Director: Marcelo Mosse

Maputo -

Actualizado de Segunda a Sexta

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Carta de Opinião

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Moçambique está preparado para um crescimento estimulante nos próximos anos. Com efeito, segundo o governo moçambicano, o crescimento económico do país do sudeste africano (em 2023) ultrapassou a média regional da Comunidade de Desenvolvimento da África do Sul (SADC).

“O crescimento económico para 2023 atingiu 5%, face aos 4,4% de 2022, impulsionado pelas indústrias extractivas, turismo, agricultura, transportes e comunicações, entre outros”, afirmou o governo moçambicano.

Estabelece o cenário para uma trajetória optimista; no entanto, o país também enfrenta uma lacuna de competências em vários sectores, o que constitui um argumento firme para o desenvolvimento de talentos locais e a necessidade de pessoal experiente no terreno.

Para entender o presente

A história de guerra civil do país teve um impacto significativo nas comunidades locais e no sistema educativo nacional, fazendo com que uma grande parte da população apenas alcançasse o ensino primário.

O desafio reside, portanto, na escassez de indivíduos que prosseguiram a educação para além da escola primária. Um pequeno número ingressa no ensino secundário e um número ainda menor o conclui para atingir um nível que os qualifica para a universidade. A formação profissional pós-secundária também é limitada, tornando difícil encontrar candidatos para funções técnicas.

A boa notícia é que o governo moçambicano está a enfrentar o desafio da escassez de competências, incentivando as empresas a investir nas comunidades locais através da oferta de oportunidades educacionais juntamente com projectos de grande escala. Na Schneider Electric, por exemplo, estabelecemos uma parceria com a Don Bosco Moçambique para fornecer formação profissional vital à força de trabalho local.

Além disso, esperamos que o nosso pessoal contratado localmente aumente os seus conhecimentos de tal forma que possam contribuir para todo o continente.

Desenvolvimento de habilidades específicas do sector

A abordagem da Schneider Electric ao desenvolvimento de competências visa garantir que a nossa força de trabalho seja capaz de trabalhar com tecnologias avançadas que estão a tornar-se padrão da indústria e, mais importante, pertinentes para Moçambique.

A manutenção preditiva é um bom exemplo e é relevante para inúmeras indústrias moçambicanas, como CPG (bens de consumo embalados) e Energias e Produtos Químicos. Ao aproveitar a análise de dados e algoritmos preditivos, as empresas podem antecipar falhas nos equipamentos antes que elas ocorram, permitindo manutenção oportuna e redução de interrupções.

Aqui, é portanto importante que Moçambique tenha os técnicos locais e a experiência resultante para implementar a manutenção preditiva. Esses profissionais qualificados podem colectar e analisar dados, interpretar padrões e tomar decisões informadas.

É importante ressaltar que estas equipas locais permitirão às empresas planear eficazmente a sua manutenção, garantindo que as peças sobressalentes estão disponíveis, as reparações são eficientes e o tempo de inatividade da produção é minimizado de forma mais estratégica.

Além disso, a capacidade de prever o comportamento dos equipamentos em intervalos de tempo específicos permite que as empresas programem interrupções ou reparos de forma proativa. Seja planeando os próximos 30 dias ou resolvendo um problema fora dos horários de pico, a manutenção preditiva garante operações mais tranquilas e maior confiança na confiabilidade do equipamento.

Combinada com a experiência local, a manutenção preditiva pode deixar uma marca indelével na economia crescente de Moçambique, permitindo às empresas gerir proactivamente os seus activos, reduzir custos e aumentar a produtividade.

O EcoStruxure Asset Advisor da Schneider Electric é uma poderosa arquitectura IoT que ajuda as empresas a gerir os seus ativos de forma mais eficaz. Ao registrar a base instalada existente no local, o software pode identificar quais ativos precisam de atenção com base em sua idade, uso e implantação.


