Director: Marcelo Mosse

Maputo -

Actualizado de Segunda a Sexta

BCI
Marcelo Mosse

Marcelo Mosse

 MMNOVA22

Os funcionários das Finanças devem comunicar melhor. E dar a cara. Como os médicos fazem.  E dizerem claramente que eles estão contra duas coisas, essencialmente: eles eram os únicos funcionários do Estado que ganhavam salário mais 75% de subsídio. Esse 75% foi revisto em baixa. Justamente. Nem os médicos tinham esse privilégio. 

 

A segunda razão é que eles notaram que, na TSU, a discrepância entre o salário de um técnico e de um director era abismal. Reclamação justa. 

 

Entretanto, a demonstração de ontem abriu um precedente que levanta uma reflexão: a sindicalização da função pública. Em tempos de democracia, e a TSU mostra isso, é urgente que os funcionários públicos estejam enquadrados numa organização de classe que sirva também de interlocutora do Governo.

ribeirosomethi

O Carlos Nazareth Ribeiro que morreu nesta semana era um homem interventivo na sociedade e para isso ele usava sua amizade com jornalistas. Era daqueles seres inconformados, vivia no antípodas do fingimento cúmplice com o status quo. Carlos Cardoso era o jornalista a quem ele mais recorria. Ribeiro frequentava a redacção vezes sem conta ao fim do dia. Para deixar uma cacha. Ele era uma fonte fiel de informação. Cardoso era um cultor de fontes e em Ribeiro ele buscava clareza sobre suas dúvidas relativas à vida comercial de Maputo, as vicissitudes da burocracia estatal, incluindo a tributária. Ribeiro estava sempre solícito do outro lado da linha. Durante anos, ele geriu a Interfranca, quando o centro era o ícone da moda e afins em Maputo. Era um homem de referência.

 

E com reverência. Discretamente. Era um animal político. Quem lhe seguiu no Facebook mais recentemente deve ter percebido desse seu voluntarismo para o exercício da cidadania. Crítico. Mas um crítico que era anti panfletário, sagaz e mordaz, que apreciava o comentário político e a linguagem viperina do Carlos Cardoso. Houve entre ambos uma cumplicidade urdida na vontade da participação cívica quando o advento da democracia e das autarquias locais bateu as portas e emergiu entre muitos o entusiasmo e a crença de que era possível melhorar a gestão da cidade de Maputo no contexto de um laxismo generalizado e uma gestão caótica da terra urbana.


O JPC, um grupo de cidadãos que se mobilizou e conseguiu formar bancada na Assembleia Municipal de Maputo, gozando da inesgotável energia do Editor bateu se por uma agenda de transparência mas foi vencido pela ortodoxia da Frelimo. Cardoso, Ribeiro e companhia defendiam que a terra urbana podia ser uma fonte de receitas para a edilidade sem se abdicar do pressuposto Constitucional da propriedade estatal. Cardoso era contra a negociata milionária da terra, sobretudo nas barreiras e toda a faixa da Marginal.A terra é do Estado mas era vendida milionariamente para bolsos privados. Uma grande aberração. Carlos Ribeiro participou desses momentos de discussão efervescente sobre a vida da cidade de Maputo, tentando melhorar coisas como a gestão dos mercados e suas receitas, assim como a interacção com um galopante sector informal. Ribeiro foi um cidadão pleno. Eu venero a importância que ele depositava no jornalismo como uma ferramenta de mudança social. Sua cumplicidade com o Carlos Cardoso dá disso conta, sem batota.

 

O assassinato do jornalista foi uma crueldade sem paralelo. Ribeiro partiu há dias. Eu creio que ele deve ter se encontrado já com o Editor em qualquer reencarnação. Sua primeira novidade será revelar ao Cardoso do unanimismo que se apoderou da sua Frelimo. Pois, a Frelimo do Cardoso. O grupo virou de massa pensante para massa dançante. Quem escreveu que a razão era o que era e a emoção negra...


Um grande abraço Carlos Ribeiro

 

Marcelo Mosse



Cartamz.com

batatas compras min

A narrativa oficial do MADER (Ministério da Agricultura e Desenvolvimento Rural) registou um crescimento de 20% da produção local de batata-reno, nomeadamente na campanha agrária 2021-2022,atingindo 57 mil toneladas. 

