Director: Marcelo Mosse

Maputo -

Actualizado de Segunda a Sexta

BCI

Carta de Opinião

quarta-feira, 24 junho 2020 07:06

Um outro "ponto de vista"

Quem é condutor em Maputo sabe dos reais problemas de estacionamento que aqui enfrentamos. Creio eu que os cidadãos compreendem a boa vontade e empenho do Conselho Municipal em estabelecer uma ordem, especificamente no que diz respeito à organização dos automóveis na via pública. Ora vejamos, muitos dos lugares que seriam para o estacionamento comum, são ocupados por empresas, ou seja, as empresas que tenham as suas instalações em uma determinada zona, normalmente ocupam o lugar que seria utilizado pelos cidadãos comuns na sua mobilidade normal do dia-a-dia. Assim o espaço fica reduzido e as pessoas acabam colocando os carros em locais impróprios, inseguros e que colocam em risco a normal circulação do trânsito, pois muitas vezes carros obstruem a visibilidade por terem sido estacionados a menos de 5 metros de distância dos cruzamentos e isso cria um verdadeiro caos. Na minha opinião, o Conselho Municipal, podia aproveitar espaços abandonados, que até nem são poucos e fazer a construção de parques de estacionamento. Porque dar multas a alguns automobilistas de manhã e de noite observarmos carros estacionados nos mesmos lugares e isentos de multas é acima de tudo uma grande injustiça. E vou mais longe na minha observação, muitos desses jovens que fingem controlar os nossos carros em troca de 5 ou 10 mt e que quando não damos o tal “oriento” revoltam-se, poderiam ser empregues e serem guardas dos possíveis parques de estacionamento, pois não fazem nada além de atrapalhar os condutores e até fomentar roubos. Eu creio que o Conselho Municipal está a altura de criar esses planos e mecanismos que minimizem o problema da nossa cidade.

Minhas lágrimas secaram de tanto chorar. Minhas pernas estão nas mãos de tanto andar e correr. Meu corpo de menino transformou-se num quadro de pinturas, devido às feridas e cicatrizes que contém. A nossa memória está entupida de imagens negras de sangue e morte.

 

Cabo Delgado!

 

Nossas casas, donde fugimos, tornaram-se ruínas que acolhem fantasmas dos nossos “deuses”. Herança incendiada. Riqueza saqueada. A guerra trouxe a fome, doenças, desgraça e morte. A guerra arrancou-nos a esperança, a felicidade, o amor e a vontade de sonhar a beleza do amanhã!

 

Quem nos acude?

 

Quando a escuridão aparece sobre os olhos de tanta fome e dor de não poder receber o amor e carinho a que nos havíamos habituado. Vivemos diante de incertezas e medo de voltar a regar a terra com nossas lágrimas inocentes. A guerra matou a nossa familiaridade e hoje vivemos com ela instalada na memória.

 

Quem nos devolve a paz?

 

A paz é um bem supremo que todos nós merecemos ter. A paz é pressuposto necessário para que nossa vida ganhe ânimo. A paz é um delicioso que ergue o futuro de qualquer criança. Não queremos ser crianças-soldados ou futuros soldados do mal, como estes que hoje trouxeram luto, dor e destruição nas nossas aldeias, localidades e vilas.

 

Esta guerra tirou-nos tudo que merecíamos e hoje vivemos em tendas e casotas, onde para ter uma refeição digna é quase impossível. Onde a comida é partilhada mesmo “quando a fome é tanta que as lombrigas dançam tango”.

 

Quem nos salva?

 

Desta guerra maldita que nos tirou tudo e deitou fora nosso sorriso e deixou secar a nossa inocência, porque dia pôs dia, nossas irmãs são sequestradas para alimentar a insanidade sexual dos terroristas.

 

Cabo Delgado! Até quando teremos de continuar a chorar?

 

Omardine Omar

terça-feira, 23 junho 2020 07:21

Olá Mondlane!

Em um dos dias do final de semana vi, à hora do telejornal, no canal STV,  passe a publicidade, um vídeo de uma intervenção (em Londres)  de Eduardo  Mondlane, o 1º Presidente da FRELIMO, dado como o arquitecto da unidade nacional.  Na mesma notícia também passou excertos de  uma entrevista de Mondlane. No mesmo dia e no programa  “Pontos de Vistas”, do mesmo canal, um dos painelitas (Silvério Ronguane, académico e deputado da AR) falou de Mondlane para além do que se está habituado. Na sexta ou quinta passada, ainda no mesmo canal, o filósofo Severino Ngoenha, debruçara sobre um outro Mondlane. Deste académico, caiu no meu whtasapp, uma sua  entrevista, creio que a parte escrita que passara na TV,   na qual ele confessa o  seu fascínio por um outro (escondido) Mondlane e que em breve irá apresentá-lo (em livro) aos moçambicanos. Dias antes , vira no Programa “Quinta à noite”, da televisão pública, a TVM, um outro académico , cujo nome não pude fixar,  a referir que urge saber mais de Mondlane, em particular das suas lições e reflexões enquanto professor universitário nos Estados Unidos da América. Estes são alguns exemplos e que constituem uma lufada de ar fresco sobre  as ideias de Eduardo Mondlane.  

