As imagens do nosso ex-ministro e deputado camarada Manuel Chang que me foram chegando, ontem, do Kempton Magistrate Court, em Kempton Park, Joannesburg, África do Sul, são de uma pena arrepiante. Confesso que fiquei, em algum momento, comovido. Afinal sou humano.
Por falar em humano, o Chang que vi ontem não tinha atingido o estatuto de pessoa, muito menos de humano. Era simplesmente de um Chang biológico. Um organismo vivo que pertence a nossa espécie. Aquilo que o vulgo chama "ser vivo". Um espécimen de raça humana. Uma amostra de células vivas. Um amontoado de carnes e ossos envolto em tecidos.
Há uns dias, Manuel Chang era Manuel Chang. Pessoa. Ser humano. Super-ministro. Candidato à Presidente da Efe-Eme-Efe. Intelectual. Deputado. Camarada. Quadro. Compatriota. Senhor. Doutor. Excelência. Excelentíssimo. Digníssimo. Prezado. Respeitado. Um homem. Um ser moral e consciente, com arbítrio próprio. Uma grande personalidade.
Hoje tudo desmoronou. Uma carreira profissional e política de fazer inveja caíram perante uma ambição inconsequente. É difícil de compreender. O homem enfiou centenas e milhares de hospitais, escolas, bibliotecas, pontes, quilómetros de estradas, medicamentos, livros, furos de água, latrinas, etecetera, na sua conta.
E, hoje, o que sobrou dele? Um monte cheio de nada. Esteja ele cá ou lá, preso ou livre, extraditado ou não, Chang nunca será o mesmo. Não irá a tempo de recuperar "a pessoa" que ele construiu em mais de 60 anos de vida. O Chang que vi ontem, as calças lhe caem. O casaco nem parece dele. O Rolex treme. Este Chang não é o mesmo. Não é o "nosso". Este perdeu a alma. Empalideceu. Um aborto ambulante.
Mas, enfim, diria Robert Musil, "uma pessoa faz o que é, e se torna o que faz".
- Co'licença!
O que seria de uma grande final sem SUSPENSE? Hein? Seria o mesmo que Mahafil vs Zixaxa em pleno ano de 2019... Mas, não se está a falar de clubinhos. Não se está a falar de julgamento de "coitadinhos"... Este é um grande jogo. É um El Classico. É um Derby. Há bons executantes de ambos os lados. De um Chang (que joga fora, mas isso não o transforma num diminuído) e do outro, estão os EUA (jogam em casa = África do Sul, graças aos Tratados que têm em comum, fá-los serem os anfitriões). Como podem ver é uma partida emocionante. Mesmo assim já se soube, à partida, quem é o favorito. É tipo se hoje Real Madrid jogar contra Barcelona, o favorito será o Barça porque o Real está moleza. EUA são os favoritos. Por tudo o que representam nos seus directos interesses e nos dos moçambicanos. Chang é a parte não favorita. É o acusado. Não injustamente. Justamente sim. Por isso, imaginou-se, dentro dessa pré cenário que ele apanhasse 3-1...
Contudo, não foi bem assim. Está dois a dois. Chang conseguiu empatar. Já tínhamos dito, que no CENÁRIO 1 - poder-se-ia invocar que não há condições formais e legais suficientes para mantê-lo detido. Demos até 10% a esta possibilidade porque, olhando para a grandeza de um EUA não se vislumbrou amadorismo. Olhando para um ordenamento jurídico que põe Jaboc Zuma em sentido, não seria um processo contra um "Changuito" que iria dificultá-los... Mas está. E para piorar as coisas tiveram de frente um Chang que contratou um defensor altamente motivado.
