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Carta de Opinião

sexta-feira, 15 março 2024 11:57

Hora de matar

Um país assim não tem esperança, não pode ter. O consumo de bebidas alcoólicas pela juventude em Moçambique atingiu o cume, bebe-se a descarada em todo o lado e a toda a hora, uma porcaria de bebida que está a levar, diante do olhar impávido do governo, milhares de jovens à loucura. Em muitos casos essas bebidas industrializadas que andam por aí, com fortes suspeitas sobre a sua qualidade, estão a matar, e matam pessoas de tenra idade que perdem a vida sem terem vivido.

 

Não sei como é que se explica que um governo inteiro como o nosso, permita a venda e consumo de “veneno” para destruir a “seiva da nação”. O que anda por aí em garrafinhas com nomes de rótulo como “Dinamite”,  “Boss”, “Royal”, “Soldado”, “Tipo tinto”, é uma verdadeira promotora de chacina, mata aos poucos, o vício adquire-se imediatamente.

 

As mixórdias que enchem os armazéns e bancas e barraracas, tornando-se  verdadeiras dinamites, são piores que a cannabis sativa, combatida ferozmente pelas autoridades policiais. A cannabis pode funcionar como medicamento, dela vai-se extrair o óleo de cânhamo, usado em alguns casos para combater o câncro, mas essas porcarias a que nos referimos, foram concebidas exclusivamente para matar.

 

A cannabis, no lugar de ser tratada como assunto criminal, ela é de forum social. Há camponeses que têm o hábito secular de “dar um shot” para ir trabalhar a terra, então não são criminosos. O assunto cannabis precisa urgentemente de uma outra discussão, talvez mesmo a nível do Parlamento. Mas quanto a essas “garrafinhas” que estão a massacrar jovens que vão morrer ainda imberbes, a posição do governo tem que ser radical para a salvaguarda da vida.

 

Entristeceu-se em tempos, ouvir uma governante de gabarito dizer que não se podia proibir a fabricação e venda dessa porcaria porque “eles pagam imposto ao Estado”. Então, em outras palavras, isso significa passar um alavará oficial para matar a nossa juventude, que efectivamente está a morrer aos pedaços perante o olhar impotente dos pais e da sociedade, e no final das contas do governo, a quem cabe a responsabilidade de nos proteger.

 

Mas os fabricantes e os agentes do Estado que promovem esta tragédia, podem estar a aproveitar-se das enormes fissuras que o nosso país tem. A juventude está desnorteada. Maior parte dela não trabalha, não tem ocupação. E nessas condições, torna-se vulnerável a tudo. Até as donzelas bebem isso e perdem completamente o controle de si, tornando-se, consequentemente, alvo dos oportunistas, caminhando também para a zona da morte.

 

É isso: amanhã podemos não ter homens suficientes para fecundar, pois, neste estado de coisas, esses “miúdos” nem força têm para subir uma mulher.

"E cada uma das Forças de Reacção Rápida que estamos a formar vai receber cinco milhões de equipamentos que vão permitir equipar tudo, menos o material letal”

Brigadeiro-general Nuno Lemos Pires, 20/05/2022

“Caso para perguntar ao Brigadeiro-General Nuno Lemos Pires, que utilidade tem o treino e as roupas militares, se há meios de defesa? Caro Brigadeiro-general, se não estão disponíveis a ajudar, por favor retirem-se de Moçambique. Vamos encontrar alternativas viáveis ao estágio actual da guerra. Saiam de Moçambique. Ao Governo de Moçambique, que haja clareza sobre o que queremos, Moçambique quer Paz, Segurança e Tranquilidade, o resto, o povo fará. Digam basta a esses espiões baratos dos recursos minerais e do gás. Esta reflexão traduz o pensamento do comum cidadão e não vincula qualquer instituição, seja pública ou privada”.

AB

“Estou aqui numa campanha de aprendizagem, uma vez que Moçambique e os seus parceiros em toda a SADC têm tido muito sucesso no combate à insurgência no norte do País. São resultados impressionantes. Não vou entrar muito em detalhes sobre o que o Presidente pediu, mas garantimos neste momento a ajuda em termos de uniformes e material não letal”.

No entanto, o general acrescentou que o fornecimento de equipamento às Forças de Segurança e Defesa (FDS) de Moçambique dependerá das negociações que serão feitas logo após o pedido formal que o Governo terá de apresentar.

