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Carta de Opinião

quarta-feira, 30 janeiro 2019 05:28

O comboio dos bitongas não volta mais

Ao Fazal Lacá, um machope nascido em Inharrime, e que Niassa arrebatou até à morte.

 

Não era só dos bitongas, mas também dos machopes. Misturava as duas etnias em carruagens com bancos de madeira, e uma ou duas com estofos de napa para os privilegiados. Mexia com os locais por onde passava, fazendo tremer a terra. Parava em estações e apeadeiros do tipo “farwest”  - para embarque e desembarque - estendidos ao longo de uma extensão de cerca de noventa quilómetros entre a cidade de Inhambane e a vila de Inharrime. Era uma festa. Proporcionada por uma máquina à vapor numa altura em que não se falava, como hoje, da poluição do ambiente. E esse tempo não dá indicações de que vai voltar um dia.

 

Estou apinhado num “chapa”. Sou uma lenha. Que se junta à outras lenhas que vão compor um feixe  pronto para ser destruído a qualquer momento numa curva ou numa ribanceira, ou ainda num embate frontal irresponsável. Porém o que me reconforta apesar desse desconforto é que aqui dentro, onde mesmo assim estamos todos sentados, não há algazarra. O nosso silêncio colectivo dá total liberdade à música que se ouve nas colunas que libertam som equalizado. Boa música, em volume baixo para  o sossego da alma!

 

Lá vamos nós. De Inharrime à cidade de Inhambane. De “chapa”. Apertados. Oiço o som dos pratos da bateria anunciado a entrada em cena de Hugh Masekela que vai cantar o embalsamante “Stimela”. Transformando o pequeno autocarro que nos transporta como sardinhas desdenháveis numa agradável discoteca. E toda essa levitação do espírito faz esquecer o sofrimento do corpo. Ao mesmo tempo que me recordo do tempo em que nesta terra tivemos um “stimela” que fazia parte da nossa história. Mas do registo desse “poema lírico”, ficaram apenas os hangares transformados num mamarracho, e uma locomotiva negligenciada. Lembrando-nos que aquele comboio era um poema dos bitongas. E dos machopes.  

 

Arrancaram os carris. De aço. Como se estivessem  a arrancar-nos o coração. Sem nos dizerem nada. Sem direito à consulta. Vieram buscar as locomotivas e as carruagens e os vagões. Meteram tudo em grandes camiões e foram-se embora. Deixando-nos com a saudade da música que o comboio cantava para dentro de nós: “pouca-terra, pouca-terra, pouca-terra”. Hoje já não há nada disso. Aliás, Eusébio Johane Ntamele já cantava: “khombo la mina mamana, va ranga hi mbilu va lhomula” (que azar é o meu, mãe: a primeira coisa que fizeram foi arrancar-me o coração). E se te arrancam primeiro o coração, o quê que vai restar de ti?

 

Tudo aquilo era um regalo. Por exemplo, quando a máquina apitasse, anunciando a chegada, homens e mulheres e velhos e crianças e paralíticos, desciam como várias ondas do mar que vão ser despejadas na estação. Ou no apeadeiro. Uma parte deles ia receber os familiares ou amigos. Mas a grande  maioria  ia apenas celebrar a chegada do comboio. Que traz no seu bojo passageiros distribuidos entre os bitongas e os machopes. Todos queriam abraçar a máquina com os olhos e a alma.