Cobra muito, mas trabalha. Este defensor, enquanto nós nos entusiasmávamos com a possibilidade de ver um graúdo preso e a responder por crimes que cometeu deliberadamente, ele lia LETRA POR LETRA da Ordem de Detenção dos EUA e a ACUSAÇÃO. Viu no primeiro documento uma "brecha"... Lá está a escrito "deter Chang", porém não está escrito "extraditar Chang"... Ninguém mais tinha visto isso... Ninguém. Nem a Procuradora Sul-Africana. Esta ficou tonta com os argumentos dos defensores do meu querido ex Ministro e pediu PROLONGAMENTO... KKKKK... Nós aqui em Moçambique já a festejarmos pelo facto de o nosso Changuito ir nos representar nos SITEITES (acho que seria assim que meu amigo Juma Aiuba ia escrever) e veio essa de prolongamento... TO BE CONTINUED... PARTE 2... Eipah... a andar assim, estamos perante um potencial de uma TRILOGIA. Um SERIADO de verdadeiro suspense... 2-2. Chang mandou bem... Nome para o seriado? Sugiro: ANTOLOGIA CHANG... Depois melhoro o título...
Vamos lá mais a sério... Tenho que explicar o que é VERDADE REAL e o que significa VERDADE JURÍDICA (talvez, por força deste caso, falaria de INTERESSE PROCESSUAL - este é um termo que estou a inventar, mas funciona bem, até pode existir). É que não basta ter razão. É preciso provar materialmente. Chang desviou dinheiro sim. Não sozinho. Isso é verdade. Porque é verdade Dinis? Porque até o nosso parlamento aprovou o pagamento, em jeito de devolução com juros, de um dinheiro que nunca usámos. Então essa é uma verdade. Chang cometeu crimes... Outra verdade é que Chang ludribiou americanos. Sim, porque instituições norte americanas compraram títulos de empresas que nunca chegaram a funcionar. Tacitamente nunca existiram. Então EUA TEM RAZÃO. NÓS TAMBÉM QUE QUEREMOS JUSTIÇA TEMOS RAZÃO. Porém, os tribunais não trabalham com emoções.
Não trabalham com razão. Trabalham com a verdade que se prova. Mas não basta. É preciso respeitar uma série de requisitos formais e legais para que essa VERDADE NATURAL seja palpável aos olhos da Lei... Esses requisitos são os que apelidei de INTERESSE PROCESSUAL... Aquilo que sem o qual, o processo fica vazio... Então, quando a acusação americana manda DETER CHANG, mas no mesmo documento não acrescentou EXTRADITAR CHANG está, tacitamente, a querer privar a liberdade a um indivíduo sem necessidade... Sim, há crimes a ele imputados. Mas não se pode mandar deter um indivíduo confiando que depois é que se vai investigar. Porque para não existir EXTRADITAR CHANG é porque não tem "matéria" para justificar, ou não é momento. De uma ou de outra forma não se pode privar a liberdade do cidadão...
Amanhã vamos assistir ao construir de uma JUSTIFICAÇÃO DE INTERESSE DO PROCESSO... A Procuradora terá que dizer porque o Juiz deve, primeiro, manter Chang detido e a seguir, explicar como se EXTRADITA ALGUÉM SEM QUE SE TENHA PEDIDO TAL EXTRADIÇÃO... Justiça nem sempre é justa. Não se está a dizer que Chang não merece estar preso. Isso é outro assunto. Está a se dizer que há questões de legitimidade processual...
Isso é o que veremos amanhã... Pode também ser que se vá a uma terceira parte... Não sei qual...
Depois conversámos...
Chove há dois dias e aqui em Chalambe onde vivo, toda a desgraça vai despertar para renovar as nossas feridas colectivas. Os becos com saída vão ser desmentidos na sua vocação de vasos de comunicação. Assim como as vias estão no meu bairro, alagados, não posso movimentar-me em liberdade. A adega da Joana, onde geralmente tenho recorrido com os meus amigos para matar o tédio, está repelente. É lama por todo o lado. Charcos. Pior do que isso, a casa de banho que mesmo sem chuva é inóspita, agora tornou-se repugnante. Todos nós mijamos no chão. Sem nos importarmos com o forte cheiro da nossa própria urina. Estamos habituamos a este fedor. A este esterco. Mas o que me dói mais ainda é que eu, Nhambuli, já me resignei. Faço parte dessa escória.
