Estacionaram o carro em frente ao botle store ao lado da Associação dos Escritores Moçambicanos, na Avenida 24 de Julho. É manhã solarenta, e o movimento pacato surpreende uma cidade buliçosa que parece degenerar a cada dia que passa. Não há viaturas por sobre os passeios, mas a explicação para isso está subjacente no facto de que maior parte desses meios, são trazidos de fora da urbe em dias normais de trabalho. E hoje é sábado. Mesmo assim, em termos de expectativa não muda muita coisa, ou seja, há uma certeza inabalável de que Maputo é um espaço cosmopolita que não sabe muito bem para onde vai. Pode ser que esteja a avançar para o caos, porque os conglomerados habitacionais que surgem imparáveis em todo o perímetro, parecem querer sufocar a história das acácias. Não há alternativa. Todos acordam e vêm para o centro, em bandos como pássaros desesperados, para encher os pulmões de oxigénio contaminado.
Da porta da frente, do lado esquerdo, sai um deles. São quatro. E dirige-se directamente à loja de bebidas, de onde pouco tempo depois volta com duas garrafas de Ballatin´s, e mete-se novamente no mirabolante BMW com vidros fumados. Lá dentro estão bem, com ambiente climatizado. Têm gelo no pequeno coleman e copos que vão ser imediatamente abastecidos, porque não há tempo a perder. O tempo ruge. Por isso, antes de saírem da linha de partida, é preciso bater um gole-um gole, cada um. E foi isso que fizeram. Beberam numa espécie de ritual, e sentiram o escorrer do corpo. Entregue à bebida que lhes vai dar uma falsa sensação de bem estar.
A viatura sai suavemente das “boxes”, onde, no lugar de os ocupantes trocarem os pneus, compraram duas garrafas de ballatin,s para festejarem a viagem que os levará a Chongwene. O motor é imperceptível, mas a máquina não deixa de chamar a atenção pelo seu lustro. Viraram à esquerda, pela “Salvador Allende”. Desembocaram na “Keneth Kaunda”. Tornaram à direita e desceram até à Costa do Sol, passando pela Praça 25 de Junho, acabando por entrar na imponente “circular”.
Neste troço, até à EN1, já em Marracuene, eles estão em plena ascenção. Têm tudo. Incluindo a ilusão de que são felizes. Aliás, o ballatin,s reforça-lhes essa sensação. É por isso que depois de cada gole, querem logo a seguir outro gole, na procura profusa pela órbita que lhes transmitirá a estabilidade. Mas não há a menor dúvida de que são doidos. Não sabem que tudo aquilo é uma fantasia.
Na EN1, o condutor certifica-se de que está tudo em ordem. Pergunta aos companheiros se “podemos bazar”, como se todos os movimentos que fizeram até ali, fossem um simples ensaio. Os outros responderam que sim, “podemos bazar, brada, pisa essa merda”. Na verdade o jovem pisou fundo no acelerador de uma viatura de caixa automática, que em menos de três minutos tinha o ponteiro a oscilar entre os 180 e 220 quilómetros à hora. É uma loucura. Naquela velocidade eles estão pendurados por fio. Porém, têm dois elementos que lhes impede de perceber isso: a estabilidade do carro, o conforto, e o ballatin,s.
Quando chegaram à Macia, depois de rasgarem a espectacular paisagem oferecida pelo canavial de Xinavane, um deles perguntou, já estamos na Macia! O condutor disse assim, “avia lá o meu copo, meu caro, está vazio!”. Bebeu num trago. E daqui para frente perdeu completamente o medo. Os outros também.
Aí vão eles, sem saberem que a morte lhes esperava na planície de Xai-Xai. Passsam de Chicumbane como um meteorito, deixando as pessoas pasmadas. Assustadas. Mas o que é isto! Os jovens minimizam todos os perigos. Já não estão em condições de descernir. E a morte sorria. Sinistra. No cadafalso onde o BMW saíu da sua faixa de rodagem e foi contra um tractor estacionado. O resto ninguém sabe explicar. “Só vimos chamas”!
Hoje é dia de reflexão. Dia de pensar o que queremos para o nosso futuro e, principalmente para o dos nossos filhos. Já dizia Samora Machel que “as crianças são as flores que nunca murcham”. E é verdade. Há 44 anos, quando Moçambique ficou independente, a par com outros países de expressão portuguesa, muitos de nós éramos essas crianças. Hoje, depois de já termos uma história para contar às nossas crias, somos nós que decidimos. E decidir votar é a melhor opção. É participar numa sociedade que queremos mais justa, mais ecológica e mais transparente.