General norte-americano Michael Langley, líder da AFRICOM

O recrudescimento dos ataques terroristas, na Província nortenha de Cabo-Delgado, nos Distritos de Chiúre e Macomia, depois de alguns meses de relativa acalmia, mostra que algo não está certo no combate ao terrorismo em Cabo Delgado ou mais generalizando, em Moçambique. Embora não seja especialista em assuntos militares, a forma como os terroristas retomaram os ataques e o efeito que estes ataques provocaram é deveras preocupante.

Os dados da OIM, Organização Internacional de Migração, indicam que, entre os dias 8 de Fevereiro a 3 de Março, registaram-se 99.313 deslocados por temerem ataques terroristas. Deste número, segundo a organização, citada pela Lusa de 05 de Março de 2024, 45.957 são crianças, representando 62% dos deslocados. A imprensa moçambicana, sobretudo a Televisão, mostrando as imagens dos deslocados em desespero, classificou o fenómeno como êxodo populacional, não era sem razão!

Se recuarmos no tempo, no início dos ataques terroristas a Mocímboa da Praia, em 2017 e se olharmos para a forma como as autoridades têm lidado com o assunto, podemos concluir, certo ou errado, que não há clareza sobre a solução para o terrorismo em Moçambique. É que foram mais de três anos de ataques terroristas em Cabo Delgado sem a resposta adequada por parte das autoridades governamentais e, depois de assumir-se, diga-se, com a seriedade necessária, conseguiu-se êxitos consideráveis. Entretanto, do nada, os ataques retomam com uma intensidade anormal. A pergunta que não quer calar é: terá havido algum relaxamento face às vitórias registadas ou os terroristas regressaram mais fortes que as nossas Forças de Defesa e Segurança?

Aliado a isto, os parceiros de cooperação na área de Defesa e Segurança de Moçambique, com destaque para a EU – União Europeia, com a aprovação de Moçambique, gastam rios de dinheiro nos treinos militares e equipamento não letal, mas os soldados moçambicanos não têm meios de guerra para usar depois de formação. Ora, que cooperação é esta? Porque o Governo de Moçambique permite este tipo de atitude? Hoje, mais do que roupas militares, Moçambique precisa de armamento para a sua defesa. Se a UE não está em condições de fornecer o equipamento letal, que deixe de treinar os nossos jovens. Procuremos cooperação militar com outros blocos económicos mais sensíveis aos problemas de Moçambique. Digam basta!

A presença das altas patentes da EU em Moçambique pode ser interpretada como do interesse Europeu e não de Moçambique. Os gastos que realizam, fala-se de mais de 90 milhões de Euros, não têm resultados práticos para Moçambique. Pior, os nossos jovens morrem em Cabo-Delgado, sem poder se defender correctamente, porque não possuem meios à altura, para fazerem face à capacidade bélica do inimigo. A União Europeia tem consciência disso, mas prefere olhar para o lado. Veja o que diz o académico Enio Chingotuane a propósito, passo a citar.

“O académico Énio Chingotuane entende que as forças militares moçambicanas devem ser treinadas e apoiadas com material bélico para combater o terrorismo. Chama a atenção, no entanto, para o perigo de investimentos necessários no desenvolvimento serem desviados para o sector militar. E tece a seguinte comparação: "Portanto, existe uma cooperação sim, mas é uma cooperação que te deixa na porta, portanto, vou te ajudar a chegar na porta, mas na porta já não te vou dar chave para entrares.”

O académico deu exemplos bem-sucedidos de apoios militares com material bélico letal em várias missões em África e questiona se a cooperação militar tanto da União Europeia como da SADC é completa. Moçambique, explica, apresentou uma lista de material bélico de que precisava. Mas "a SADC disse não, não vos vamos dar isso, nós queremos manipular esses instrumentos dentro da vossa casa", fim da citação.

Há coisas que, em razão das relações diplomáticas, o Governo de Moçambique não pode dizer, mas nós, como sociedade interessada e que sofre com os eventos de Cabo-Delgado, podemos dizer. Se  a União Europeia não quer cooperar para o fim do terrorismo, que saia de Moçambique. Nós temos que ter clareza do que queremos para Cabo-Delgado e para Moçambique como um todo. Basta!

Adelino Buque

quarta-feira, 13 março 2024 06:54

Azagaia: razão & causa

Aprende a encontrar sempre uma razão por qual viver porque a vida vai sempre te propor uma causa por qual morrer. E lembra-te sempre que a vontade de viver é íntima e depende fundamentalmente daquilo que cada pessoa entende como sendo uma razão para querer estar no mundo. Normalmente se predispõe a morrer por algo aquele a quem lhe é retirado ou ameaçado aquilo que constituia a razão por qual decidira viver.
 