Estou sentada na borda da cama escutando a música da chuva. Desliguei o televisor e o rádio. O som da precipitação pluviométrica, ao bater nas chapas de zinco que cobrem a casa a precisar de reparação, faz-me ouvir, na minha imaginação, o afro beat de Fela Kuti, com aquela enxurrada toda de sopros. Vivo sòzinha há mais de vinte anos, cercado de livros e discos que o meu marido deixou. Ele abandou-me e deixou-me com tudo. Foi por via dele que passei a amar os livros. A ouvir boa música. Mas agora que ele não está, tornei-me um farrapo. Não leio nada. Passo a vida a beber. A fumar. A drogar-me.
Chalambe, um dos bairros míticos da cidade de Inhambane, é a minha musa. Tenho muitos amigos aqui, mas celebrei ontem o meu sexagésimo aniversário natalício sozinha. Sem ninguém. Não queria ninguém. Desejava ardentemente sentir, agora como nunca, a dor da solidão, como uma verdadeira masoquista. Aviei-me com uma quantidade suficiente de “sativa” para aguentar o dia, quatro pequenas garrafas dessas bebidas horripilantes que estão a levar a juventude ao desvario e uns peixinhos (mihili), tirados desta baía linda como eu nos meus tempos de juventude.
Já perdi o hábito de recorrer à sombra da mafurreira que se ergue na marginal, junto à catedral da Igreja Católica, para contemplar o pôr-do-sol, que na minha ilusão de óptica cai por detrás daquela bela elevação do alto-Maxixe. Já não tenho motivação para o belo. E se aquele belo espectáculo da natureza já não me atrai, é porque eu própria perdi a beleza. Sobretudo por dentro. O belo atrai o belo. E o que me resta é esta molécola de Chalambe onde me misturo com desperdícios humanos. Eu também sou um trapo humano.
É extraordinária esta música de Fela Kuti replicada pela chuva que cai sobre as chapas de zinco que cobrem a minha casa. Estou sentada na cama a dançar. Não sou eu quem dança. É a minha alma alucinada pela “cosa nostra” que dança. O meu corpo não. Nem pode dançar. Está definhado. Inútil. E ao comemorar ontem os meus sessenta anos, percebi melhor que na verdade o que resta de mim, é este farrapo
Tenho vergonha de ser britânico pela primeira vez na vida. O Reino Unido tomou medidas duras contra Moçambique por causa da dívida secreta de 2 mil milhões de USD, cortando toda a ajuda dada directamente ao Governo. O Reino Unido, ao deixar cair o caso contra o Credit Suisse, deixou claro que esta punirá os países pobres que aceitam subornos, mas não os bancos de Londres que dão subornos. O povo de Moçambique sofre duas vezes - primeiro de um governo corrupto e depois do Reino Unido, cortando a ajuda à saúde e à educação. Mas em Londres, os corruptores vão em liberdade - até os Estados Unidos exigirem a prisão de quem subornou. O Reino Unido pareceu-se com Moçambique, recusando-se a processar os culpados e punindo os pobres, mas não os ricos. Mas, no caso do Reino Unido, a relutância em processar a Credit Suisse e a lavagem de dinheiro pode ser compreensível. Se o Reino Unido deixar a União Europeia, dependerá cada vez mais de dinheiro ilegal para manter a economia à tona. E precisará do apoio dos grandes bancos globais. (Joseph Hanlon)
Não há mais nada por se dizer, por enquanto. Dia 08 de Janeiro de 2019, Terça-Feira, só poderá terminar com uma das três seguintes possibilidades:
CENÁRIO 1 – Manuel Chang é solto pela justiça sul-africana por se considerar que não há condições formais para se manter ele detido (há uma série de formalidades que a acusação deve preencher); Ou que as acusações podem ser feitas à outras instâncias moçambicanas e não propriamente ao indivíduo (pouco provável); Acordos entre países (isto é delírio – pois não há espaço para a diplomacia intervir em questões legais) alegando que houve crimes sim mas com grande infusão de política. Portanto, volta em liberdade “absoluta” - este CENÁRIO 1 é o sonho da corja. Estão ávidos por dizer “A vitória prepara-se. Ganhámos com vitória retumbante, esmagadora e asfixiante”….