 

Os dados oficiais apontam que, no mesmo período, Moçambique importou 70 mil toneladas, para cobrir o défice. Os mesmos dados oficiais prevêem que a produção local de batata-reno deverá crescer cerca de 20%, permitindo que mais de 50% da batata consumida passe a ser nacional. Como consequência do aumento da produção nacional, o preço da batata-reno baixou consideravelmente no Mercado Grossista do Zimpeto.

 

Um dos centros de maior produtividade de batata-reno, em Gaza, é o distrito de Massingir. Lá o saco de 10 kg, de batata limpa, é vendido, à porta do produtor, a 200,00 Mts. No mercado do Zimpeto, o preço de referência para a mesma batata, com data de 5 de Setembro, não ultrapassava os 230,00 Mts. 

 

Ontem, "Carta" foi dar uma espreitadela no Shoprite, para ver se a retórica governamental, a ladainha da contenção do custo de vida com base no aumento da produção local tinha correspondência efectiva na redução no preço final ao consumidor de alguns produtos de "bandeira", como é caso da batata.

 

O que apuramos foi um cenário de especulação sem paralelo. A mesma batata comprada a 200,00 Mts no produtor em Massingir é vendida a 299,00 Mts no Shoprite. Ou seja, cerca de 50% de margem de lucro.

 

Isto é um autêntico roubo ao consumidor final e é aqui onde entidades como o INAE (Inspecção de Actividades Económicas) devia apurar sua fiscalização. Mas o caso mostra que o encarecimento do custo de vida não pode ser atribuído exclusivamente às políticas governamentais, mas a predadores da especulação que navegam num mercado retalhista sem o devido policiamento. Fica aqui um TPC para o INAE.(M.M)

O PR, Filipe Nyusi, denunciou nesta semana uma ligação entre postos de abastecimento de combustíveis e o financiamento ao terrorismo que grassa em Cabo Delgado. Ele insinuou que havia indícios fortes de lavagem de dinheiro. E chamou a atenção das autoridades para a necessidade de se corrigir o problema.


Essa correcção deve ser feita pelo próprio Governo da República, em sentido lato, a dois níveis. O primeiro nível envolve a reversão do quadro legal, que foi relaxado entre 2015 e 2016, abrindo caminho à liberalização extrema da venda a retalho de combustíveis, e permitindo a operação de bombas de gasolina de linha branca, designadamente não vinculadas a qualquer gasolineira que faz importação.


Uma outra dimensão de correcção remete para a acção judicial. É de crer que Filipe Nyusi já tenha entregue as evidências de que dispõe às autoridades de justiça para que se intente uma acção penal contra quem financia o terrorismo e quem faz lavagem de dinheiro.


Da abordagem de Nyusi, subjaz uma percepção. A de que ele tem evidências. Se não tivesse, suas declarações seriam de uma gritante irresponsabilidade.


Mesmo assim, assumindo que ele tem informação cabal, sua responsabilidade era ficar calado, para não alertar os supostos prevaricadores, e deixar espaço para a justiça investigar serenamente. Suas declarações podem prejudicar as investigações, se é que existe uma investigação.


Outro problema é que Nyusi colocou todas as gasolineiras no mesmo saco. Ele não fez uma distinção operacional: a separação entre as bombas de linha branca e as bombas vinculadas às gasolineiras importadoras e distribuidoras (estas maioritariamente arregimentadas na AMEPETROL).


Essa distinção era necessária, sobretudo para o grande público, que desconhece o "big picture" do sector, seus actores relevantes e seu "modus operandi". O discurso do PR criou um certo mal-estar na indústria, tendo sido recebido com um misto de repulsa com um questionamento: E agora?


E agora? Perguntam-se as gasolineiras. Uma interrogação justa, pois nenhum posto de linha branca foi visado individualmente pelo PR, muito menos impedido em sede de contravenção administrativa ou procedimento criminal. Isto significa que as gasolineiras vão continuar a fornecer a todos, não sabendo se elas também estão, por extensão, financiando o terrorismo em Cabo Delgado.


Um peso moral demasiado grave: a possibilidade de minhas (dos distribuidores) operações estarem a financiar indirectanmente o terrorismo.


