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Política

As bancadas parlamentares da Renamo e do Movimento Democrático de Moçambique (MDM) defendem que o Acordo de Extradição, celebrado entre os Governos de Moçambique e Ruanda, em Junho de 2022, e viabilizado ontem pela Frelimo, visa simplesmente agradar o regime de Paul Kagame, na medida em que o mesmo não traz quaisquer benefícios para o nosso país. A posição foi manifestada ontem pelos deputados Alberto Ferreira, Muhamad Yassine e Silvério Ronguane, durante o debate em torno da proposta da Resolução que ratifica o referido Acordo.

 

Segundo Alberto Ferreira, deputado da Renamo, o Acordo de Extradição com o Ruanda faz emergir inquietações óbvias “dada a tipologia do regime anti-democrático, autocrático e ditatorial”, por um lado, e pelo suposto envolvimento do Ruanda em conflitos regionais, com destaque para os ataques terroristas protagonizados pelo movimento rebelde M23, no norte da RDC (República Democrática do Congo), cujo patrocínio é atribuído ao Ruanda.

 

“Um país sério não pode ratificar um acordo com finalidade de agradar os amigos. Moçambique não pode ser um Estado vassalo do Ruanda”, defende Ferreira, para quem o Acordo colocará cidadãos ruandeses refugiados no país “a viver num estado hostil e inseguro”. Aliás, o académico sublinha que a retroactividade da lei mostra que “os inimigos de ontem do regime ditatorial poderão ser perseguidos e extraditados”.

 

Silvério Ronguane, deputado do MDM, também alinha no mesmo diapasão. Suspeita que o país se tenha tornado num protectorado do Ruanda, na medida em que o Acordo não traz qualquer vantagem para Moçambique. “Quantos moçambicanos julgados, presos e/ou condenados no Ruanda que levam o Governo a ter interesse nesta matéria, na medida em que um acordo deve servir às partes signatárias”, questiona.

 

“A Ministra da Justiça pode explicar à bancada do MDM qual é o histórico de criminosos entre estes dois países que justificam e fundamentam este acordo? Havendo histórico de prisões, julgamentos e condenações entre Moçambique com países como Brasil, Índia e Tailândia, como é possível ignorá-los e colocar a frente um país sem nenhum histórico conhecido”, acrescenta.

 

Já o deputado Muhamad Yassine, também da Renamo, defende que o Acordo de Extradição com o Ruanda “é uma carta sem validade” e questiona as razões que levam o Governo a não celebrar o mesmo tipo de acordo com o Governo turco que, em 2017, também pediu ao Chefe de Estado ajuda na caça aos seus adversários políticos que, supostamente, tentaram assassiná-lo em Julho de 2016.

 

A “comparação” não agradou o Chefe da bancada parlamentar da Frelimo, Sérgio Pantie, que a considerou “infeliz”. “Estamos a comparar realidades diferentes. Ruanda é um país africano e irmão de Moçambique e há razões fundadas para que Moçambique tenha defendido que, com o Ruanda, vamos assinar”.

 

Segundo Pantie, o Acordo de Extradição com o Ruanda visa simplesmente agradecer aquele país pelo seu apoio na luta contra o terrorismo. “Precisamos de agradecer e ser gratos a um povo irmão, a um povo da nossa região e a um povo de África que tem estado com Moçambique de mãos dadas e de corpo e alma para vencermos esta batalha contra o terrorismo”.

 

Estou tranquila – Helena Kida

 

A Ministra da Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos garante estar de consciência tranquila por, alegadamente, saber que não assinou Acordo para permitir a perseguição de ruandeses em Moçambique e muito menos para a aplicação de penas pesadas no seu país de origem.

 

Segundo Helena Mateus Kida, o Acordo de Extradição celebrado com o Governo de Paul Kagame tem balizas, sendo que o mesmo começou a ser negociado antes de 2020 e que só foi concluído em 2022, depois de se certificar de que o Ruanda havia abolido a pena de morte.

 

“Não se extradita à toa, é preciso nos convencerem de que a conduta que baseia o pedido de extradição é também crime no nosso país. Depois de chegarmos à conclusão de que também é crime no nosso país, vamos ver quais são as penas aplicáveis porque não se faz automaticamente. Por isso, tenho a tranquilidade de dizer que estou consciente, porque não queremos ajuste de contas políticas”, defendeu.

 

Sem explicar as vantagens que o Acordo traz para Moçambique, Kida defendeu que os cidadãos moçambicanos não precisam de ser campeões no mundo do crime e que Moçambique “alberga uma grande comunidade de ruandeses”.