Isso cria um registro base instalado que é inestimável para o gerenciamento de ativos. Em última análise, as empresas moçambicanas ganharão visibilidade dos seus activos em vários locais, todos centralizados numa única plataforma.

 

*Artigo de opinião. Maputo, 14 de junho de 2024

“Na história das eleições multipartidas em Moçambique, o pior desempenho averbado pelos candidatos da Frelimo, não haja dúvidas, foi nas eleições de 1994 e 1999. Trata-se das primeiras e segundas eleições gerais e legislativas. Relativamente ao partido Renamo, o seu pior desempenho foi nas eleições de 2009, em que Afonso Dhlakama obteve 16% e o seu partido conseguiu 49 assentos. Atenção, isto aconteceu na era Dhlakama e não de Ossufo Momade.

 

A reversão nas preferências do eleitorado em Moçambique tem dois nomes essenciais: Armando Emílio Guebuza, na sua qualidade de Secretário-geral da Frelimo e mais tarde candidato da Frelimo e o seu mobilizador-mor, Edson da Graça Macuácua. Estas duas figuras, naturalmente, com apoio de toda a máquina partidária, foram responsáveis por recolocar a Frelimo no seu lugar, o lugar de vencedora. Mais tarde, Filipe Jacinto Nyusi, com o seu discurso inaugural, como Presidente da República, ajudou bastante (o meu patrão é o povo e todos moram no meu coração), reconheça-se!

 

A Frelimo e os seus candidatos tiveram maior desempenho nas eleições de 2009 e 2019, com dois candidatos diferentes, Armando Emílio Guebuza e Filipe Jacinto Nyusi, ao averbar 75% e 73% respectivamente. Estes números têm algum significado. Pese embora, se diga que a história não vota, estes números mostram, para quem pretende estudar a história, que a Frelimo, nas eleições de 09 de Outubro de 2024, continuará vencedora. O principal adversário da Frelimo e seus candidatos, de 2009 a esta parte, têm estado a ter um declínio acentuado. Para o presente ano eleitoral, revelaram-se sem agenda política para Moçambique, concordemos ou não, aceitemos ou não, são factos, contra os quais não há argumentos”.

 

AB

 

Moçambique vai às sétimas eleições gerais e legislativas e, ao mesmo tempo, irão acontecer as quartas eleições provinciais, cimentando, deste modo, o compromisso de Moçambique com a realização dos pleitos eleitorais com a periocidade de 4 em 4 anos. Pode-se questionar a natureza da nossa democracia em outros aspectos, mas não no capítulo da realização das eleições. Desde 1994, quando realizamos as primeiras eleições multipartidárias, as mesmas continuaram a ter uma periocidade normal.

 

Quando vamos às sétimas eleições gerais e provinciais, vale a pena reflectir sobre o que tem sido esse movimento popular e quais as suas preferências políticas. Sabe-se que também teremos as eleições pronviciais, contudo, essas eleições não serão objecto desta reflexão. Olhemos para o nosso histórico eleitoral. Isto pode ajudar-nos a fazer melhor vaticínio das eleições de 2024.

 

Nas primeiras eleições gerais e legislativas em que concorreram 12 personalidades e 14 partidos políticos, o resultado obtido foi o seguinte: para a Presidência da República, ganhou o candidato da Frelimo, por uma percentagem de 53,3% e conseguiu 129 assentos dos 250 disponíveis na Assembleia da República. Neste pleito, o candidato da Renamo, Afonso Macacho Marceta Dhlakama, ficou em segundo lugar e obteve 33,7% dos votos válidos, tendo a Renamo conseguido 117 assentos dos 250 disponíveis. Os restantes 10 candidatos e 12 partidos partilharam o resto percentual.

 

Nas eleições de 1999, o candidato da Frelimo foi Joaquim Chissano e obteve 52,3% das preferências dos eleitores. Desce ligeiramente e a Frelimo obteve 133 lugares na Assembleia da República, crescendo o número de Deputados. Já Afonso Dhlakama obteve 47,7% (subiu de forma astronómica, nas preferências dos eleitores) e conseguiu 117 lugares na Assembleia da República. Nota-se aqui também o crescimento, embora ligeiro.