A razão por qual viver e a causa por qual morrer têm em comum a possibilidade de serem opcionais. Mas a causa por qual morrer tem a particularidade de não ser natural. Ela resulta essencialmente da ineficiência ou da falência daquilo que devesse alimentar a razão por qual se decidira viver. Não há causa por qual morrer onde não tenha havido uma razão por qual viver.
 
Aquele que se apaixona encontra nesse amor uma razão por qual viver. Aquele que sofre por amor encontra no desejo de ser amado uma causa por qual morrer. A independência que se busca quando se está sob domínio da tirania não é propriamente uma razão por qual viver. É uma causa por qual morrer. É por isso que a causa tende a nos transformar num personagem e o qual jamais ponderássemos ser capazes de o  viver.
 
Celebremos Azagaia. Nosso herói.
 
João Mindo II
Empreendedor & Escritor
Fundador da Coinselheiro
 
sexta-feira, 08 março 2024 14:50

Eleições de 09 de Outubro de 2024!

“A CNE – Comissão Nacional de Eleições, órgão constituído por partidos políticos com assento parlamentar mais Sociedade Civil (pese embora não haja consensos na designação dos elementos da Sociedade Civil), já deliberou sobre matérias relevantes para as eleições Presidenciais, Legislativas e Provinciais. O CIP detectou irregularidades e as denunciou, contudo, os partidos representados, embora possam vir a ficar afectados, não se pronunciam. O partido Frelimo que, aparentemente, é o beneficiário da tramóia também não se distancia, o que, na minha opinião, é grave. A minha reflexão é no sentido de sensibilizar a tudo se fazer para sanar aquilo que divide opiniões, de modo a termos eleições justas. Se deixarmos tudo para o pós-eleições, as coisas não irão correr bem para Moçambique. Os não parlamentares também são chamados a intervir! Os dados do CIP são públicos, por favor, naquilo que se considere útil, façam uso.”

 AB

“A CNE já publicou a colocação das brigadas de recenseamento. E, mais uma vez, haverá mais equipas nas zonas da Frelimo (Frente de Libertação de Moçambique) do que nas da Renamo (Resistência Nacional Moçambicana, maior partido da oposição), dificultando, deste modo, o recenseamento dos eleitores da Renamo, olhemos para as províncias com a densidade populacional semelhante. Nampula e província de Maputo têm uma densidade populacional semelhante, mas, em Nampula, cada brigada deve tentar registar 4.214 pessoas, enquanto na província de Maputo cada brigada tem apenas 2.717 potenciais eleitores”.

In Boletim sobre eleições do CIP citado pela Carta de Moçambique, 07 de Março de 2024.

Está decidido, o recenseamento eleitoral terá início a 15 de Março, próxima quinta-feira, e termina a 28 de Abril, com vista às sétimas eleições gerais de 09 de Outubro de 2024, para a eleição do Presidente da República, Deputados da Assembleia da República e Governadores. Para o efeito, a CNE – Comissão Nacional de Eleições, um órgão constituído por membros designados pelas Bancadas Parlamentares (Frelimo, Renamo, MDM + A Sociedade Civil) deliberou pela constituição de 9.165 postos de recenseamento.

Destes, 8.774 postos serão a nível nacional, 372 para a região de África e 19 para o resto do mundo, sendo que, de acordo com a deliberação da CNE, as províncias que mais postos terão são as seguintes: Zambézia com 1,277, Nampula 1.262 e Tete com 1.137. Para esta ginástica herculeana, a CNE ou STAE deverão mobilizar, aproximadamente, 6.033 brigadas. Trata-se de um autêntico “exército” de mulheres e homens para materializarmos as eleições de 09 de Outubro, lembrando que o recenseamento eleitoral irá decorrer numa altura em que se regista um verdadeiro êxodo da população de Cabo Delgado para as províncias vizinhas de Nampula e Niassa, de entre outras, o que pode confundir os potenciais eleitores!

Dos dados que a CNE produziu, repito, um órgão constituído por elementos indicados pelas Bancadas Parlamentares e pela Sociedade Civil, a Organização da Sociedade Civil, CIP, veio a público denunciar algumas irregularidades que os membros da CNE não conseguiram descortinar e, depois das denúncias, os partidos políticos visados mantêm-se num silêncio sepulcral, sobretudo, quando se fala das zonas de influência política. Este silêncio, na minha opinião, é grave, na medida em que, após a votação e proclamação dos resultados, os partidos afectados é que irão reagir, o que complicará mais a vida normal do País.