Seja como for, é percepção geral que nos meandros dos postos de abastecimento de linha branca movimenta-se muito dinheiro, cuja proveniência é duvidosa.


Nos últimos anos, este subsector teve um crescimento drástico, sob o seguinte pano de fundo. Entre 2015 e 2016, o Governo relaxou na regulação. Flexibilizou o mecanismo de fixação de preços, melhorando as margens para distribuidores e retalhistas. O negócio tornou-se altamente atractivo.


E o licenciamento de operadores, designadamente gasolineiras distribuidoras, foi facilitado. Hoje, Moçambique tem cerca de 40 gasolineiras licenciadas (a África do Sul tem apenas oito), embora apenas 15 estejam no activo. Cada uma destas gasolineiras é obrigada, por lei, a ter pelo menos um posto de abastecimento de bandeira.
Mas o Governo abriu também espaço para a entrada no retalho de postos de abastecimento de linha branca, designadamente bombas que não têm qualquer relação umbilical com as gasolineiras distribuidoras.


Hoje, qualquer cidadão pode abrir um posto de linha branca, desde que tenha um vínculo contratual de fornecimento com uma gasolineira. Esse licenciamento da linha branca foi, aliás, descentralizado, não se sabe com que intenções. O efeito foi imediato. As bombas cresceram como cogumelos e o Estado quase perdeu o controlo deste nicho. Requisitos ambientais como a distância de 5 km entre cada posto estão sendo violados, a olhos vistos.

Nas regiões centro e norte do país, a proliferação de postos de linha branca é visível. No corredor Beira/Machipanda existem cerca de 20 postos. A maioria é propriedade de estrangeiros, nomeadamente somalis, tanzanianos e chineses.

De onde vem o financiamento? Ninguém sabe, ninguém exige informação. Talvez o PR saiba! Aliás, ele disse que tinha essa informação e que não estava a fazer acusações sem bases. E exigiu que o MIREME e a Autoridade Tributária garantam a legalidade das operações dos postos de linha branca. Mas, mesmo em face do alerta de Nyusi, ainda não é claro se o licenciamento destes postos vai ser interrompido. "Carta" sabe que há na mesa pedidos de autorização para cerca de 20 novos postos. Afinal quem põe o guizo ao gato? (M.M.)

quarta-feira, 17 agosto 2022 06:21

Assalto ao Santos

MMNOVA22

eleicoes mz min

Na semana passada, a organização CDD (Centro para Democracia e Desenvolvimento), liderada pelo activista Adriano Nuvunga, organizou uma "webinar" para discutir uma proposta de Lei da Acção Popular, a ser submetida à consideração dos deputados da Assembleia da República. O CDD juntou no evento algumas figuras de relevo dentro do espectro da sociedade civil moçambicana.

 

Mas, nas vésperas do evento, aconteceu uma coisa inusitada. Jornalistas e actores da sociedade civil foram desencorajados a participar desse evento. Por quem? Pelo ex-político e agora activista Ismael Mussá (que já pontificou na Renamo e no MDM). Porquê? Há poucos anos, Mussá criou uma Organização Não-Governamental, chamada Observatório da Cidadania.

 

Na semana passada, ele usou “fundos e mundos” para mostrar que o CDD lhe estava roubando a ideia, que a agenda da Acção Popular era exclusivamente dele e da sua organização. Com esta narrativa, ele tentou “sabotar” o evento do CDD. Não terá conseguido seus intentos, mas deixou no ar a penosa imagem de organizações de sociedade se digladiando por uma agenda que pertence ao povo.

 

É um facto que há pouco mais de um ano, o Observatório da Cidadania, juntamente com outras organizações, entregou na Assembleia da República uma proposta de Lei da Acção Popular, da iniciativa de um grupo de cidadãos. A iniciativa do Observatório deve ser elogiada, pois insuflou mais oxigênio numa demanda legislativa que serve à democracia e não a qualquer ONG em particular.

 

No entanto, a primeira tentativa de se fazer aprovar uma lei semelhante não pertence à organização de Ismael Mussá, muito menos ao CDD de Adriano Nuvunga. Eis os principais factos históricos.