 

No meu último texto (Luther King falou, Mondlane ainda)  voltara a reclamar da presença (da voz) de Mondlane em público, sobretudo, e não só,  nos momentos de exaltação do seu papel   na construção do Esatdo moçambicano. No final de semana, embora de raspão/timidamente, finalmente Mondlane apareceu. Foi algo, e por empréstimo da linguagem do futebol, como lança-lo para o jogo no período de compensação e assim, com o seu talento, mudar o rumo da partida no tempo regulamentar. Neste, e um pouco por toda a imprensa e depoimentos, o foco, para além do habitual sobre os ideias de unidade de Mondlane, a velha necessidade da sua  divulgação. No dito período de compensação, fora o perfume da fala de Mondlane, registar, para o caso do presente texto,  a mudança do título ( e do conteúdo) que  passou de “Centenário de Mondlane - Um aniversário sem o aniversariante” para o “Olá Mondlane”. O “Olá” como a tradução da sensação do momento em que alguém, estando num  elevador, que iniciara a subida e com a porta a fechar,  ouve/vê Mondlane  a passar, às pressas,  pelo corredor. Um  instante, curto e rápido, mas o suficiente para um  “Olá Mondlane!”.

 

Espero que em próximas ocasiões, cada moçambicano depare com  Eduardo Mondlane dentro do elevador e a caminho do seu encontro no futuro, pois,  e tal como afirma o filósofo Severino Ngoenha,  na entrevista retro mencionada, “Mondlane não esteve na primeira República, Mondlane não esteve em 1975 quando nos proclamamos Estado Socialista, mas Mondlane não esteve em 1992 quando assinamos os acordos de paz e nos encaminhamos para uma República Pluralista. Na senda daquilo que chamei a Terceira via, Mondlane não está atrás de nós, nos 50 anos da sua morte e no Centenário do seu nascimento, mas me parece alguém que está em frente de nós a nossa espera para que quando nós estivermos prontos como país, como povo e como nação vamos iniciar a intimar um diálogo necessário com ele, com seu pensamento e suas ideias”. Esse diálogo/futuro urge e, quiçá,  a recente aparição pública de Mondlane, no seu centenário  natalício, fique registado como o ponto de (re)partida. 

 

PS1: PS2: O 25 de Junho, o dia da independência, está à porta. É normal nessa data as televisões e as rádios passarem a leitura da declaração de independência feita por Samora Machel, o 1º Presidente de Moçambique. Se não for nessa data, o da Independência, provavelmente em Setembro, o mês do início da luta armada,  seria interessante que o áudio ou o vídeo, caso exista,  da declaração do início da luta, que conduziu Moçambique à Independência, também fosse passada.

 

PS2: Na esteira da necessidade de ouvir Mondlane e em  conversa com um amigo, a propósito da comparação que Severino Ngoenha, na dita entrevista,  fizera de Mondlane com o Amílcar Cabral, o pai das independências de Cabo Verde e Guiné-Bissau, dando conta de que passa na cabeça dos moçambicanos a noção de que Amílcar Cabral tenha sido um grande  intelectual e que Mondlane não fora. Para Ngoenha tal noção é impelida pelo facto de  Cabo Verde e Guiné-Bissau realizaram, há mais de 30 anos, congressos a volta de Amílcar Cabral e que Moçambique, nesses anos, apenas  fez o contrário com Mondlane,    escondendo um   grande intelectual. O meu amigo corroborou e enfatizou  que até já ouvira discursos de Amílcar Cabral, incluindo os da passagem de ano, e de que de Mondlane nunca ouvira. Na sua comparação, o amigo ainda disse que se sentiu diminuto quando,  numa das suas visitas a Cabo Verde,  visitara a Sala-Museu sobre Amílcar Cabral que é um autêntico arquivo-vivo sobre a vida e obra de Amílcar Cabral.  No final da conversa ficamos com a seguinte interrogação-proposta: E porque não um Sala-Museu sobre Eduardo Mondlane? A Universidade Eduardo Mondlane até que podia tomar a vanguarda nesse empreendimento. 