 

Nas eleições de 2004, a Frelimo muda de candidato à Presidência da República e, no lugar de Joaquim Chissano, entra Armando Emílio Guebuza. Nestas eleições, o candidato do partido Frelimo obteve 63,7%, uma subida estrondosa em relação ao adversário directo, que obteve 31,7% na Assembleia da República. A Frelimo conseguiu 160 lugares e a Renamo obteve 90 lugares. Foi uma baixa bastante considerável, tanto nas presidenciais como nas legislativas e aqui é preciso recordar que foi graças ao empenho do novo Secretário-geral da Frelimo, Armando Emílio Guebuza e do seu mobilizador, Edson da Graça Macuácua, que fizeram um trabalho político notável, o que garantiu a preferência dos eleitores.

 

Nas eleições de 2009, o candidato da Frelimo continuou Armando Emílio Guebuza. Nesta eleição, obteve75% das preferências do eleitorado, uma percentagem record na história das eleições Multipartidárias em Moçambique que, em 2019, Filipe Jacinto Nyusi quase repetia, como veremos mais adiante, tendo conseguido 191 Deputados na Assembleia da República, dos 250 disponíveis. Nesta eleição, o candidato da Renamo, Afonso Dhlakama, que participava como candidato da Renamo pela quarta vez, obteve 16% e, na Assembleia da República, conseguiu apenas 49 assentos. Este terá sido o pior desempenho político da Renamo, nas eleições multipartidárias, que tiveram início em 1994.

 

Em 2014, o candidato da Frelimo volta a mudar, tendo sido indicado pelo seu Comité Central a candidato Filipe Jacinto Nyusi, tendo obtido 57,03% e 144 lugares na Assembleia da República. Sem dúvidas, o candidato da Frelimo, considerando o desempenho anterior, quer nas Presidenciais, quer na Assembleia da República, esteve mau, contudo, na história eleitoral, conseguiu suplantar o candidato da Frelimo, nas eleições de 1994 e 1999, tendo conseguido a Frelimo 144 lugares na Assembleia da República. Note aqui também que a Frelimo obteve mais lugares comparados com os anos 1884 e 1999. O candidato da Renamo continuou pela quinta vez Afonso Dhlakama e obteve 36,61% e 89 lugares na Assembleia da República, um feito excelente para o candidato e para a própria Renamo.

 

No ano de 2019, por morte de Afonso Macacho Marceta Dhlakama, no dia 03 de Maio de 2018, a Renamo apresenta um novo candidato às Presidenciais. Trata-se do General Ossufo Momade que concorre com o candidato da Frelimo e outros. No caso da Frelimo, Filipe Jacinto Nyusi é o candidato à sua própria sucessão e, como dizia acima, obteve um resultado histórico de 73% da preferência do eleitorado e 184 lugares na Assembleia da República. Enquanto isso, Ossufo Momade obteve 21,88% e aqui devo sublinhar que, apesar de ser mau desempenho, Ossufo Momade esteve melhor que o seu antecessor. Nas eleições de 2009, quando obteve 16% com 49 lugares na Assembleia da República. A Renamo, em 2019, obteve 60 lugares.

 

É importante deixar, aqui e agora, uma nota que se pode associar a este péssimo desempenho da Renamo e seu candidato. Depois da morte de Afonso Dhlakama, a Renamo sofreu alguma “fractura”. Tivemos, em Moçambique, um grupo que não aceitava a liderança de Ossufo Momade e que se refugiou nas matas da Gorongosa e outro grupo que estava nas cidades e aceitava o novo líder. Durante o processo de recenseamento, a Renamo que permanecia nas matas boicotou o recenseamento, apelando aos seus seguidores nas zonas rurais e urbanas a não se recensearem. Este grupo das matas foi liderado por Mariano Nhongo.