 

Os vagões vinham cheios de lenha. Troncos para os fogueiros. As carruagens de carga abarrotavam de mandioca fresca, milho, farinha de mandioca, mel, ananás, manga e quejandos. Cumplicidade. Os Caminhos de Ferro de Moçambique por estas bandas não faziam muito dinheiro com o empreendimento. Contudo davam alegria às pessoas. Ofereciam vida. Quase de graça. Também hoje se calhar as máquinas à vapor não façam parte do nosso tempo. Mas a poesia celebra-se eternamente.

segunda-feira, 28 janeiro 2019 16:29

O parecer de Eduardo Namburete

Sobre o pedido de consentimento do TS à AR para a prisão preventiva do deputado Manual Chang

 

 O Tribunal Supremo, pelo punho do Venerando Juiz Conselheiro do Tribunal Supremo, Dr. Rafael Sebastião, endereçou um ofício à Presidente da Assembleia da República solicitando que a Assembleia da República dê “... o consentimento para a imposição da medida de coacção máxima (que ao caso é a prisão preventiva), nos termos do artigo 173 da Constituição da República e do artigo 13 do Estatuto do Deputado, aprovado pela lei nº 31/2014 de 30 de Dezembro”. 

 

O Tribunal Supremo justifica o seu pedido “por haver receio de fuga uma vez que o arguido se encontra fora do país correndo-se o risco de não atingir os fins do processo, além da perturbação da instrução do processo mantendo-se o arguido em liberdade”.

 

De acordo com o ofício do Tribunal Supremo, o até aqui Deputado da Assembleia da República Manuel Chang é acusado de vários crimes, nomeadamente o de Abuso de cargo ou funções, previsto e punido pelo artigo 16 da Lei nº 9/87 de 18 de Setembro; crime de violação da legalidade orçamental, previsto e punido nos termos do artigo 9 da lei nº 7/98, de 15 de Junho, conjugado com o número 5 do artigo 22 da Lei nº 15/97 de 10 de Junho, referente ao Orçamento e à Conta Geral do Estado, artigo 11 da Lei nº 1/2013 de 7 de Janeiro que aprova o Orçamento do Estado para 2013 e artigo 11 da Lei nº 1/2014, de 24 de Janeiro que aprova o Orçamento do Estado para 2014 e artigo 77 al. a) da Lei nº16/2012 de 14 de Agosto; crime de Burla por defraudação, previsto e punido pelos artigos 451 nº 3 e 421 nº 5, ambos do Código Penal vigente; crime de Peculato, previsto e punido nos termos do artigo 313, conugado com o artigo 437, ambos do Código Penal vigente; Corrupção passiva para acto ilícito, previsto e punido nos termos do artigo 7 da Lei nº 6/2004, de 17 de Junho; e Branqueamento de capitais, previsto e punido nos termos conjugados dos artigos 4, nº 1, al. a), artigo 7, nº 1, als. i), k) e t), e artigo 75, nº 1, al. a) da Lei nº 14/2013, de 12 de Agosto.

 

O pedido do Tribunal Supremo é explícito e não deixa margem de dúvidas quanto aos seus propósitos que é para que a Assembleia da República dê o seu consentimento para que Manuel Chang seja preso. E esse pedido é feito com base no artigo 173 da Constituição da República e do Estatuto do Deputado. Vamo-nos concentrar na Constituição da República e abstrairmo-nos, por alguns instantes do Estatuto do Deputado, em respeito ao que estabelece o nº 4 do artigo 2 da Constituição da República, que as normas Constitucionais prevalecem sobre todas as restantes normas do ordenamento jurídico.

 

O artigo 173 da Constituição da República que é citado pelo Tribunal Supremo para fundamentar o seu pedido, estabelece no seu nº 1 que “nenhum Deputado pode ser detido ou preso, salvo em caso de flagrante delito, ou submetido a julgamento sem consentimento da Assembleia da República”. Fazendo uma leitura atenta a este número, evidente fica que o Deputado só pode ser detido ou preso em caso de flagrante delito, assim como ser submetido a julgamento somente com o consentimento da Assembleia da República.

 

No caso concreto, a pretensão do Tribunal Supremo é prender preventivamente o Deputado Manuel Chang, o que, não se estando em presença de flagrante delito, seria uma grosseira violação do estabelecido na primeira parte deste nº 1 do artigo 173 da Constituição da República. O pedido de consentimento da Assembleia da República só faria sentido se fosse para submeter o Deputado Manuel Chang a julgamento, conforme se pode extrair da segunda parte deste mesmo nº 1 do artigo 173.