 

“Queremos que venham de qualquer Estado e de qualquer país, mas que sejam honestos e que nos ajudem a construir o país e não sermos eleitos para albergar criminosos de outros Estados”, frisou, sublinhando que Moçambique deseja assinar o mesmo tipo de acordo com vários países do mundo.

 

Refira-se que a proposta de Resolução que ratifica o Acordo de Extradição entre Moçambique e Ruanda foi viabilizada na manhã de ontem com 169 votos favoráveis da bancada da Frelimo, contra 51 da oposição: 47 da Renamo e quatro do MDM. Ruanda, sublinhe-se, é o quarto país a celebrar Acordos de Extradição com Moçambique, depois do Brasil (2009), Zimbabwe (2016), Vietname (2020) e Ilhas Maurícias (2020). (A. Maolela)

A Ministra da Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos, Helena Kida, admitiu, esta quarta-feira, haver execução de ruandeses no território nacional. A governante confirmou estes dados, quando tentava convencer os deputados da Renamo e do MDM sobre a pertinência do Acordo de Extradição, celebrado entre Moçambique e Ruanda e que ontem foi viabilizado pela bancada parlamentar da Frelimo.

 

“Não é segredo para ninguém que houve execuções [de ruandeses] dentro do nosso país e que mancham o nosso país”, afirmou a governante, sem dar detalhes sobre as tais execuções. Para a Ministra da Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos, os referidos actos podem ter resultado da “nossa inércia”, pelo facto de “não termos um instrumento que nos permita pelo menos saber quem são essas pessoas que estão a ser perseguidas”.

 

Por essa razão, Helena Kida entende que o Acordo de Extradição com o Ruanda vai permitir que se saiba quem são as pessoas que voltaram para o Ruanda, assim como monitorar o que estará a acontecer com cada uma delas. Na sua óptica, as execuções ocorridas em Moçambique podem ter resultado de acerto de contas entre criminosos e/ou a mando do Governo daquele país. “Se não encontrarmos mecanismos apropriados, cada um há-de encontrar uma forma de resolver”, defende.

 

Refira-se que esta foi a primeira vez em que o Governo admitiu haver execução de ruandeses em Moçambique. A confirmação chega quase três anos depois do assassinato, em Setembro de 2021, de Revocat Karemangingo, ocorrido no bairro da Liberdade, no Município da Matola, província de Maputo.

 

Revocat Karemangingo, ex-militar, era vice-Presidente da Associação dos Ruandeses Refugiados em Moçambique e lidera a lista dos ruandeses que estavam na mira do regime de Paul Kagame. Ainda em 2021 (Maio), sublinhe-se, um outro cidadão ruandês, de nome Ntamuhanga Cassien, foi raptado na Ilha de Inhaca, na Cidade de Maputo, por desconhecidos. Os dois casos nunca foram esclarecidos pelas autoridades moçambicanas.

 

Os dois casos de 2021 juntam-se ao assassinato, em Outubro de 2012, do ex-director do Banco de Desenvolvimento do Ruanda, Theogene Turatsinze, ocorrido na capital do país, cujo corpo foi encontrado amarrado com cordas, dois dias depois de ter sido dado como desaparecido.

 

Frisar que a comunidade ruandesa refugiada em Moçambique tem denunciado, constantemente, a existência de esquadrões de morte no país, denúncias que subiram de tom após a chegada das tropas ruandesas em 2021, com o objectivo de combater a insurgência, na província nortenha de Cabo Delgado. (A. Maolela)

Simião Ponguane, um dos mais destacados jornalistas da TVM, perdeu a vida esta quarta-feira (20), no Hospital Central de Maputo, vítima de doença prolongada.

 

Segundo uma nota da TVM, nos últimos três anos, Simião Ponguane lutava contra um cancro no fígado, tendo tentado tratamento dentro e fora do país, mas sem sucesso. Ponguane era um dos mais antigos colaboradores da TVM e preparava-se para a reforma. Jornalista irreverente e de discurso “terra a terra”, notabilizou-se com reportagens no terreno e Grandes Entrevistas a diversas personalidades.

 

Para o jornalista Edmundo Chauque, o país perde um professor de ideias. “O timbre carismático e a sua voz prendiam milhões de telespectadores. Ríspido e directo, soube chamar os “bois” pelos nomes. Não tinha subterfúgios. Não tinha rodeios”.

 

O nosso entrevistado lembra ainda a veia jornalística de Simião Ponguane: Ou o entrevistado" boiava" por assim dizer, se não dominasse o assunto ou "apanhava em directo".