CENÁRIO 2 – Rudi Krause, engenhoso, bem pago e experientíssimo Advogado CONSEGUE O HABBEAS CORPUS = CHANG RESPONDER EM LIBERDADE – só não sei se, estar livre, significa poder voltar para Moçambique. Também há várias medidas de Coacção (permissão ou não de liberdade) e cada uma, desde a mais leve á mais pesada são aplicadas na proporção da dimensão do crime e da pertinência do arguido envolvido. Portanto, este CENÁRIO 2 é pouco provável pois, mesmo eu não dominando a legislação sul-africana, acredito que não se difere imenso do americano (que também não conheço, sabendo que pode ser Common Law – legislação que se desenvolveu por meio de experiência da própria justiça e não de atos executivos ou legislativos). Portanto, para se dar um Habbeas Corpus deviam existir uma das quatro possibilidades. (i) Ultrapassados os prazo legais de detenção – na situação em que está, Chang pode ir até 60 dias e até agora nem 30 dias fez; (ii) se a detenção for ilegal: ter sido detido em lugar legalmente não permitidos – Chang não foi detido no OR Thambo, mas sim numa via; (iii) se a detenção tiver sido ordenada por entidade não competente – Lei Americana, somado com o Tratado que tem com a Lei Sul-Africana e somado ao facto de os crimes imputados serem cabais torna esta possibilidade inviável; e (iv) deter quando a Lei não permite que esse caso precise de detenção – três co-arguidos de Chang detidos no exterior tiveram seus pedidos de responder em liberdade deferidos e o Jean Bostany NÃO por se temer fuga. Chang é a peça chave deste processo. Sem ele o risco de o mesmo não correr é grande pelo que se espera indeferimento do pedido de Rudi Krause se invocar esta possibilidade…
CENÁRIO 3 . MANUEL CHANG VOA PARA EUA. Desta audiência ficará chancelada a arrumação de todos os quesitos formais e legais para a sua extradição. Este CENÁRIO 3 é o mais provável até porque, depois do anúncio formal da existência dum gabinete de advogados muito engenhoso (defensores da família Gupta – “amigos de Zacob Zuma, líder corrupto que não escapou à pressão popular e às investidas da oposição e por conseguinte, acção firme e forte da justiça sul-africana, teve que se renunciar o cargo de Presidente e está a responder em tribunal), a justiça norte-americana marcou a data da primeira audição para 22 de Janeiro. Além de reduzir margem de manobras – veja que quando Krause disse que não fazia sentido o seu cliente estar privado de liberdade por 60 dias enquanto a justiça americana prepara a documentação ele contava que efectivamente se pudesse evocar tal questão. Mas, estando já marcada a primeira audiência significa que esses formalismos serão amanhã garantidos. Então, o resto dos 13 dias, serão para preparar o voo de Chang, a Hospedagem em Nova Iorque e preparos iniciais já em sede de comando do Juiz William F. Kuntz.
A sessão inicia as 09 horas. Depois das 12 Horas (provavelmente a essa hora terá tudo terminado), teremos muiiiito por dizer… as nossas TV´s deviam dar directos nesta terça-feira, até porque a audição em Kempton Park, África do Sul, é aberta = Pública… Cansa estarmos sempre a saber das novidades pelas mãos “externas”…
…Não fica bem!
Jovem, cheio de saúde e muita vida pela frente, Abdul Mulungo, o grande lateral direito do Maxaquene – irmão do antigo artilheiro “tricolor” Zainadine, e tio do Zainadine Jr. – deixou-nos, subitamente na última sexta-feira.
Tanto quanto soubemos, Abdul (que era asmático) estava em casa a assistir a um programa televisivo, naquela manhã quente de sexta-feira. Sentiu-se mal, com falta de ar, e pediu à esposa que abrisse as janelas da sala. A senhora assim fez e logo depois, naturalmente, regressou aos seus afazeres, na cozinha…
Algum tempo depois ao regressar à sala apercebeu-se que o marido se encontrava inerte, no sofá. Foi aí que, aflita, pediu ajuda aos vizinhos, só que já era tarde.
Abdul tinha perdido a vida…