 

quinta-feira, 18 junho 2020 09:35

General Nhongo em Maputo*

AlexandreChauqueNova

A chuva intermitente que caía era afinal o prenúncio. Também houve graniso do qual ninguém se apercebeu, a não ser o próprio Mariano Nhongo, hospedado na suíte presidencial  do Hotel Polana,  a partir de onde ele observa a exuberância do Índico, sem que o luxo, mesmo assim, lhe retire o foco da sua luta. Chegou na noite de terça-feira, transportado num hélio das Forças Armadas Zimbabweanas, que aterrou na base aérea instalada do outro lado do Aeroporto de Mavalane. Foi tudo feito num secretismo absoluto que até a segurança destacada para o receber, não sabia de quem se tratava.

 

Chovia uma chuva leve, e o silêncio na pista e em todo o perímetro das instalações, era por demais sepulcural que entre os anfitriões que incluiam oficiais de alta patente moçambicana, perguntavam-se entre eles afinal quem é esse fulano. Nhongo saíu do pássaro metálico vestindo uma gabardina preta e um gorro que lhe cobria completamente a cabeça e uma boa parte do rosto, tornando-o irreconhecível. Um dos capangas que o aguardavam quis protegê-lo com o guarda-chuvas, mas o general recusou. Caminhou resoluto para o Range Rover cinzento luzidio que o esperava e sentou-se no banco da trás. O motorista tremeu quando viu um homem encapuzado a entrar apressadamente para a vitura. Parecia um algoz.

 

Eu já estava em Maputo há uma semana, discretamente, sem o conhecimento do editor, alojado no quarto contíguo ao que acolheria um homem cujas acções, façanhas para outros,  podem ter já superado a sua condição de pessoa vulgar. Nunca o vi pessoalmente, mas ele é que me escolhe para a materialização da entrevista, e não poderia questionar sobre esta preferência. Lembrei-me de um dia que Deus disse a Moisés, vai ao Egipto libertar os filhos de Isarael! E Moisés perguntou, porquê que tenho que ser eu? E Deus trovejou como o Leão dos Céus, porquê que não tens que ser tu?

 

Estou deitado com o televisor desligado num quarto sumptuoso que nunca antes imaginara. Mas também já superei há muito os materiais da vida. Desactivei os dados do meu celular para que o silêncio tome livremente conta do meu espaço. Aliás, do espaço onde me colocaram. Quero ouvir os movimentos da chegada do General de Gorongosa, já que ele me avisara, através do telefone ligado directamente ao satélite, que a entrevista aconteceria ainda naquela noite.

 

Alguém bateu à porta dos meus aposentos, sem que antes tivesse havido qualquer sinal indicando a chegada de uma figura temida. Era estranho porque devia receber antecipadamente uma informação da recepção. Mas, nada! Perguntei quem era, e do outro lado respondeu-me o mutismo. Saltei da cama apressadamente, já estava vestido, calçado  e tudo, como se estivesse no teatro das operações, sob comando de Nhongo. Peguei no gravador e no bloco de notas e disse, Deus, seja feita a Tua vontade.

 

Abri a porta e dei-me com dois homens dessimuladamente armados, do tipo furtivos. Balancei de medo na espinha, mas logo recompus-me. Olharam para mim de cima a baixo sem falarem, e logo a seguir indicaram-me a entrada ao lado onde supus estar o general, o próprio Nhongo. Entrei de mansinho e vi um personagem sentado tranquilamente na plotrona, de pernas cruzadas e as duas mãos por sobre o joelho direito. À mesinha de centro uma garrafa indisfarçada, dois copos que foram abastecidos na minha presença, ao mesmo tempo que o meu anfitrião indicava-me o lugar que me colocaria frente a frente com ele.

 

A suite, sob luz ténue, ficou impregnada com o aroma agradável de algo que reconheci ser aguardente de massala. Mariano Nhongo já não se cobria com o sinistro gorro, porém continuava com a gabardina. Bebeu num trago o conteúdo do copo sem cerimónias, e o que me disse logo a seguir foi de tal maneira inesperado que o seu sentido  ganhou a dimensão da espada. Falava como se tudo estivesse sintetizado naquelas palavras. Ele disse assim, enquanto a preocupação forem os ganhos individuais ou de grupos, então jamais vai amanhecer em Moçambique.

 

E eu não sei se isso não é hipocrisia!

 

* Texo imaginário

quarta-feira, 17 junho 2020 09:14

Que tal repatriar a nossa independência

Senhor Presidente da República, Excelência,

 

No dia 25 de Junho vamos celebrar 45 anos de Moçambique independente. Esse histórico e epopeico dia tem um significado incomensurável para todos os moçambicanos, do Rovuma ao Maputo, do Zumbo ao Índico. Excelência, esse dia nos recorda o histórico discurso do camarada e saudoso Presidente Samora Machel no estádio da Machava, não só, o hastear das nossas aspirações coletivas como nação simbolicamente representado na troca de bandeiras.