 

“São inúmeros os bons exemplos da grandeza de Simião partilhados nas gerações [dos Faduco, Mavanga, Sitoi...] que nos foram transmitindo e aprendemos. Perdemos a voz dos que não têm voz. Em Moçambique e na diáspora. Vai ser difícil encontrar um jornalista da estirpe de Simião. Douto no saber e pronto a ensinar. "Ponguane é um herói de todas as frentes”, disse à “Carta”, Edmundo Chauque.

 

Simião Ponguane morreu, mas as obras não morreram

 

No seu depoimento sobre a vida e obra de Simião Ponguane, a jornalista Joana Macie disse que ele morreu, mas as suas obras ficaram. “O apelo que deixo neste momento é que a nova geração deve recorrer aos trabalhos de Ponguane para aprender como é que se posiciona perante uma fonte”.

 

Em vida, Simião Ponguane desempenhou vários cargos na Televisão de Moçambique: foi chefe da Redacção, Director de Informação, Director do Canal Internacional, Assessor do Conselho de Administração e Correspondente da TVM na África do Sul. Foi também Correspondente da Voz da América. Ainda não há detalhes em relação às cerimónias fúnebres. (Carta)

A bancada parlamentar da Frelimo aprovou, na manhã de hoje, na generalidade, a Proposta de Resolução que ratifica o Acordo de Extradição entre as Repúblicas de Moçambique e do Ruanda, assinado em Junho de 2022, pelos Ministros de Estado para os Assuntos Constitucionais e Legais do Ruanda e da Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos de Moçambique. O documento foi viabilizado com 169 votos favoráveis da bancada maioritária, contra 51 da oposição: 47 da Renamo e quatro do MDM (Movimento Democrático de Moçambique).

 

A Frelimo, na voz da deputada Muanarera Abdala, defende ter votado a favor da ratificação do Acordo pelo facto de os dois países manterem boas ralações de cooperação, que se demonstram no plano militar, onde tropas ruandesas apoiam as Forças de Defesa e Segurança (FDS) Na luta contra o terrorismo na província de Cabo Delgado.

 

Por sua vez, o deputado Muhamad Yassine, da Renamo, afirma que a sua bancada parlamentar reprovou o documento em respeito ao artigo 20 da Constituição da República que, no seu número dois, estabelece que a República de Moçambique “concede asilo aos estrangeiros perseguidos em razão da sua luta pela libertação nacional, pela democracia, pela paz e pela defesa dos direitos humanos”.

 

Para o maior partido da oposição, o Acordo assinado pelo Governo com o regime de Paul Kagame visa simplesmente perseguir e extraditar opositores políticos do presidente ruandês que se encontram refugiados no país. Aliás, argumento idêntico foi usado pelo MDM para justificar a sua posição.

 

Silvério Ronguane afirma que Moçambique deixou de ser um país que protege os perseguidos e se tornou num país opressor. Disse ainda não haver qualquer histórico criminal de moçambicanos naquele país, pelo que o acordo vai beneficiar o Ruanda e não a Moçambique.

 

Lembre-se que o Acordo de Extradição entre Moçambique e Ruanda não colhe consenso no país, devido a presença massiva, em Moçambique, de opositores do presidente ruandês, que há mais de duas décadas vêm sendo perseguidos.

 

Uma das organizações da sociedade civil que se manifestou publicamente contra o acordo é o Centro para Democracia e Desenvolvimento (CDD), que chegou a recomendar, em Março de 2023, a Assembleia da República a não ratificar o documento.

 

“Os cidadãos ruandeses que estão na mira do regime do Presidente Paul Kagame estão a ser perseguidos em razão da sua luta pela democracia, concretamente, a diversidade de opiniões. (…) Trata-se de cidadãos que fugiram do Ruanda devido à perseguição política e vivem em Moçambique com o estatuto de refugiados, uma condição que lhes foi reconhecida pelo Estado moçambicano”, sublinhara a organização. (Carta)

quarta-feira, 20 março 2024 07:36

Eleições 2024: estão a negar credenciar o CIP

Estão a ser negadas credenciais de imprensa ao CIP na Cidade de Maputo, província de Maputo, Gaza, Nampula e Tete, apesar de os pedidos terem sido feitos há duas ou três semanas. Em Cabo Delgado, Niassa, Sofala e Inhambane, os pedidos foram feitos há menos de duas semanas e as credenciais foram distribuídas ontem (segunda-feira, 18 de março).

 

O Centro de Integridade Pública (CIP) é editor de boletim informativo eleitoral, que conta com mais de 400 correspondentes. Para entrar nos centros de recenseamento, assembleias de voto e observar as contagens é necessário apresentar credenciais emitidas pelas comissões eleitorais provinciais ou nacionais.