Na minha opinião, havendo algo a ser feito, os partidos políticos representativos e, por sinal, afectados pela deliberação da CNE deviam exigir que se fizesse a respectiva correcção. Mais ainda, penso que não é do interesse da Frelimo que a CNE a favoreça, pelo que julgo que a própria Frelimo devia distanciar-se do método usado pela CNE para a determinação do número de brigadas e as metas por província. Mas, mais do que isso, é importante que, no acto de recenseamento, as pessoas sejam agrupadas pelas suas zonas de origem, sobretudo, nos casos das populações que fogem do terrorismo!

Nesta reflexão, pretendo, de forma preventiva, exortar os partidos políticos representados na CNE e as organizações da Sociedade Civil, igualmente representadas, para não deixarem passar a oportunidade de correcção de erros, existindo. Claro, de modo que não seja depois da proclamação dos resultados que se levantam questões que deviam ser resolvidas agora e, desse modo, prevenir-se conflitos futuros. Julgo que nenhum partido deve manter-se indiferente a irregularidades, cujo efeito far-se-á sentir com maior intensidade a breve trecho. Que haja gente, dentro dos partidos políticos, que se ocupa dessas matérias.

Os partidos políticos também devem intervir e entrar em consensos sobre o recenseamento dos deslocados do terrorismo em Cabo Delgado, matéria que, na minha opinião, não pode ser da exclusiva responsabilidade do STAE e da CNE, sob pena de virem a queixar-se extemporaneamente.

Adelino Buque

sexta-feira, 08 março 2024 06:24

Êxodo no Wimbe

Estamos a voar sem escala no carrancudo 737 da LAM há mais de seis horas, numa viagem que devia levar pouco mais de 120 minutos, mesmo assim os comissários de bordo não páram de sorrir. A informação que temos é de que chove torrencialmente em Pemba, com descargas atmosféricas de grande magnitude. Apagaram-se as luzes da pista e de toda a cidade.

 

Mas porquê que não desviam a rota para outro aeroporto aqui  perto? Também chove a cântaros em Nampula, com granizo em todo o lado, e na Zambézia os ventos que fustigam trazem poeiras de mau agoiro. E agora como é que vai ser? É só esperar, isto vai passar, não obstante a autonomia de voo poder estar em causa.

 

Estamos por cima das nuvens numa máquina cujo motor é imperceptível aqui dentro. Há um silêncio de morte no bojo, e deste modo pode ser que estejamos numa câmara de gás à espera de ser acionada pelos verdugos para que o cianeto goteje, e ainda assim trazem-nos taças de vinho em carrinhos leves para irmos bebendo, mas ninguém aceitou aquela bebida da cor de sangue, e eu então lembrei-me da música de Chico Buarque e Milton Nascimento “pai, afasta de mim esse cálice...”.

 

A minha cadeira está por cima da asa, que tremilica, e já atingi o limite do medo. Restam-me,  todavia, as últimas reservas de esperança.

 

“Apertem os cintos por favor, estamos para aterrar no aeroporto de Pemba”! A ansiedade e o medo não desvaneciam, aumentavam. A voz feminina soava a música sinistra, provavelmente o comandante tenha decidido fazer o poiso sobre a própria morte, os pássaros morrem no chão. Ninguém sabe o que vai acontecer, mas seja como for, se for para morrer, já estamos mortos. Morremos todos os dias. Moçambique vive de morte em morte.

 

De qualquer das formas parece termos saído, após aquela voz cantante vinda dos altifalantes roufenhos que mais parecem megafones, da antecâmara do diabo. Pemba estende-se na plenitude aos nossos pés como um paraíso, entretanto essa vista será ilusória, Pemba treme em toda a placa. Senti isso quando saí do avião: todos olham para os passageiros que desembarcam com olhar profundamente  inexpressivo como quem diz, o quê que eles querem aqui?

 

Neste momento em que chegamos, há muitos aviões que partem. De meia em meia hora uma máquina busca os ares, até não haver mais nenhum aeroplano para descolar, a não ser o “nosso” que igualmente vai voltar ao espaço daqui a pouco, com gente entulhada como no “My love” onde somos tratados tipo gado de abate.