 

Em 2001, o Dr. João Carlos Trindade, Juiz Jubilado do Tribunal Supremo, era o diretor do Centro de Formação Jurídica e Judiciária (CFJJ). Ele, o Dr. Carlos Serra Júnior e outros colaboradores do Centro elaboraram a primeira proposta de Lei da Acção Popular, a pedido da própria Assembleia da República. O documento foi entregue em 2001 ao Secretariado da AR, que o guardou num canto poeirento.

 

Mas, em 2004, uma revisão pontual da Constituição da República (CRM) foi pretexto para se introduzir o princípio da Acção Popular na Lei Mãe. Esse princípio está lá. Como? O legislador nada mais fez do que escarrapachar “ipsis verbis” um artigo da lei proposta, mas arquivada. E o princípio permaneceu na CRM.

 

Quatro anos depois, uma nova tentativa de fazer passar a Lei da Ação Popular foi engendrada pela antiga Unidade Técnica de Reforma Legal (UTREL), sob a liderança do Dr. Abdul Carimo Issá. A UTREL fez uma revisão enriquecida da anterior proposta e entregou-a ao Ministério da Justiça para que o Governo se apropriasse dela e a submetesse à Assembleia da República.

 

Foi por volta de 2008. A proposta fazia parte de um pacote legislativo anti-corrupção (onde o CIP participou no aprofundamento da legislação anticorrupção), que incluía uma revisão da Lei de Combate à Corrupção, a reforma do quadro legal sobre o Habeas Corpus e a Lei da Probidade Pública.

 

O Governo, em 2008/2009, deixou passar a Probidade Pública e a reforma da Lei de Combate à Corrupção, mas arquivou a reforma do Habeas Corpus e a introdução da Acção Popular. Na semana passada, quando o CDD trouxe o assunto à baila, tratou-se de um novo fôlego nos esforços para que a acção popular fosse legislada. Esta lei é cada vez mais importante.

 

O actual quadro legal em Moçambique permite apenas que se litigue sobre conflitualidades de natureza individual, deixando de lado a litigação no quadro dos Direitos Difusos, através da acção popular e visando a proteção da sociedade em casos de violação nas áreas, por exemplo, dos direitos humanos, dos direitos do consumidor ou a protecção ambiental.

 

Ou seja, a Lei da Acção Popular é propriedade da democracia, do povo, e ninguém, nenhuma ONG em Moçambique deve reivindicar que é seu dono. Por outro lado, quanto mais organizações estiverem advogando no sentido da sua aprovação melhor. Viva a democracia! (Marcelo Mosse)

Um anúncio a ser feito dentro de dias vai marcar a semana de milhares de moçambicanos, que receberão de braços abertos a concretização da boa nova. Mas esse anúncio devia trazer consigo  um Anexo. Esse Anexo traria a lista dos deveres gerais e específicos dos Funcionários e Agentes do Estado. 

 

Uma melhoria na sua remuneração deve ser acompanhada de uma melhoria no seu comportamento. A codificação de comportamentos na Função Pública em Moçambique está dispersa no Estatuto Geral do Funcionário e Agente do Estado, no seu Capítulo 7 (deveres gerais e deveres especiais). 

 

Esses comportamentos esperados deviam estar compilados num Código de Conduta (de Ética) do Funcionário e Agente do Estado. Isso ainda não foi feito. Devia! Agora que os contribuintes vão abrir as bolsas para um novo pacote salarial na Função Pública é necessário que os beneficiários melhorem o seu comportamento. Coisas como cobranças ilícitas, absentismo, arrogância devem ser ultrapassadas. Os funcionários e agentes do Estado devem interiorizar  e praticar a boa conduta. Esperemos!

PR PGR min

A PGR fez mal em ir a Londres e batalhar para que as “dívidas ocultas” fossem judicialmente declaradas ilegais? Não!

 

A PGR agiu correctamente. Toda a sociedade civil se indignou com a descoberta do endividamento corruptivo e suportou a posição segundo a qual os moçambicanos não devem pagar dívidas que se revelaram num calote e beneficia meia dúzia de agentes do colarinho branco a soldo de uma máfia franco-libanesa.