 

Atento ao estabelecido no artigo 173 da Constituição da República, e não se estando perante um flagrante delito, o pedido do Tribunal Supremo constitui um apelo à violação da Constituição da República, porquanto não estão reunidos os requisitos constitucionais para que o pedido proceda. A Assembleia da República poderia dar o seu consentimento, não para a prisão do Deputado Manuel Chang, mas sim para ele ser submetido a julgamento, o que se efectivaria através do levantamento da imunidade parlamentar de que Chang goza enquanto Deputado, observando-se as formalidades previstas no artigo 16 do regimento da Assembleia da República.

Quero partilhar algumas ideias. Alguns exemplos de sucesso de que uma onda de “negação” pode positivamente causar. Falo de casos que acontecem, talvez todos os dias aqui nas “nossas barbas” e não se nota facilmente. Quero também negar a crença, que é irreal, de que “O Moçambicano É Tolerante” (sinónimo de panhonho). Essa de TOLERANTE, é das maiores asneiras que se pronuncia por aqui na Pérola do Índico. Mas, não fujamos do assunto. 

 

Em 1996, eu ainda muito jovem, fui à Cidade da Beira, Província de Sofala. Nunca tinha sentido uma espécie de “pensamento comum”. Nunca tinha visto no rosto nas atitudes de pessoas, uma coisa que hoje entendo como DETERMINAÇÃO. Na altura, fazia poucos anos que a Coca-Cola, SABCO tinha retornado a Moçambique. Nem todas as variedades de sabores existiam quando a empresa se reinstalou, em 1994. Só vendiam o sabor Coca-Cola e foram progredindo para Fanta, Sprite e por aí em diante. Bebemos, quando a fábrica abriu, a garrafa de 300ml ou ao preço de 1500Mt que hoje seriam 1,5Mt (Um Metical e Cinquenta Centavos). 

 

Falo de 1.500Mt porque a Nova Família do Metical só entrou em vigor em 2006, a 1 de Julho. Com o evoluir dos anos, penso que em 2002 ou pouco depois, a mesma garrafa de 300ml já tinha subido de preço e cifrava-se em 7.5Mt. Quando fui a Beira, percebi que “os beirenses” não toleraram essas constantes subidas. Sei que não houve uma manifestação contra a empresa Coca-Cola, mas o seu sentido de “pensamento comum” fez com que NINGUÉM pagasse esses 7.5Mt que aqui em Maputo eram pagos. Eles, pura e simplesmente PARÁRAM DE CONSUMIR os refrigerantes. A empresa foi forçada a baixar o preço até ao nível que “eles se predispunham a pagar”, que eram os 5Mt. Reparei que, até há bem pouco tempo, talvez uns 3 ou cinco anos atrás, na Beira o refrigerante sempre esteve mais barato que Maputo. O facto de a Coca-Cola ter introduzido a garrafa de 200ml e outras formas de embalagem como a plástica mudou hoje esse cenário que constatei há vários anos atrás.

 

O preço do refrigerante – atente-se que nem precisaram de Associação de Defesa do Consumidor - não foi o único que “eles” (devia ser nós Moçambique) contestaram veemente. As subidas dos preço do chapa, do pão e nos dias recentes do Txopela, também foram combatidos. Importa e muito falar do Txopela. Os Txopelas emergiram em Maputo (Moçambique) com a tónica de serem uma alternativa barata aos Táxis convencionais. Carros normais, como um Toyota Vitz, que por exemplo, tem um Motor de 1.000cc, já são maiores em motor e por conseguinte, maiores consumidores de combustível que um Txopela, pois este tem apenas 200cc, portanto, 5 vezes mais económico. Entretanto, esta opção de preço baixo em Maputo, só durou alguns meses, talvez pouquérrimos anos. Nos dias de hoje (isso testei, pessoalmente) uma distância de 4Km em Maputo é cobrada 200Mt.