 

Finalmente, se os números servem para alguma coisa, estes mostram, de forma clara e objectiva, que a Frelimo irá ganhar as eleições de 2024. Pode ser com dificuldade aqui e acolá, mas não haja dúvidas que Daniel Chapo e a Frelimo serão, mais uma vez, vencedores das eleições, mercê de uma grande máquina organizacional que o partido tem e mantém. Vamos ao trabalho!

 

Adelino Buque

Por razões ainda obscuras, o Instituto Nacional de Comunicação de Moçambique – INCM decidiu pelo aumento das tarifas sobre os serviços de voz, SMS e dados móveis (uso de internet), através da Resolução n.º 1/INCM/2024, de 19 de Fevereiro, o que não foi bem recebido na sociedade moçambicana, tendo gerado indignação e contestação generalizada, incluindo acções de manifestação popular, na via pública, em quase todas as capitais provinciais. Paralelamente, houve interpelação formal ao INCM e acção judicial contra a supra mencionada Resolução, tudo com vista à revogação desse diploma legal emanado pelo INCM.

 

Na sequência das acções de manifestações contra a Resolução n.º 1/INCM/2024, de 19 de Fevereiro, que fixa os limites mínimos das tarifas de telecomunicações, o Conselho de Ministros, na sua 17ª Sessão Ordinária, realizada no dia 28 de Maio de 2024, decidiu orientar, ou seja, ordenou o INCM, entanto que Autoridade Reguladora das Comunicações em Moçambique, a suspender a Resolução em referência. Essa ordem foi supostamente acatada pelo INCM em conformidade com o comunicado de suspensão da Resolução n.º 1/INCM/2024, de 19 de Fevereiro.

 

No entanto, o INCM não deu a conhecer o instrumento através do qual suspendeu a Resolução n.º 1/INCM/2024, de 19 de Fevereiro, tampouco tornou pública a data da entrada em vigor dessa suspensão e os efeitos práticos da mesma. O que revela um comportamento fraudulento com o intuído de acalmar os ânimos da população que se tem rebelado contra a Resolução em questão.

 

Esse acto de suspensão proferido pelo INCM, se existe, não tem qualquer eficácia, uma vez se desconhecer o período da sua vigência, para além de que as operadores continuam a aplicar a Resolução n.º 1/INCM/2024, de 19 de Fevereiro, considerando que as novas tarifas fixadas continuam funcionais em prejuízo dos direitos e interesses legalmente protegidos dos consumidores dos serviços de voz, SMS e dados móveis (internet), os quais continuam a apagar valores elevados e injustos para se beneficiarem desses serviços.

 

É, pois, fácil notar a tendência enganadora do INCM pelos termos em que foi emanada a polémica suspensão e o seu carácter obscuro no que concerne ao período da sua vigência e efeitos práticos que da mesma se pretende, atendendo à contestação dos consumidores dos serviços em causa. 

 

Estranha e curiosamente, a mesma suspensão refere-se que decorrem estudos, em coordenação com as operadoras de telefonia, no sentido de dar seguimento às recomendações do Conselho de Ministro. Ora, esta é, indubitavelmente, uma prova inequívoca de que os fundamentos e estudos metodológicos que serviram de base para a aprovação da Resolução n.º 1/INCM/2024, de 19 de Fevereiro são, de facto, tenebrosos.