 

A PGR ir a Londres foi um acto de bravura do advogado do Estado. As acções judiciais no estrangeiro tiveram um tremendo significado político. Moçambique ergueu-se para defender sua soberania (mesmo no caso do processo da extradição de Manuel Chang para Maputo), distanciando-se de uma dívida perversa e fazendo com que, em última análise, e depois de alguns anos em banho-maria, o Fundo Monetário Internacional (FMI) reiniciasse seu programa de empréstimos a Moçambique, com financiamento directo ao orçamento, arrastando, paulatinamente, outros doadores que tinham virado costas ao país e àquela modalidade de ajuda.

 

Por outras palavras, o custo político de uma inacção da PGR no estrangeiro seria grave. E, eventualmente, o diálogo com e o apoio dos doadores permaneceria no limbo. Aliás, o Conselho Constitucional também declarou a dívida como inconstitucional. De modo que ir a Londres foi também uma atitude de alinhamento com essa declaração de inconstitucionalidade. 

 

E se a PGR ganhar o principal processo (Estado moçambicano contra o CS, Privinvest e outros – Declaração de ilegalidade das garantias e responsabilização civil dos que participaram na contracção das dívidas – High Court of Justice, Business and Property Courts of England and Wales Commercial Court)? No caso dessa hipótese ainda em aberto se verificar, será a cereja no topo do bolo. Moçambique recuperaria boa parte dos milhões roubados. E se perdemos, uma nova tragédia orçamental.

 

Mas...

 

Mas a PGR, como entidade do Estado, tem o dever de ser transparente, ela própria. A PGR tem o dever de prestar contas à sociedade. A PGR deve explicar qual foi o critério usado para contratar cada uma das firmas de advocacia estrangeira, as quais prestam serviço a Moçambique enquanto autor de acção judicial e as que nos defendem de acções e contra-atacam, seja em tribunais criminais como em fóruns de arbitragem.

 

A PGR tem o dever de explicar quem paga as suas despesas no estrangeiro. Se é o Governo, via orçamento do Estado, ou se são outras fontes...deve explicar-nos se os custos dessa toda assessoria não ultrapassam os limites orçamentais aprovados pela AR. Deve, em suma, vir a público explicar porque contratou esta firma e não aquela outra. É isto que pedimos!

 

“Carta” não está contra a PGR ter ido a Londres disputar a legalidade do endividamento oculto. O que pretendemos é que a Procuradoria Geral da República preste contas relativas às suas acções, sobretudo quando isso não acontece em sede da Assembleia da República.

 

A PGR não deve ser uma ilha isolada num arquipélago onde todas as outras ilhas devem actuar com probidade. Ela deve ser o exemplo cimeiro da transparência. É isso que exigimos! (Marcelo Mosse)

segunda-feira, 20 junho 2022 08:38

O gás do Rovuma e a celebração do futuro

A incursão de jihadistas em Memba, depois de atravessarem o Lúrio descendo de Cabo Delgado e penetrando no eixo Macua, fez de um pacato vilarejo daquela região um ponto de atenção no mapa-mundi. Twitters, postagens de facebook e partilhas em whatsapps e telegrams pipocaram como cogumelos na última sexta-feira.

 

Parecia a celebração de um ataque, abominável. Em vez da condenação, as partilhas “normalizaram” a tragédia, tornando-a nosso destino colectivo. O ISIS estava mesmo descendo para o Sul. A incapacidade das forças da SAMIN (dominada por sul africanos) foi exaltada. Mas no fundo estava o pano negro do ISIS e o manto diafáno do seu terror cobrindo toda a esperanca sobre gás do Rovuma. Parecia que a bacia tinha jorrado sobre todos nós, em vez do milagroso recurso, uma torrente de desesperança.

 

A atenção mundial centrou-se na insegurança de Moçambique como destino, o medo aplacou-se nas conversas e os americanos declaravam que Ancuabe e Metuge eram lugares inóspitos para seus cidadãos em virtude da insegurança, contrariando o Presidente Nyusi, que escalou Ancuabe e disse que a vida estava normalizada, e a Syrah Resources, que declarava, também na sexta feira, sua retomada de operações na mineração de grafite em Balama, que fica a sudoeste de Ancuabe.

 

O terror estava de novo implantado nas nossas cabeças, dominando as narrativas.

 

Mas o Governo, numa diligente estratégia de comunicação politica e maquinação psicológica, tirou um coelho da cartola. Náo anunciou o arranque da produção de gás no Rovuma, mas parece tê-la anunciado. 