 

Experimentem estar no Supermercado MICA ou Shoprite de Maputo no Bairro da Malhangalene e pedir ao txopeleiro para descer no Bairro do Aeroporto (é uma distância de 4Km, aproximadamente) e virão que serão cobrados esses 200Mt. É um absurdo permitido na Cidade e Província de Maputo. Se um Toyota Vitz consome apenas 1 litro a cada 12Km, então um Txopela que é cinco vezes mais barato poderá, na pior da hipóteses consumir metade disso. Portanto, numa distância de 4Km não consumirá mais que um sexto do litro de combustível, logo, o custo em combustível, nesse trajecto é de 11Mt. Já na Beira (algo que também testei, recentemente) se se sair do Supermercado Shoprite da Beira até ao bairro Palmeiras (Próximo ao Tropicana), que é uma distância de 4Km, o Txopela só cobrará 70Mt, portanto abaixo da metade do que se cobra em Maputo. E veja que são 70Mt que eu não quis negociar porque aqui em Maputo pagaria mais 130Mt. Porquê, então, essas diferenças de preço? 

 

Os economistas até poderão fundamentar com teorias de sua região intelectual, mas para mim estas diferenças prendem-se com a mentalidade da população daquela região – BEIRENSE NÃO TOLERA ABUSOS OU INJUSTIÇAS. E esta aura de necessidade de ser respeitado é algo que está inculcado em cada beirense. É algo que está até na medula óssea dele. Basta um beirense do bairro de Matacuane dizer NÃO QUERO, é porque, de certeza, de certezinha que, o beirense do bairro Esturro dirá, exactamente, a mesma coisa... isso existe desde 1996 que eu saiba e não havia Internet, Facebook e WhatsApp para falarem de “Influência do Exterior”…

 

Não fiz estudo algum, mas, hoje quando olho a mudança no panorama político na região centro e norte, fico claro que a mentalidade lá é, definitivamente, diferente. Asseveraria que o MDM, jamais teria a oportunidade que teve se estivesse em Maputo. Na Cidade da Beira, Deviz Simango, mesmo tendo se desligado da Coligação (aonde a Renamo fazia parte) e formado a sua organização, continuou e continua, até agora a merecer o apoio popular, como Presidente do Conselho Autárquico da Beira. 

 

O mesmo acontece com Quelimane aonde Manuel de Araújo, vai mudando de bandeira, mas o Povo não o larga. Isso é sinónimo de que, os espectáculos, as camisetas e bonés, as capulanas e lenços, etc. não afectam capacidade de julgamento de certos moçambicanos. Eles não esquecem quando você mente, injuria, despreza, etc... Muitos dirão que é porque aqui no sul - Maputo, Gaza e Inhambane - foram os locais aonde as atrocidades das armas mais se evidenciaram na Guerra dos 16 anos. Isso é falso, pois se assim fosse, essa UNIDADE para a JUSTIÇA, esse DEVER DO CIDADÃO para com os SEUS DIREITOS, na Beira, só se verificaria politicamente. Todavia, os exemplos Coca-Cola e Txopela demonstram que essa mentalidade, essa DETERMINAÇÃO e o espírito de “Um Só pensamento” se estende para os campos sociais e económicos.

 

Dito isto, acredito ter enunciado algo que demonstra que esse Chavão “O Moçambicano É Tolerante” é uma tese falsa. Isto mata também a ideia da “mão externa”. Há sim, um crescimento em termos de atitude que se começa a verificar cá para o Sul com muita mais acutilância. A votação na Matola é prova disso. Aliás, aqui mesmo em Maputo, nas eleições passadas verificaram-se fenómenos interessantes. Antropólogos podem especificar melhor que “experiências” os Povos do Centro e Norte do País vivenciaram durante décadas, senão séculos, até atingirem essa maturidade do tipo IMATRECÁVEIS  e de INSEPARÁVEIS que hoje apresentam. 