 

Neste ano atípico, Senhor Presidente, não iremos ao estádio da Machava, confluir-se no calor do povo, a nossa razão de luta. Neste dia 25, fisicamente ficaremos em casa, no aconchego familiar, mas os nossos corações estarão vibrando como em 75 na Machava, acredite.

 

Senhor Presidente, nós o povo estaremos a ouvir o seu discurso e a vê-lo (possivelmente), das nossas casas, junto das nossas famílias por quem pelejamos na busca do pão de cada dia nas diversas frentes, no dumba-nengue ou no dumba-my-love, no estrela ou no paquiteketi, por esse Moçambique a fora.

 

Senhor Presidente, nós vamos vibrar consigo tal e qual em 75, embora das nossas casas. Mas, Excelência, alguns de nós ainda não desembarcamos na Mavalane, a porta de entrada dos que pelejam na Luz como Eusébio, em Sydney como a Lurdes, em São Paulo como o Silva (o Guilherme, entende?!). Estamos ainda aqui, espalhados pelas frentes da diáspora, de coração apertado, ávidos de celebrar junto dos nossos esses 45 anos da independência que também é nossa.

 

Senhor Presidente, até tentamos com nosso taku (como das outras vezes), mas as circunstâncias atípicas deste ano não jogaram a nosso favor. Aqui da Luz, no dia 5, fomos burlados por uns TAPapados que não nos atendem mais o cell, ficaram com a nossa mola e mais nada, sem direito a um ESSE-EME-ESSE de desculpa pelo menos, ficaram ziiii, tipo não se passa nada, a troco da nossa vontade de nos juntarmos às nossas famílias. Os tipos xiquelenizaram isto, acredite.

 

Senhor Presidente, que tal nos repatriar de verdade, sem aquela burla dos 50 paus do nosso já furado bolso pelos Nyangu&Meles ocultos dessa vida, de verdade mesmo, para nesse dia 25 estarmos todos juntos, na independência das nossas famílias, a aplaudir o seu discurso? Que tal, Senhor Presidente?

 

Francelino Wilson

quarta-feira, 17 junho 2020 07:53

Luther King falou, Mondlane ainda

Num texto recente (Eduardo Mondlane. Um arquitecto mudo e de costas para o povo?) reclamei, mais um vez, de que o 1º presidente da FRELIMO, Eduardo Mondlane (1920-1969), precisava de se dirigir ao povo moçambicano. Aliás, uma reclamação de há 6/7 anos quando  fi-la num outro texto (Pai, Mondlane não fala?). Nos dois textos, fora a reclamação, sugiro que nos  festejos por ocasião de celebrações de Mondlane, FRELIMO e da independência de Moçambique, para citar algumas, as instituições de direito, o Governo em particular, deviam brindar o povo moçambicano com  a voz de Eduardo Mondlane, o arquitecto da unidade nacional,   quer através de vídeos e áudios quer por via de escritos de entrevistas, discursos e de outras intervenções. No último texto ainda pedi ao  partido FRELIMO que fizesse  jus a uma das suas marcas: a valorização da tradição e dos bons costumes.

 

O Martin Luther King Jr. (1929-1968) foi um pastor protestante e um dos principais líderes afro-americanos de luta contra a discriminação racial nos Estados Unidos da América (EUA). Com esta grande figura tenho o grato privilégio e o orgulho de partilhar a data de aniversário e tudo que é inerente a um capricorniano. Há dias fiquei ainda mais orgulhoso: vi e ouvi  o meu  homólogo aniversariante a responder a uma pergunta sobre as causas que possam explicar porque razão os  afro-americanos enfrentam tanta dificuldade para poderem progredir nos EUA.  Na verdade a pergunta foi dirigida a Fareed Rafiq Zakaria, escritor e jornalista norte-americano, no seu programa de TV  “Fareed Zakaria GPS”,  a propósito dos recentes ( e em curso)  acontecimentos de foro racial nos EUA. Para responder Zakaria recorreu a um vídeo de uma entrevista dada por Luther King em 1967. No final do vídeo Zakaria disse que fazia de suas as  palavras de Luther King. 

 

Voltando a Mondlane: a data (20 de Junho) do seu  centésimo aniversário está  próxima e será celebrada num contexto em que a sua grande obra – a unidade nacional – vive tempos difíceis e  carecendo de uma intervenção de vulto. Para o efeito nada melhor que a do próprio arquitecto. Aliás um procedimento  que devia ser normal para trabalhos regulares de manutenção.  Mas pelo o que tenho acompanhado na imprensa, até agora o arquitecto da unidade nacional  ainda não foi chamado. Os trabalhos de manutenção da sua grandiosa obra está, e como sempre, à cargo de  intermediários. Contudo, ainda não desisti. Irei aguardar até ao dia 20 de Junho. Quem sabe se até lá alguém de direito  faça o mesmo que Fareed Zakaria.