 

O comunicado do MIREME sobre o assunto fez manchete em todo o mundo, em todos os jornais, que acriticamente e sem contraditório, abriram extemporaneamente os Moets e Chandons que deverão ser abertos pelo Presidente Filipe Nyusi, quando a produção do gás começar, efectivamente, lá mais para o final do Ano.

 

E, de repente, o terror foi substituído pela celebração. A celebração de uma tragédia que teima em resistir, a tragédia do terror, uma celebração acrítica, foi derrubada por uma meia verdade governamental que carrega consigo um carrada de esperança e optimismo. Uma espécie de celebração do futuro. O gás do Rovuma é uma questão de meses. (Marcelo Mosse)

terça-feira, 14 junho 2022 09:51

Alguns desafios para Magala

Quando Mateus Magala deixou a EDM em Novembro de 2018 e regressou ao Banco Africano de Desenvolvimento (BAD), onde antes fora funcionário sênior, ele foi incumbido por Akinwume Adesina, o Presidente do BAD, para reformar o banco e torná-lo mais visível, actuante e responsivo relativamente a crises, à escala global. Seu mandato era de três anos. 

 

Regressado ao BAD, encontrou um cenário de desalinhamento interno, nomeadamente entre a Direcção Executiva e o Conselho de Administração. Magala resolveu as "makas" que lá encontro.

 

Sua ida ao BAD, onde assumiu as funções de Vice-Presidente para Recursos Humanos e Relações Institucinais, foi uma escolha pessoal de Adesina, uma verdadeira  “head hunting”.  As negociações entre Adesina e Filipe Nyusi levaram sete meses. Nyusi libertou-o devido a insistência do BAD...e consciente de que encontrar um substituto para Magala na EDM não seria fácil (e não foi; o sucessor, Aly Sicola Impinja, foi como que um tiro pela culatra).

 

Magala regressa a casa, mas agora com responsabilidades políticas acrescidas. Ele deverá ser testado, nomeadamente a sua capacidade de lidar com interesses políticos de acumulação na Frelimo.

 

No plano das comunicações, a questão da taxa de interligação na telefonia móvel, incluindo a abertura da Tmcel a privados, são dois desses assuntos que suplantam o escopo da gestão. O velho problema do “gateway” nas chamadas internacionais deve ser abordado (chamadas internacionais de Moçambique para o exterior vão primeiro para a África do Sul, que as reencaminha para o destino final; é uma questão de infraestrutura de hardware-software, que pode ser implantada internamente, reduzindo custos e protegendo a soberania).

 

A gestão danosa da antiga Mcel deve ser responsabilizada. Isto depende da Justiça, mas Magala pode mexer seus cordelinhos, se o deixarem. Trata-se de influenciar a Justiça para que esta siga a pista do dinheiro, onde ele foi aplicado, e ressarcir-se o Estado (ou a empresa). A actual gestao da Tmcel tem sido muito comedida a este respeito, carregando, no entanto, o fardo e as consequências da roubalheira consigo

 

No domínios dos transportes, Magala deverá retomar o desafio da cabotagem e da operacionalização do regulador portuário. A cabotagem morreu porque ela era insustentavel economicamente. Os barcos regressavam do centro e norte sem carga que justificasse o negócio (frete seco) num contexto em que as taxas portuárias foram pensadas para a cabotagem internacional.

 

A provisão e humanização dos transportes públicos terrestres é uma grande prioridade.

 

A navegação fluvial, como uma ferramenta para comercialização agrícola, deve ser equacionada, mas certamente a discussão do papel dos CFM, que virou uma empresa rendeira, é incontornável. A empresa deverá investir mais do que fez no recentemente inaugurado Porto Seco de Ressano Garcia, para viabilizar melhor a Linha de Ressano, preterida a favor de um forte “lobbie” de transporte rodoviário de carga, que a par da eficiência na tramitação fronteiriça, coloca pressão sobre auto-estrada N4.

 

Coisas como a LAM com seu descalabro, e a Aeroportos de Moçambique (com sua gestão tacanha: Mavalane não tem ar-condicionado) são aspectos de mera gestão e Magala saberá como lidar com elas. A expectativa é enorme. A ver vamos, se bem que dois anos de mandato é um horizonte temporal limitado .(M.M.)

Pág. 7 de 8