 

Cá no Sul, há ainda gente que cai na ladainha política de que “eles vão mudar”… Ou na ideia de que “nós pertencemos à elite e então devemos apoiar os Papás corruptos”. Por inocência ou mesmo por brutalidade, vemos muitos Maputenses (não é só para os naturais de Maputo, Gaza e Inhambane – mas também os do centro e norte, mas que já foram instrumentalizados) a procurarem, com todas as teorias possíveis justificar que a campanha EU NÃO PAGO AS DÍVIDAS OCULTAS é um erro. Tentam construir a ideia de que a campanha está mal formulada; ou então porque deve-se mesmo pagar uma vez que já se prometeu ao credor que Moçambique pagaria (e não pagar seria demonstração de irresponsabilidade que teria uma reacção severa do ocidente); ou ainda porque é algo vindo de fora (Teoria da Mão Externa).

 

O grande sucesso desta campanha deve-se exactamente ao facto de se notar um “evoluir” dessa MENTALIDADE ÚNICA, desse DEVER SOLIDÁRIO. Falo de solidariedade, porque o que muito aconteceu aqui em Maputo (e toda zona sul – por resvalo) é encontrar gente que, mesmo não sendo membro do partido A ou B, mas porque tem um salário ou emprego consistente, tender a não ser solidário para com o seu irmão que se manifesta ou chora porque essa “marcha” reduzirá o seu sofrimento, sua fome, seu frio. Essa gente sempre se diz para consigo “eu não me meto pois não é meu problema” como se a sua Mãe, a Mãe do Melhor Amigo, a sua Prima, o seu Tio Querido (aquele que vem fazer as vezes dele quando você vai lobolar), o seu Avó, a sua futura comadre, etc. não fossem pessoas por quem valesse a pela lutar por eles. Muitas vezes nem precisa fazer tanto, bastando NÃO ATRAPALHAR dizendo pouco da luta e esforço dos outros, pois isso só encoraja o OPRESSOR… Não sou o John Lenon mas, atrevo-me a dizer que I HAVE DREAM (Tenho Um Sonho) de ver Um Moçambique aonde todos querem o mesmo… e hoje NINGUÉM (menos os 16/18 e seus sequazes) QUER PAGAR ESSAS DÍVIDAS… 

 

Esse é um dos grandes méritos do CIP…

domingo, 20 janeiro 2019 15:29

Uma pergunta à justiça Americana

A questão é: porque é que até hoje não submeteram os documentos necessários para a formalização da extradição de Manuel Chang para os Estados Unidos da América, sendo que ele deve estar presente já no dia 22 em Brooklyn, Nova Iorque? Duas respostas possíveis. Uma primeira: nós temos até 60 dias para manter esse corrupto detido enquanto, gradual e eficientemente, juntamos essa papelada. Não é uma papelada simples de amealhar e todos os documentos podem ser contestados e assim deitarmos abaixo um trabalho, ou melhor, uma empreitada investigativa de mais de 10 anos e que deve resvalar na decapitação da cabeça da cobra, que são os "patrões" do detido. Atente-se que quando o detivemos, na verdade queríamos que alguns outros estivessem em condições de ser imediatamente capturados, mas não tal aconteceu. Por isso, vamos continuar, apesar de uma grande intromissão e sabotagem (fora dos olhos da sociedade) do nosso trabalho. Iremos, dentro do prazo e mesmo com esse alvoroço, cumprir a nossa obrigação legal e formal.

 

 Uma segunda resposta: nós olhámos para o futuro de forma muito lúcida. Sabemos o que, no fundo, no fundo, estamos a investigar até onde podemos chegar e também tudo o que pode acontecer pelo caminho. Os EUA não têm Kasparov, mas são personalidades por excelência no jogo de xadrez criminal perpetrado por políticos. Veja-se só que se já tivéssemos apresentado a papelada, aquelas "hienas astutas" do clã Krause já teriam arranjado uma forma de anular os nossos argumentos, gerando arruaça. Não que sejam documentos fracos, mas não há quem não tenha um ponto fraco. 

