Director: Marcelo Mosse

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quinta-feira, 03 janeiro 2019 07:46

O perigo americano

Circula nas redes sociais um texto da autoria de Gustavo Mavie. Ele constrói uma teoria sobre uma suposta ilegalidade da detenção de Manuel Chang. Avança que a ilegalidade na detenção corporiza uma intenção escondida dos americanos para com Moçambique. Que estas intenções são similares às que tiveram no Iraque aonde forjaram provas da existência de armas de destruição maciça só para legitimarem o “assalto” aos poços de petróleo e o controle regional. Portanto, prender Chang é na verdade o início da construção de um enredo com intenções maquiavélicas. Que muitos moçambicanos, mesmo os de grande intelecto, como Elísio Macamo, não conseguiram ainda ver esta “trama” americana.

quinta-feira, 03 janeiro 2019 05:04

Ja nem dá para ser gatuno em paz

Moçambicano é maningue complicado. Nos últimos tempos têm estado a brotar sabichões neste país que nem te deixam ser bandido a vontade. Não permitem que o ladrão usufrua do seu próprio título de ladrão em paz. Já nem dá para ser gatuno tranquilamente. Aqui é fácil você ser jornalista, analista, músico, pastor, padre, sheik, até profeta, mas experimenta ser gatuno. Virão os "donos da verdade" dizer que isso é mentira, que isso é ilegal.

quarta-feira, 02 janeiro 2019 05:13

“O comboio dos duros” na Maxixe

Jamais será reduntante  dizer que a cidade da Maxixe é um entreposto do diabo.  Onde  há dinheiro o Lúcifer  está lá. Pessoalmente. E não existem dúvidas absolutamente nenhumas de que aquela urbe instalada do outro lado da baía de Inhambane é um reservatório desse metal de fel. Na verdade deve ser uma das “jazidas” mais vibrantes do nosso país. Alí não se dorme. Onde há “cacau” não há sesta.  No último fim-de-semana estive lá, levado  por um evento familiar. Nunca vou por ir àquele lugar, apesar de estar aqui perto. Vivo numa margem da baía de Inhambane, e a Maxixe está na outra margem da mesma embevecedora língua de água. De barco são dez-quinze minutos. E já está. Vejo-a todos os dias. Se gostasse dela beijá-la-ia sempre. Mas ela repele-me.  Sobretudo por albergar magotes de pessoas que estão sempre a correr. A empurarem-se uns aos outros. Ao encontro do “kombu”.  E eu sofro de parafobia.

 

De regresso à Inhambane-minha musa, depois de tudo, já no final da tarde, balancei na rampa que vai até à ponte onde devia fazer-me  numa barcaça com motor fora de bordo. As ondas estavam revoltas. Naquelas  condições e numa embarcação precária, podia ser forçado à um banho desagradável, e eu não estava disposto à tanto. Girei sobre o meu próprio eixo. Reatravessei a larga estrada aberta para o sul e para o norte, roçagando a cidade de lés a lés, dando-a vida. Sentei-me num dos bancos à espaços ocupado pelos vendedores de bolos que caçam sem parar os viajantes que passam. Transportados em autocarros  que sobem e descem. Não tenho pressa. Quero sentir essa Maxixe. Vesti-la outra vez como uma roupa que não nos fica muito bem. Mas que nos renova em certos cantos da alma.

 

Estou sentado sem me fixar especialmente em nada. Vejo muita gente em movimento. Ninguém está parado. O único que está despreocupado sou eu. Daqui onde estou vejo uma nesga do mar. Todo, ou quase todo o espaço que se libertava para nos dar o esplendor da paisagem marítima foi invadido. Ocupado. Violado. Estuprado. Sacaneado. As gaivotas zangaram-se e zarparam. Os cisnes, nem um.

 

De tempos a tempos passam camiões-cavalo e eu filmo-os com a memória do meu cérebro. Vão em direcção ao norte. Outros vêm do norte para o sul. Carregados. Super-carregados. São monstros que me fazem lembrar esse filme de acção dirigido por  Sam Peckimpah, de 1978: O comboio dos duros, baseado na canção country “Cnvoy” de C.W. MacCall. Estou sentado. Despreocupado. Tenho uma alternativa. Posso apanhar um “chapa” e dar a volta percorrendo sessenta quilómetros, no lugar de apanhar um banho forçado naquelas barcaças precárias. Epá! Vejo um velho atravessando  aquela estrada movimentada. Tem a espinha danificada. O lombo dobrado. Apoia-se num cajado. Bamboleia como um dançarino de mapiko.

