência Mapisse, o grande desafio é o controlo e fiscalização da produção de GNL que, no âmbito desse projecto, irá acontecer em alto mar. Neste contexto, a fonte desafiou o Ministério a preparar recursos para obter todas as estatísticas da produção, pois, na sua óptica, longe do Governo, o operador pode destorcê-las.
Para além do controlo, Mapisse disse que os desafios se estendem para a área fiscal. Defendeu a preparação e coordenação do Instituto Nacional de Petróleo (INP) – regulador do sector – junto do Ministério da Economia e Finanças, para que com base nos dados de produção ao seu dispor possam melhor cobrar os devidos impostos ao operador. A investigadora realçou a preparação por considerar, conforme concluíram estudos feitos pelo CIP, que a actual capacidade técnica e humana para lidar com aqueles desafios ainda é fraca.
No rol dos desafios ao Ministro Tonela, a nossa interlocutora lembrou ainda o reforço de certificação de custos, a gestão de expectativas, mantendo o público bem informado sobre os ciclos de execução dos projectos, bem como os respectivos benefícios.
Frisou a necessidade de se manter a transparência da indústria extractiva, melhorando o cometimento do Governo ao nível da Iniciativa de Transparência na Indústria Extractiva (ITIE), um organismo global de que o país é membro, desde 2009. Aliás, em relação à transparência, Mapisse disse estar chocada pelo facto de o Ministério chefiado por Tonela não ter conseguido, em 2019, entregar o relatório de governação na indústria extractiva por falta de financiamento.
Na sua locução, a investigadora do CIP criticou a falta de informação sobre o sector, principalmente relacionada aos contratos com as concessionárias. A isto, Mapisse acrescentou o aprimoramento do processo de partilha das receitas das empresas às comunidades, estipulada por lei em 2.75 % sobre as receitas de produção.
A nossa entrevistada lembrou que o debate sobre a criação do Fundo Soberano, a instituição que irá gerir as receitas provenientes da indústria mineira e hidrocarbonetos, não se deve cingir à classe política. Defendeu o envolvimento da sociedade civil e o público em geral (que afinal será o dono da instituição).
Desenvolvimento do conteúdo nacional ou local
Ainda no sector de hidrocarbonetos, o empresário Chivambo Mamadhusen partilhou vários desafios ao Ministro Tonela, obviamente em coordenação com outros ministérios e/ou com a ajuda do Governo.
Com a exploração de hidrocarbonetos, Mamadhusen olhou para a monetização, no país, dos recursos a serem explorados com destaque para o gás natural. Disse ser altura de o INP, tutelado pelo Ministério em questão, “emponderar-se” de modo a fiscalizar o conteúdo local, actividade que permitirá maior participação de moçambicanos no negócio, quer em mão de obra, quer através de fornecimento de bens e serviços por empresas.
Em verdade, a vantagem do conteúdo local está no facto de permitir o alargamento da base tributária e, por consequência, maior contributo para o desenvolvimento da economia nacional, bem como a transferência de conhecimentos de um sector tão complexo e novo no país, para operadores indígenas.
Embora a Lei do Conteúdo Nacional, que permitirá maior participação do empresariado nacional naquele negócio, esteja a ser adiada há vários anos, Mamadhusen entende que de nada vale a aprovação, se não há preparo bem como certificação.
Energia
Neste capítulo, a “congregação” dos empresários, a CTA, entende que a retirada de taxas no processo de ligação remove barreiras ao acesso à energia para a maioria da população, o que incentivará a expansão da oferta de produtos e serviços pelo sector privado para o segmento da população anteriormente excluído, trazendo assim boas perspectivas na expansão da demanda e de oportunidades de negócios.
No entanto, a agremiação propõe que os incentivos sejam estendidos às empresas que, na prossecução da sua actividade produtiva, têm investido ou que pretendam investir na expansão da rede eléctrica.
Neste sector ainda, cabe ao Ministro Tonela prosseguir com acções que visam a expansão e reforço da rede eléctrica nacional e construção dos primeiros 750 km da nova espinha dorsal do sistema de transporte de electricidade de alta tensão a 400 KV, ligando o norte ao sul do país.