 

 Então, porque sabemos em que estamos a mexer, vamos aproveitar o tempo que temos a nosso favor para deixar que eles se exponham e lancem todos os seus peões. Não estão habituados a ser contrariados e, como estão a ver, eles são perigosos até contra eles mesmos. Iremos com calma. O peão da legalidade da detenção já está ultrapassado. O peão da caução foi agora por eles anulado, pois foram jogar com o cavalo. Estão, se bem me entendem, a deixar o rei e a rainha desprovidos de recursos de defesa. Quando a documentação necessária chegar, estaremos sem mais nenhum impasse, pois os opositores e seus argumentos serão cadáveres vivos, tentando armar-se em perigosos walking dead... E nessa altura iremos com tudo para cima do rei e da rainha. Nunca nos pronunciámos, a não ser em dois documentos: o da detenção, que já está solidificado com a legalização pela Juíza sul-africana. E a formalização da acusação para que se saiba que estamos à procura de justiça para os nossos cidadãos e país (Moçambique tem só a ganhar com isso e nem precisa de trabalhar, bastando não atrapalhar). Mas, sempre soubemos que se daria uma conotação política às nossas acções, quando quem está a usar da política para interferir nos assuntos judiciais são "eles"... uma vez que foram travados pela inexistência de argumento jurídico-legal para defender criminosos. Chang e os seus "chefes" não são os primeiros criminosos que prendemos neste mundo. Frank Lucas, Joseph Kennedy ou Al Capone são exemplos de criminosos que tirámos da face da terra. Fomos mais longe, pois as suas acções, apesar de serem desenvolvidas além-fronteiras acabavam por criar danos à América e suas populações. Falo de Pablo Escobar, que comandou o negócio da cocaína no mundo atingindo uma taxa de penetração mundial de 80%  e teve uma fortuna de mais de 30 mil biliões de Dólares. Mesmo assim conseguimos cortar a cabeça dessa cobra venenosa. O nosso interesse é um mundo mais limpo e zero risco para o Povo Americano.

 

Portanto, pode ser que o Michael Masutha caia nessa. Pode ser. Repito, pode ser que ele aceite envelopes e pense que está a obstruir a nossa empreitada. Porém, está tudo acautelado. Uma tempestade viria sobre ele e Ramaphosa e, consequentemente, sobre a África do Sul, caso achassem que podem prejudicar ainda mais os nossos cidadãos já demasiadamente lesados por Chang e seus parentes na pilantragem. Note-se que esta parece ser uma terceira resposta possível, pois, desse jeito, terão rasgado o TRATADO DE EXTRADIÇÃO e todo o histórico de cooperação ao nível judicial que vem sendo aperfeiçoado desde 1946...  Não é uma boa saída para eles argumentarem com a SADC quando querem é libertar um criminoso, dar risadas de hienas desgovernadas e continuarem a sobreviver às custas de prejuízo de gerações e gerações de humildes populações. Ninguém nos "bate" politicamente, ninguém. É uma questão de coerência da parte deles. A relação histórica que o ANC tem com a FRELIMO pode terminar de forma drástica e arrastar os dois países para uma crise sem precedentes, quando um pensamento racional e razoável pode "limpar" os corruptos de Moçambique e torná-lo um local saudável para o Doing Business, que, no final, é a nossa maior pretensão. Alguns países sem rosto (a exemplo do Egipto) estarão nos próximos 20 anos no “Top 10” dos países mais prósperos. Outro exemplo é a Indonésia. A chave para o tamanho progresso foi tirar de lá os empecilhos ao desenvolvimento. Acabámos com a ditadura disfarçada de democracia. Cortámos a cabeça da cobra. 