 

Naquele instante há um camião que assome à alta velocidade. O condutor vê o velhote. Acciona a buzina que mais parece a cirene daqueles comboios à diesel que fazem Maputo-Chicualacuala. Poooommmmmm! Tremi na espinha. Lembrei-me do camionista que era perseguido pelo xerife no filme O Comboio dos duros. Mas o “madala” estava com os seus anjos. Saltou para o outro lado. Olhou para o monstro que ia se esfumando na distância, e mandou um manguito.

quarta-feira, 02 janeiro 2019 04:44

Aulas gratuitas de prender gatunos

Olha, pessoal, em vez de estarmos aqui a gastarmos os nossos conhecimentos jurídicos e diplomáticos com debates do tipo "o gatuno soberano devia ser julgado cá" (quando, na realidade, temos consciência da carestia de tomates no nosso mercado judiciário), devíamos é sugerir que o governo envie uma equipa de alto nível à África do Sul para pedir humildemente o vídeo do circuito de vigilância do aeroporto internacional OR Thambo que mostra como os nossos vizinhos-cunhados prenderam aquele nosso brada. Portanto, a equipa receberia o filme num flash e voltaria à casa no mesmo dia. Isso seria muito mais valioso para nós como Estado. 



Com esse filme (desculpa, mas eu acho que é um filme mesmo: é que estou a imaginar um polícia a dar um pontapé na cara de um ex-ministro e deputado numa sala de embarque cheio de gente). Dizia então, com esse filme, teríamos umas aulas gratuitas de como se emitem e como se cumprem mandados judiciais e como se prendem gatunos de colarinho branco. Aprenderíamos que ladrão é ladrão em qualquer lugar do mundo, seja ele gordo ou magro, claro ou escuro, alto ou baixo, velho ou jovem, rico ou pobre.



Aqui em casa estamos a precisar desse tipo de curta metragem para umas pequenas lições que mostram que ladrão pode-se prender em qualquer lugar: em casa do gajo, no restaurante, no bar, no aeroporto, na putaria, na padaria, na discô, no iate, na circular, na É-Ene-Um ou Quatro, em Tchumene, na "Somachild", na Costa do Sol, no Triunfo, na Munhava, em Namicopo, e por aí além. Seria uma solidariedade diplomática de louvar no âmbito das nossas boas relações. 



Esse filme seria o hino da Pé-Gê-Ere para aprenderem que ladrão trata-se pelo próprio nome sem códigos. Teríamos também esse filme no currículo do curso de direito, da academia policial e do centro de formação jurídica e judiciária. O filme seria igualmente obrigatório nos treinos da UIR e da SERNIC. Seria também disponibilizada uma cópia para cada juiz. Talvez assim saberíamos, de uma vez por todas, que para prender gatuno precisamos apenas de cumprir a lei. Ter um mandado judicial e partir para a acção sem evasivas nem subterfúgios. Saberíamos que ao gatuno não se pergunta quando, onde e como quer ser preso... Que não se liga para gatuno para saber se gostaria de ir ao tribunal neste verão ou no inverno próximo.



Esse filme faz-nos muita falta aqui. Passaríamos na Tê-Vê-Eme umas tantas vezes por dia até que todos moçambicanos saibam que prender gatuno não custa nada: é só encontrar o gajo, dar-lhe uma rasteira, amarrar o gajo com arame, dar-lhe uma cotovelada, dar-lhe um remate no traseiro, o gajo cair na carroçaria do carro e bazar. Saberíamos que porrada é para gatuno, e não para o povo que reclama da subida do pão. De resto, temos de inculcar nas cabeças desses nossos irmãos que não se prende gatuno via Eme-Pesa nem via ordens superiores... Que não existe gatuno diplomático nem imune... E que lugar de gatuno é na "djela-hause".


- Co'licença!

quarta-feira, 02 janeiro 2019 04:44

Aulas gratuitas de prender gatunos

Olha, pessoal, em vez de estarmos aqui a gastarmos os nossos conhecimentos jurídicos e diplomáticos com debates do tipo "o gatuno soberano devia ser julgado cá" (quando, na realidade, temos consciência da carestia de tomates no nosso mercado judiciário), devíamos é sugerir que o governo envie uma equipa de alto nível à África do Sul para pedir humildemente o vídeo do circuito de vigilância do aeroporto internacional OR Thambo que mostra como os nossos vizinhos-cunhados prenderam aquele nosso brada. Portanto, a equipa receberia o filme num flash e voltaria à casa no mesmo dia. Isso seria muito mais valioso para nós como Estado. 



Com esse filme (desculpa, mas eu acho que é um filme mesmo: é que estou a imaginar um polícia a dar um pontapé na cara de um ex-ministro e deputado numa sala de embarque cheio de gente). Dizia então, com esse filme, teríamos umas aulas gratuitas de como se emitem e como se cumprem mandados judiciais e como se prendem gatunos de colarinho branco. Aprenderíamos que ladrão é ladrão em qualquer lugar do mundo, seja ele gordo ou magro, claro ou escuro, alto ou baixo, velho ou jovem, rico ou pobre.



Aqui em casa estamos a precisar desse tipo de curta metragem para umas pequenas lições que mostram que ladrão pode-se prender em qualquer lugar: em casa do gajo, no restaurante, no bar, no aeroporto, na putaria, na padaria, na discô, no iate, na circular, na É-Ene-Um ou Quatro, em Tchumene, na "Somachild", na Costa do Sol, no Triunfo, na Munhava, em Namicopo, e por aí além. Seria uma solidariedade diplomática de louvar no âmbito das nossas boas relações. 