 

Assim, do acima exposto, dúvidas não restam de que o INCM está a agir contrariamente às normas e princípios da actuação da Administração Pública previstos na Lei n.º 14/2011, de 10 de Agosto (Lei do Procedimento Administrativo), mormente:

 

  1. O princípio da boa-fé que obriga o INCM, entanto que órgão ou instituição da Administração Pública, a actuar e relacionar-se com os administrados de acordo com as regras da boa-fé no desempenho da actividade administrativa em todas as suas formas e fases. Ao enganar o povo relativamente aos termos da Resolução n.º 1/INCM/2024, de 19 de Fevereiro e da sua suspensão, o INCM age tendencialmente de má-fé. Na verdade, os cidadãos são consumidores de um serviço público precário e baseado na má-fé pelo INCM
  2. Princípio da Transparência, na medida em que o INCM não colocou no domínio público a data da entrada em vigor da suspensão e os efeitos práticos da mesma relativamente à contínua operacionalização das taxas das tarifas de telecomunicações, fixadas em alta.
  3. Princípio da colaboração da Administração Pública com os administrados – de acordo com este princípio da actuação da Administração Pública, o INCM deve prestar informações, bem como esclarecimentos que lhe foram solicitadas sobre a Resolução n.º 1/INCM/2024, de 19 de Fevereiro e sobre o acto da suspensão da mesma, o que não está a acontecer por pura arrogância e abuso de poder por parte do INCM.
  4. Princípio da participação dos administrados, segundo o qual o INCM deve promover a participação e defesa dos interesses dos administrados, na formação das decisões que lhes disserem respeito. Todavia, tal não está a ser observado e respeitado, na medida em que os administrados, entanto que consumidores dos serviços de telefonia móvel, estão a ser vítimas de exclusão nos processos de tomada de decisão em causa, para além de que vêem os seus direitos e interesses prejudicados em privilégio das operadoras e alguma elite.

 

Importa lembrar que o artigo 248 da Constituição da República de Moçambique (CRM) estabelece o seguinte relativamente aos princípios fundamentais da Administração Pública:

 

  1. A Administração Pública serve o interesse público e na sua actuação respeita os direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos.
  2. Os órgãos da Administração Pública obedecem à Constituição e à lei e actuam com respeito pelos princípios da igualdade, da imparcialidade, da ética e da justiça.

 

A novas tarifas não foram fixadas no interesse público, nem em coordenação com os operadores, senão no interesse obscuro próprio do INCM, para além de violar direitos fundamentais como a igualdade e não discriminação, o direito à informação, direito à educação, direito ao desenvolvimento, direito à liberdade de expressão e de imprensa.

 

No mesmo sentido, os termos tanto a Resolução n.º 1/INCM/2024, de 19 de Fevereiro, como o acto da sua suspensão violam a imparcialidade, a ética e o princípio da justiça que devem nortear e caracterizar a actuação da Administração Pública.

 

Portanto, no caso em apreço, urge a conformação do INCM com os princípios da actuação da Administração e a responsabilização do Presidente do Conselho de Administração do INCM pelas violações supra, abuso de poder e dos direitos e interesses legalmente protegidos dos consumidores dos serviços de telefonia móvel, especialmente os dados móveis.

 

Por: João Nhampossa

 

Human Rights Lawyer

 

Advogado e Defensor dos Direitos Humanos

Pode ser que a espada anunciada já esteja a operar, é verdade. Estamos a ser conduzidos por demónios nos nossos caminhos tornados íngremes e ninguém  percebe os sinais. No princípio era o bairro Chalambe o ponto principal da esbórnia dos desgraçados, aqueles que não terão onde ir, nem a quem chorar. Aqui paira vivamente, de dia e de noite e nas madrugadas, o cheiro catalizador  da cannabis e o despudor. Ninguém se assusta com isso, nem com os homens rebentados pelo álcool.

 

Já o dissemos várias vezes mas não nos cansamos de repetir. Hoje, Chalambe não é mais o único lugar  da gravitação das grutas, há outros pontos nos bairros onde se bebe aguardente de cana-de-açúcucar  ou jambalau e ainda a sura, com mulheres jovens  destacando-se na linha da frente, sem preconceitos. Bebem e fumam tudo, desde o cigarro normal até à “cosa nostra”, e já ninguém vê problema nesse gesto que vai se tornando hábito. Um vício mortal.