 

Entendam, o mundo está a caminhar para uma cidadania global sem precedentes. O interesse dos países mais fortes é que todo o espaço terrestre seja bom para se trabalhar, viver e fazer negócio. Um egípcio rico há-de ter negócio ou interesses em Moçambique. Do mesmo modo, mas negativamente, um criminoso como Chang, ainda que pense que a sua soberania só produz desgraça no seu país, vai afectar toda a região e o mundo por resvalo. Não se pode dar espaço para arruaceiros disfarçados de fidalgos. Conceder tréguas a gângsters com capas de governantes, quando nunca tomaram uma única decisão estratégica que desenvolvesse o seu país e seus povos. Esses devem ser liminarmente eliminados. Caso não estejam interessados, nós ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA estamos, pois se deixarmos essa erva daninha crescer tornar-se-á numa árvore venenosa que terá a suas raízes a invadir os nossos quintais por baixo do muro. Não tenho mais nada a questionar.

quarta-feira, 16 janeiro 2019 06:26

O Presidente que se “ponha a pau”!...

A 15 de Janeiro 2015, Filipe Jacinto Nyusi tomava posse como (quarto) presidente da República de Moçambique. O seu discurso, na cerimónia de investidura, na Praça da Independência, surpreendeu a tudo e todos. Dizia ele que em Mondlane buscaria a visão da unidade nacional e a certeza de que as diferenças entre os moçambicanos não os poderiam dividir na sua aspiração comum de construir uma Nação mais unida e coesa. Que se inspiraria em Samora, na determinação para a edificação de um Estado mais forte, com instituições cada vez mais íntegras e democráticas ao serviço do povo. E, finalmente, que buscaria em Chissano o espírito de tolerância e de reconciliação da família moçambicana. 

 

Mas, mais do que isso, o PR dizia e reiterava que “o povo era o seu patrão” e que o seu compromisso era o de servi-lo, prometendo, para isso, “respeitar e fazer respeitar a Constituição e as Leis de Moçambique”. Para FJN a paz era a condição primária para a estabilidade política, desenvolvimento económico, harmonia e equidade social. Na verdade, este terá sido o seu grande “ponto de honra”. Principalmente quando prometeu que tudo faria para que, em Moçambique, jamais, irmãos se voltassem contra irmãos, fosse a que pretexto fosse. Aí terá residido a sua atitude arrojada, ao longo destes quatro anos.  Pois “trepou” à serra da Gorongosa para conversar com Afonso Dhlakama, o (falecido) líder da Renamo… E, graças a isso, o país passou a viver um clima de paz e reconciliação.  Para a opinião pública, esse é o maior – e provavelmente o único –  trunfo de Nyusi.



Porque noutras vertentes, os seus quatros anos de governação deixaram muito a desejar. 
Por exemplo: disse que queria que Moçambique fosse referenciado como um dos países com uma das taxas de crescimento mais elevadas do mundo. Não conseguiu! Que queria planos de desenvolvimento orientados para a redução das assimetrias regionais e locais. Também não conseguiu!  O tal combate cerrado à corrupção ficou aquém das expectativas. Aliás, o “dossier” das dividas ocultas e a impunidade que ainda persiste, é disso um exemplo crasso. No entanto, quatro anos volvidos, Nyusi veio hoje reafirmar o compromisso assumido (nesse 15 de Janeiro de 2015) de servir o seu povo com humildade, dedicação e objectividade. E também de dedicar-se ao combate à corrupção por saber dos “efeitos nefastos” desta, na sua agenda de desenvolvimento sustentável e inclusivo.