 

Quando embarquei em Maputo, o meu plano era hospedar no Wimbe e ir desfrutar da vida no restaurante Dolphin, mas alguém, que está fugindo como os outros em massa,  diz-me que o Dolphin está fechado, o Nazaré não está lá. Fugiu da chuva que penetra pelo tecto sem fissuras e janelas fechadas molhando tudo. O peixe conservado nas arcas ressuscitou e voltou para o mar ensanguentado. O arquipélago das Quirimbas está a tremer, as aves marinhas sucumbiram ao cheiro da pólvora e das baionetas e das facas.

 

Mas eu quero ir ao Wimbe, mesmo assim. Sentir a brisa no Dolphin e ouvir a música da natureza cantada pelas gaiovotas que não estarão nos galhos, fugiram inesperdamente, deixando para trás os mangais transformados em matadouros de homens. Então lá fui em contramão daqueles que deixavam o mítico Paquitequete, o Metuge e toda Pemba, e todo o Cabo Delgado.

 

No Dolphin não está ninguém, a não ser um homem longelíneo vestido de turba negra, que me estende a enorme bandeja de prata contendo uma cabeça humana acabada de ser decepada.

 

Eu ia receber a bandeja pensando tratar-se de cabeça de peixe, de xerewa. Afinal era um pesadelo, numa noite com temperaturas jamais sentidas em Inhambane.

segunda-feira, 04 março 2024 07:54

Prontos: o candidato tem que ser do Centro, mas…

Esta fora a conclusão de um turbulento debate, este domingo, na rota Baixa­Boane. O debate, ocasional e que reunira uma dezena de passageiros junto ao banco traseiro do autocarro, decorrera em torno do perfil ou critérios para o próximo candidato presidencial do partido no poder,

 

Enquanto o debate decorria ia pensando em que perfil ou critérios teriam sido baseados as escolhas anteriores para a chefia do partido e∕ou candidatura presidencial. Neste exercício veio-me à memória, mais uma vez, uma entrevista de Marcelino dos Santos, falecido membro sénior e fundador do partido no poder.

 

Na aludida entrevista, Marcelino dos Santos mencionara de que na escolha de Samora Machel, depois da morte de Eduardo Mondlane, pesara o facto de Samora, sendo o comandante militar e hábil líder, poder responder melhor ao objectivo de intensificação da luta armada como resposta de vitalidade contra o poder colonial.

 

Quando da sucessão de Samora Machel, Marcelino dos Santos afirmara que para a escolha de Joaquim Chissano, então Ministro dos Negócios Estrangeiros, pesara o seu carácter diplomático e capacidade em "engolir sapos", características que seriam vitais para o contexto de mudanças mundial e internamente da época.

 

Na escolha de Armando Guebuza, então Secretário-geral do partido, quando da sucessão de Joaquim Chissano, Marcelino dos Santos dissera que valera a liderança e capacidade deste em poder dinamizar o partido para as mudanças e respostas necessárias aos desafios do país na altura, sobretudo socio­económicos. 

 

Na entrevista, que fora durante o reinado de Guebuza, não se falara sobre o que determinaria na escolha do sucessor de Guebuza. Aliás, o debate da sucessão parece que não consta do lema ”A Vitória Prepara­se. A Vitória Organiza-se", atendendo e comparando com a antecedência com que o partido no poder trata todos os outros assuntos conexas ao processo eleitoral.

 

Contudo, decorrente do avançado por Marcelino dos Santos ­ o de uma escolha que resulte da combinação do contexto (internacional, nacional e partidário) a enfrentar e a particularidade e habilidades requeridas face a tal contexto ­ resta saber até que ponto estes critérios terão sido observados na sucessão de Guebuza para Filipe Nyusi e se serão observados na ora sucessão de Nyusi.    

 

"É melhor que seja do Centro (do país), encerrando assim, de uma vez, o "Agora é a nossa vez!". Este pronunciamento, dito em alta e rochosa voz do casual moderador, arrancara aplausos de todo o autocarro em sinal de total concordância.  Do pronunciamento também a assunpcção de que o candidato será certamente o próximo presidente.

 

Os aplausos interromperam a minha viajem ao passado. Do recolhido nada constava que o critério regional fosse determinante para a escolha. Do vigoroso consenso do autocarro, a ideia de que o critério regional vincará ­ com a escolha de alguém do Centro, completando assim o ciclo regional ­ e de que o precedente fora aberto quando da escolha do actual timoneiro.

 

Sendo assim, e para que o assunto não fique um pendente e uma fonte futura de conflitos: que seja mesmo a última vez do "Agora é a nossa vez!".

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