 

Não precisa que seja noite, as raparigas e também mulheres maduras, podem ser encontradas nesses esconderijos imundos a consumir tais coisas sem olharem para trás. Outras ainda, fogem temporariamente das suas bancas no mercado e vão beber um trago como forma de afugentarem a dor do tédio criado por um negócio que não anda. Já se descomplexaram, e no seu desespero jamais vão se importar com o que a sociedade fala sobre ela. Aliás, a sociedade tem outras preocupações: o dinheiro que não existe e, consequentemente, o pão que não chega à mesa.

 

Não precisamos mecionar o nome dos bairros onde em cada esquina há uma toca onde se vende thonthonto (aguardente de cana ou jambalau) e sura, existem em todo o lado, e em algumas delas tem lá mulheres bebendo e fumando, e as conversas que se ouvem não têm futuro. Nem passado. Muitas delas mostram-se com sinais de desitração, facilmente notável por via do rosto. Tumefacto.

 

Mas de onde é que vem este fenómeno novo, de mulheres jovens  e maduras na cidade de Inhambane bebendo cachaça e essas porcarias industrializadas que levam nomes inconsebíveis nos rótulos, como por exemplo “Dinamite”? Se calhar a sociedade  está atrasada numa pergunta que não vai fazer sentido, pois se estas jovens estão muito perto do abismo, então todos nós estamos lá. No fundo.

 

Ninguém as repreende, nunca foram. Jamais tiveram alguém para o fazer, ou seja, os pais quando descobrirem a fossa em que suas filhas se meteram, poderá ser tarde demais para qualquer reparação. O tempo que as move funciona como o relógio da morte, cujas horas correm com tontura em direcção à fornalha do diabo, onde já estão a ser queimadas na ilusão do prazer. Mas a cachaça e o fumo de todos os tipos que consomem e libertam no vazio, é apenas para desfarçar a dor. Elas estão no inferno e não conseguem fugir dalí. E se elas não conseguem fugir,  nós também estaremos com elas.

quinta-feira, 06 junho 2024 11:33

Se vou de Chapa? Não, vou com Chapo!

Quando o então presidente americano Barack Obama foi agraciado com o Prémio Nobel da Paz (2009), ainda no primeiro ano do seu também primeiro mandato, houve quem se interrogou sobre a justeza da atribuição. No debate da altura, e em socorro dos que o atribuíram o prémio, alguém defendeu que a atribuição foi uma forma de comprometer Obama com a paz nos anos que se seguiam, sobretudo, e determinante, pelo facto de ele suceder o presidente George W. Bush com o seu legado letal. 

 

Para os que assim entendiam a Academia de Oslo aproveitou a juventude e a áurea de esperança que Obama exalava, na américa e no mundo, para atingir fins como a paz mundial depois dos pós acontecimentos de 11 de Setembro de 2001, particularmente com as guerras do Iraque e do Afeganistão. 

 

Lembrei-me disto, e vejo semelhança com o que poderá acontecer com Daniel Francisco Chapo, candidato presidencial da Frelimo, no próximo pleito eleitoral. No fundo, e tal como o entendimento para a atribuição do Prémio Nobel da Paz a Obama, sem que até a altura ele justificasse merecê-lo, nas eleições de 9 de Outubro os eleitores moçambicanos poderão fazer o mesmo com Chapo o que a Academia de Oslo fez com Obama.