Esse filme seria o hino da Pé-Gê-Ere para aprenderem que ladrão trata-se pelo próprio nome sem códigos. Teríamos também esse filme no currículo do curso de direito, da academia policial e do centro de formação jurídica e judiciária. O filme seria igualmente obrigatório nos treinos da UIR e da SERNIC. Seria também disponibilizada uma cópia para cada juiz. Talvez assim saberíamos, de uma vez por todas, que para prender gatuno precisamos apenas de cumprir a lei. Ter um mandado judicial e partir para a acção sem evasivas nem subterfúgios. Saberíamos que ao gatuno não se pergunta quando, onde e como quer ser preso... Que não se liga para gatuno para saber se gostaria de ir ao tribunal neste verão ou no inverno próximo.



Esse filme faz-nos muita falta aqui. Passaríamos na Tê-Vê-Eme umas tantas vezes por dia até que todos moçambicanos saibam que prender gatuno não custa nada: é só encontrar o gajo, dar-lhe uma rasteira, amarrar o gajo com arame, dar-lhe uma cotovelada, dar-lhe um remate no traseiro, o gajo cair na carroçaria do carro e bazar. Saberíamos que porrada é para gatuno, e não para o povo que reclama da subida do pão. De resto, temos de inculcar nas cabeças desses nossos irmãos que não se prende gatuno via Eme-Pesa nem via ordens superiores... Que não existe gatuno diplomático nem imune... E que lugar de gatuno é na "djela-hause".

- Co'licença!

quarta-feira, 02 janeiro 2019 03:04

O que celebramos no Ano Novo

No momento em que o relógio marca a meia noite peço à minha família que faça silêncio. Sugiro que escutemos a cidade em festa. No escuro rasgado pelo fogos de artíficio soam estrondos que antes seriam de Guerra e agora são uma fraternal celebração. Para além do estampido dos foguetes escuta-se gente rindo e clamando de felicidade. Durante escassos minutos esquece-se o que nos incomodou a vida inteira. Saber esquecer é uma condição para se ser feliz. De repente, a cidade é uma única aldeia. Não é apenas um ano que começa. É um parto colectivo de uma esperança adiada. Não é um ano que termina. É todo um somatório de tristezas e desilusões que, por artes mágicas, em colectivo se desvanece.

 

 Pensando bem não somos apenas nós que nos celebramos, vivos e produtores de vida. Esta festa junta gerações de tempos mais longínquos do que podemos imaginar. O fogo de artifício que ilumina hoje os ceús de todas  cidades do planeta foi criado pelos chineses há milhares de anos atrás. Muito antes dos mesmos chineses terem inventado a pólvora, pedaços de bambú eram, nas aldeias do Sul da China, atirados para as fogueiras e explodiam com um grande aparato. Em Maputo e em todas as cidades do mundo enchemos os céus com esse luminoso fogo que cruzou as fronteiras da geografia e do tempo. Esse fogo converteu-se num património nosso, de toda da humanidade. Mas pouco se fala da origem dessas súbitas luzes que nos fazem vibrar. Os ciosos nacionalistas de hoje, que se fecham em fortalezas contra aquilo que consideram “estrangeiro”, estão, sem o saber, a celebrar a inventividade de camponeses chineses que há mais de 2000 mil anos inventaram um modo ruídoso e colorido para afugentar os maus espíritos.

 

Ao partilharmos esta festa, como sendo de todos nós, estamos celebrando uma certa versão da História. Essa versão foi imposta sobre as outras versões,  com todo o desfile de violência e de negação de diversidade. Estamos reproduzindo a herança dos antigos romanos que celebravam o inicio de Janeiro, mês consagrado ao Deus Janus (de onde vem o vem o nome do primeiro mês do calendário gregoriano). Estamos a revisitar a chamada história universal. Que não foi nunca tão universal como parece. E nem sempre foi assim: durante a Idade Média, a Igreja Católica considerou o primeiro de Janeiro uma data pagã e preferiu marcar o Ano Novo no dia 25 de março, o chamado “Dia da Anunciação” que marca a aparição do arcanjo Gabriel à Virgem Maria.

 

No século XVI, o papa Gregório XIII introduziu o calendário gregoriano e o primeiro de janeiro foi reestabelecido como Ano Novo nos países católicos. A Inglaterra foi exceção na Europa e continuou a celebrar a passagem do ano no dia 25 de março até 1752. Finalmente, naquele ano, o Parlamento alinhou os britânicos com o resto da Europa.  Celebrarmos todos o princípio do Ano no primeiro de Janeiro é o resultado de um percurso, de uma história que deveria ser mais conhecida. Essa história daria razões adicionais para celebaramos melhor o quanto há de diversidade numa festa globalmente partilhada.