Segurança
O elemento segurança não é parte do Ministério dos Recursos Minerais e Energia, aliás, o nome delimita as funções da instituição. Todavia, face à insegurança que está instalada em Cabo Delgado desde 2017 e na zona centro, há alguns meses, os nossos entrevistados foram unânimes em afirmar que em nada valerão os esforços do Ministro se esses entraves continuarem a semear terror no país. Para os nossos interlocutores, o Ministro Tonela, junto do Governo, deve criar condições para estancar esses problemas que estão, pouco-a-pouco, a denigrir o desenvolvimento económico do país.
Notas biográficas
Ernesto Max Elias Tonela nasceu em Outubro de 1968, na cidade da Beira, província de Sofala. Em 1994 concluiu a licenciatura em Gestão de Empresas pela Faculdade de Economia da Universidade Eduardo Mondlane (UEM).
Economista/Gestor de profissão, em 2003, Tonela concluiu o mestrado em Gestão Financeira pelo Instituto de Administração de Empresas da Universidade de Paris, em França.
Da sua carreira profissional, entre 1992 a 2015, consta que o actual titular da pasta de Recursos Minerais e Energia ocupou vários cargos de economista/gestor em várias instituições desde pública até privadas, dos quais o de economista júnior no Departamento de Estudos Económicos e Estatísticos do Banco de Moçambique.
De 1993 a 1997, foi Economista na Divisão de Planeamento e Controlo, da Direcção de Economia e Finanças da Electricidade de Moçambique (EDM). No período de 2007 a 2008 assumiu o cargo de Administrador não executivo na Sociedade de Desenvolvimento do Corredor de Maputo. De 1999 a 2008, foi Presidente do Conselho Fiscal da MOTRACO, SARL.
Entre 1997 e 2007, ocupou a função de Director de Economia e Finanças da EDM e, de 2007 a 2015, exerceu o cargo de Administrador Executivo da Hidroeléctrica de Cahora Bassa (HCB).
Com este perfil, de Janeiro de 2015 a Dezembro de 2017, Tonela ascendeu ao cargo de Ministro da Indústria e Comércio, tendo depois sido conduzido ao Ministério dos Recursos Minerais e Energia, pasta que o Presidente da República Filipe Nyusi voltou a confiar-lhe neste segundo e último ciclo de governação.(Evaristo Chilingue)
O Presidente moçambicano, Filipe Nyusi, anunciou ontem que vai fazer uma visita de trabalho e reunir o Conselho de Ministros em Cabo Delgado, Norte do país, região afetada por um conflito armado enquanto nascem megaprojetos de exploração de gás natural.
A visita surge dias depois de o governo provincial ter anunciado que a violência que dura há dois anos já afetou 156.400 pessoas, 25.000 das quais crianças, que perderam bens ou foram obrigadas a deslocar-se para longe de casa.
Apesar de não fazer referência ao número de vítimas mortais, a soma feita a partir de relatos da população e referências das autoridades apontam para um mínimo de 350 a 400 mortos.
Durante a estadia naquela província, o chefe do Estado moçambicano irá dirigir a habitual sessão do Conselho de Ministros das terças-feiras alargada ao governo provincial e outros quadros, refere o comunicado da Presidência.
Na agenda, Nyusi inclui ainda a realização de comícios com a população da província.
O Presidente da República admitiu em janeiro, em Londres, após contactos mantidos com empresas no final da cimeira Reino Unido - África, que a solução para o conflito deverá passar por apoio externo.
Os ataques eclodiram em 2017, protagonizados por residentes, frequentadores de mesquitas consideradas "radicalizadas" por estrangeiros, segundo líderes islâmicos locais que já há alguns relatavam atritos com esses grupos.
Nunca houve uma reivindicação da autoria dos ataques, com exceção para comunicados do grupo ‘jihadista' Estado Islâmico, que desde junho tem vindo a chamar a si alguns deles, com alegadas fotos das ações, mas cuja presença no terreno especialistas e autoridades consideram pouco credível.
Os megaprojetos de gás vão colocar Moçambique no ?top 10' dos produtores mundiais de gás natural a partir de 2022 e as obras em curso contam com algumas empresas e trabalhadores portugueses entre as dezenas de firmas contratadas pelos consórcio de petrolíferas.(Lusa)