 

Na cidade de Maputo, dois dias após o início do registo, o STAE devolveu os pedidos de CIP por alegadamente conterem irregularidades, quase duas semanas depois de terem sido apresentados.

 

A acreditação de observadores da CIP em Gaza está a ser bloqueada pelo chefe do secretariado da Comissão Provincial de Eleições (CPE), Francisco Banze, segundo Mouzinho Gama, membro da oposição da CPE. 

 

O CIP solicitou a acreditação em 27 de Fevereiro e até à data os seus observadores não receberam as credenciais. Hermínio Chihingane, membro da CPE nomeado pelo MDM, afirma que os membros da Frelimo na passada sexta-feira (16 de Março) sabotaram a acreditação ao abandonar a sala sem aprovar as credenciais.

 

No distrito de Bilene, Gaza, os observadores do CIP estão a ser monitorados pelo Serviço de Inteligência e Segurança do Estado (SISE) e por membros da ANABIL (Amigos e Nativos do Bilene), que é formada por alguns professores, directores de escolas e directores pedagógicos. (CIP)

Quando o recenseamento eleitoral para as VII Eleições Presidenciais e Legislativas entra no seu sexto dia, o maior partido da oposição vem, mais uma vez, denunciar actos que voltam a manchar o processo eleitoral moçambicano.

 

Segundo a mandatária nacional da Renamo, Glória Salvador, dois membros do partido foram detidos ilegalmente na manhã da última segunda-feira, na povoação de Nampeué, distrito de Eráti, província de Nampula, depois de estes terem identificado o registo fraudulento de um cidadão naquele ponto do país.

 

Trata-se do mandatário distrital da Renamo, em Eráti, e do fiscal do partido em Nampeué, que até ao fecho desta reportagem se encontravam nas celas da Polícia da República de Moçambique (PRM) por denunciarem um cidadão que estava na posse de três cartões de eleitores, todos em seu nome.

 

A mandatária da nacional da Renamo disse ao nosso jornal que o facto ocorreu na presença do supervisor que, no lugar de denunciar a ilicitude, optou por chamar a Polícia para recolher os dois membros da “perdiz”.

 

Para além da detenção dos dois membros da Renamo, Glória Salvador denuncia também o contínuo registo de eleitores por listas nominais, todas provenientes do partido Frelimo, uma táctica usada em 2023 para impedir o recenseamento de eleitores da oposição. Acrescenta que, após o registo desses indivíduos, os brigadistas encerram as inscrições.

 

À “Carta”, Glória Salvador denunciou ainda a falta do pagamento de subsídios dos brigadistas e agentes cívicos, em território nacional, assim como o não pagamento de salários dos vogais e técnicos do STAE (Secretariado Técnico da Administração Eleitoral) indicados pela Renamo.

 

A chuva que continua a cair em algumas províncias, condicionando o trânsito de pessoas e bens; a insegurança na província de Cabo Delgado, causada pelos ataques terroristas; e a falta de combustível para a realização dos trabalhos de monitoria por parte do STAE, são outras questões que, segundo a Renamo, marcam e mancham os primeiros dias do recenseamento eleitoral.

 

Para a Renamo, estas questões beliscam o processo eleitoral e fazem com que o maior partido da oposição volte a questionar se o país irá ou não às eleições este ano. A questão, lembre-se, já havia sido feita pelo Chefe de Bancada Parlamentar da Renamo, Viana Magalhães, que a 22 de Fevereiro último perguntou se o recrudescimento dos ataques terroristas não visava adiar as eleições e perpetuar o reinado de Filipe Nyusi.

 

Fraca afluência aos postos de recenseamento

 

Enquanto o maior partido da oposição denuncia as irregularidades que marcam o processo nesta primeira semana, o Centro de Integridade Pública (CIP) relata uma fraca afluência aos postos de recenseamento, sobretudo na região sul, com destaque para os distritos que não foram abrangidos pelo recenseamento eleitoral para as eleições autárquicas de 2023.

 

“Os nossos correspondentes dos distritos não autárquicos das províncias de Maputo, Gaza e Inhambane reportam um cenário de quase total ausência de eleitores, havendo postos que apenas registam até três eleitores em três horas, o que significa que um eleitor aparece por hora e menos de 20 eleitores por dia”, detalha.

 

Refira-se que o recenseamento eleitoral decorre até ao dia 28 de Abril e os órgãos eleitorais prevêem registar pouco mais de 7.7 milhões de eleitores. As eleições decorrem no dia 09 de Outubro. (Carta)

 

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