 

Esta manhã dei-me ainda conta desta possibilidade, escutando conversa alheia entre dois vizinhos da mesa do café matinal. A dada altura, um dos interlocutores, respondendo ao outro sobre se ia a Matola de Chapa (denominação de transporte público semi-colectivo de passageiros), disse: “Se vou de Chapa? Não, vou com Chapo!”. Depois de uma ténue reflexão, o outro retorquiu concluindo: “Se vais com Chapo, então vais de Metro!”.

quinta-feira, 30 maio 2024 09:41

Tempo dos furtivos

Duas horas da madrugada não é tempo dos andantes, é nessa altura que o silêncio e o medo atingem o pico. Os fantasmas deambulantes realizam as últimas incursões do tormento nesse lapso, e se tiverem falhado nos seus planos, no regresso para as tumbas pontapearão os fracos que vão sentir a dor na própria carne. É isso que acontece todos os dias sem qualquer sinal de que teremos uma nova madrugada. Até porque os nossos passos têm ignorado sistematicamente a sinaleta que nos avisa: cuidado, vem aí a descer a espada! E nós já demos o último passo!

 

Saí na última sexta-feira à noite à procura de aragem espiritual, sem destino predefinido. Queria um pouco de adrenalina para espantar o tédio em que se tem transformado o meu dia-a-dia ultimamente, então um copo podia ajudar, mesmo assim tinha que ser num lugar de silêncio, onde os que estão lá não entram em euforia, bebem e conversam de forma quase inaudível, para gáudio do coração.

 

Não foi difícil encontrar essa toca, aliás lembrei-me que em Tsivanene, nome dado a um lago permanente na zona do aeroporto, existe uma barraca que entra em consonância com o que eu pretendia naquela noite sem luar: beber um copo em silêncio no seio de pessoas com as quais não tenho nada a ver, nem elas comigo. E lá fui eu, fumando no escuro sem temor algum, aqui todos me conhecem, o diabo também.

 

Cheguei por volta das vinte e duas e apenas duas mesas estavam ocupadas. Numa, eram quatro mulheres que bebiam cerveja sem pressa, e noutra mesa, dois jovens faziam o mesmo e pareciam desinteressados com o que se passa lá fora onde as estrelas reflectem-se nas águas de Tsivanene, sobrevoadas pelos pirilampos que não se cansam de espalhar a sua luz intermitente para que a vida faça sentido. A vida é constituída pela luz e pelo escuro.

 

Escolhi uma mesa num lugar estratégico, queria ter sob meu controle um cenário que me permitisse ver as pessoas sentadas e outras que vão entrar, e ao mesmo tempo poder contemplar a noite por via das luzes do ambiente lá fora. Sentei-me e não saudei a ninguém, para além do sinal que dei à empregada do balcão que veio de pronto. Sou um cow boy sem coldre, aliás, o meu coldre é a imaginação.

 

- Boa noite, pai, vai alguma coisa?

 

- Boa noite, obrigado, queria beber cerveja, mas está a fazer frio.

 

- É verdade, está muito frio, hoje! Talvez um whisky!

 

Chegaram mais dois grupos quase furtivamente. Isto aqui parece uma gruta onde vamos nos esconder em busca de liberdade, longe das feras. Não  há música, ainda bem! E eu não posso fumar aqui dentro, não que seja proibido, mas porque nestes cachos de jovens ninguém está a fumar, tenho que respeitar essa posição. Sou o único velho, porém não caduco, e o que fortalece a minha paz neste espaço é que todos me conhecem.

 

Já estou no quinto duplo e quero voltar para casa. Pago a conta e saio sem despedir, da mesma forma que entrei sem dizer nada a ninguém. Mas foram eles, os jovens, que quase em uníssono dirigiram-se-me em música, em coro como nos palcos religiosos.

 

- Já vai, cota! Cuide-se!

 

São duas horas da magrugada e eu não tenho medo, medo de quê! Os fantasmas e todos os espíritos malignos que se lixem, eu sou um dos grãos desta areia dos meus antepepassados. Quem sois vós para se interporem no meu caminho!

 

Acendo o cigarro da catarse e embrenho-me no escuro, outra vez, e ainda consigo ouvir a música dos grilos e dos sapos que chuachualham em côro. Nos quintais os cães ladram ao se aperceberem da minha passagem, mas eu sou um simples andarilho quase bêbado, feliz por ter estado num lugar onde a música que ali se toca, é o silêncio e a paz.

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