Como se isso não bastasse, o Chefe de Estado ainda nos vem com a “cantiga” de promover a segurança alimentar e nutricional, um maior acesso à energia, a viabilização do desenvolvimento da economia, o aumento de rendas das famílias moçambicanas, o desenvolvimento humano através de maior acesso à educação, saúde, água e saneamento, entre outras. Muito “blá blá blá”. Porém, é quando reafirma o seu empenho no combate à criminalidade e a eliminação dos ataques protagonizados por malfeitores no norte da província de Cabo Delgado que a sua mensagem se torna mais risível. Porque uma coisa é reafirmar e outra é fazer. São quatro anos e as pessoas já não estão para ouvir (e acreditar) em “discursos”.  Até porque para o ano vai haver eleições. Por isso, o presidente que se “ponha a pau”!…

terça-feira, 15 janeiro 2019 16:58

Jaco Maria, meu irmão de sangue

 Em 1973 Jaco Maria gravava o seu primeiro disco (um single) onde consta o tema Hana nga nyi haladza. Uma elegia. Um apelo ao amor de uma mulher que se calhar nem existia. Provavelmente imaginada. Mas também toda aquela poesia emotiva, comovente, podia ser real, quem sabe! A verdade é que o disco era um foguetão preparado para lançar uma nave que ainda está em órbita. Quase quarenta e seis anos depois. E uma nave que fica esse tempo todo levitando, não pode voltar à atmosfera terrestre.

 

Quando ouvi pela primeira vez a voz de Jaco naquele disco de vinil, eu não tinha estrutura para perceber que estava diante de um anjo concebido por Deus para cantar no cume.  Das montanhas de pedra onde se ensoberbecem as águias. Com a nota de que este músico não se envaidece. Ele embevece. Aliás foi no Hokolókwè, uma banda de cristais puros, onde Jaco Maria retumbou humildemente, parecendo ele quem ia à frente. Então aí eu já tinha alguns elementos no intelecto para ficar assustado com o vulcão que já estava em erupção. 

 

Hokolókwè também não parecia daqui.

 

Eventualmente não percebíamos que os rapazes daquela banda eram possuídos por demónios de outro planeta. Jaco também. Quer dizer, do lugar onde se encontrava, o autor de Hana nga nyi haladza já não podia voltar para trás. O que lhe restava era continuar a avançar. Como os gnus. Feitos para avançar como o próprio mundo. As naves sagradas não retrocedem. E o homem mostrou-nos isso quando cantou o ressonante Sengue, acompanhado ao mais alto nível por aqueles rapazes que buscaram o funk para hastear um tema com letra simples. Profunda. Jaco Maria é meu irmão de sangue. No sentido de que nascemos no mesmo chão.

 

Ele no bairro Santarém, eu na Fonte Azul. Mas todos nós daqueles dois conglomerados parecíamos feitos da mesma massa. Dos mesmos grãos da terra que vestíamos com os pés. O que nos unia era a euforia de sermos crianças. Jogávamos à bola no “bángwè”, de onde me lembro de duas “estrelas” aos pés das quais nos rendíamos. Vencidos: Chumbo Lipato e Nando Guihoto. E talvez Papato. Lembras-te, Jaco? Claro que te lembras! Foram tempos. Bons. Vividos sem recalques. E o músico estava lá. Incubado naquele miúdo que nos intervalos da Escola Industrial e Comercial Vasco da Gama dava uns toques na bola de básquete. Mas Jaco não nasceu para “aquilo”.

 

Sentados frente à frente com Arão Litsuri, nos princípios do ano 2000, eu disse assim para ele: “Arão: tens uma das vozes masculinas mais bonitas de Moçambique! E o Arão respondeu-me assim: mas a voz mais bonita mesmo, é do Jaco Maria. Liguei para Salimo Muhamed, nesta segunda-feira (14.01.2019) e disse-lhe que a estava a escrever um texto sobre Jaco. Salimo disse-me assim: aquele manhambana canta para caramba! Pois é: Jaco Maria chama-se Angélico, de seu nome oficial. Angélico significa puro como os anjos. E com este nome, Jaco não podia seguir outro caminho que não fosse o da luz