Lembro-me de uma campanha publicitária, há 10 anos atrás, que incentivava os moçambicanos a irem às urnas. Fazia uma paródia em relação àquilo que chamamos: mais do mesmo. O comer peixe com legumes e estar sempre a reclamar. Essa campanha foi um dos motores que me levou a votar com mais afinco nesse outubro de 2009. Estávamos a viver uma nova era, com o aparecimento de uma terceira força política e a esperança de que tudo ia mudar. Que os partidos se iriam esforçar para um futuro melhor para nós todos. Hoje temos quatro candidatos à presidência. E que mais?
Agora, sem o poder da clarividência, mas com as marcas da experiência, olho para trás e vejo que tudo piorou. Temos um país na banca rota, altos níveis de corrupção e os raptos e a violência agudizaram na Pérola do Índico. Decidiu, quem pode, evacuar as suas crianças para fora do país. E o nosso sonho em 2009?
Tudo bem que agora temos um novo cartão postal, a ponte. Temos mais marcas de cerveja, o pandza juntou-se à política e o tseke ficou na moda. Mas acredito que ninguém queria que o metical desvalorizasse vertiginosamente, que milhares de crianças continuem sem escola, porque Moçambique não é Maputo. Ya. Ninguém queria que inocentes continuem a ser assassinados, porque estão a “incomodar”. Que as fake news “matem” o Azagaia na véspera das eleições, como que um sinal de que temos de andar na linha. Ninguém quer ter medo de se expressar e lutar por um país melhor e viver, aos 40 anos, sem opção.
Por isso, e por tudo mais, vamos votar manas e manos. Vestir a camisola do poder de decisão e contribuir para que o nosso futuro, as crianças, aprendam a cuidar do nosso país e cresçam com sentido de justiça.
Nada de ficar em casa. Lembrem-se como foi há dez anos.
Conheci Anastácio Matavel num seminário na província de Gaza em Outubro de 2001. Na sala de conferências do munícipio de Xai-Xai ele estava sentado numa das cadeiras da frente. A partida pensei que estivesse diante de um descendente de Ngungunhana (ou mesmo do próprio), o último imperador de Gaza, tal o porte e o jeito de sentar. Também chamou-me atenção - durante as apresentações dos temas e no debate - a sua notável concentração e a exposição das suas dúvidas, questionamentos e comentários. Uma característica, incluindo sentar a frente, que lhe era congénita conforme e desde então fui certificando.
O seminario foi no âmbito de um programa de divulgação de assuntos sobre a dívida externa de Moçambique e do Plano de Acção para a Redução da Pobreza Absoluta (PARPA). Eu fazia parte de uma equipe de activistas do Grupo Moçambicano da Dívida (GMD) que se deslocou à Gaza para orientar um seminário e dai a instalação de um Núcleo Provincial do GMD. Deste núcleo seriam eleitos 03 representantes a fim de participarem - no mês seguinte - num seminário nacional na cidade da Beira, província de Sofala. No ano anterior (2000) o mesmo tipo de seminário tinha decorrido nas outras províncias e que por conta das cheias do mesmo ano não foi possível em Gaza.
O propósito do programa era a disseminação dos resultados positivos da campanha internacional para o cancelamento da dívida externa (Jubileu 2000) e do principal condicionalismo imposto pelos credores - capitaneados pelo Banco Mundial - aos países beneficiários do alívio reforçado da dívida, os ditos países pobres e altamente endividados e que incluía Moçambique na lista. Estes países deviam possuir uma estratégia de redução da pobreza (o nosso PARPA) de médio prazo (5 anos) e que contasse com a participação da sociedade civil na sua elaboração, implementação, monitoria e avaliação. Um condicionalismo que a sociedade civil recebeu com simpatia, pois constituía uma oportunidade efectiva para participar e influenciar o rumo dos processos e políticas de governação em Moçambique.
Na altura e era estratégico que depois de apresentado o tema era recolhido o feedback e só depois do intervalo é que se debruçava sobre os dados colhidos. Assim e durante o “lobby” do intervalo, dava tempo para esfriar os ânimos dos mais críticos e até dos hostis com uma dose de empatia, fora a do frango do almoço. E nesse dia, no intervalo do almoço, sentei-me com o Anastácio Matavel. Foi o nosso primeiro encontro de tantos que se seguiram.
Em Novembro de 2001 voltaria a ver o meu amigo Matavel no evento da Beira. No encontro nacional em seguimento das sessões provinciais de divulgação. De todas as províncias participaram representantes e o encontro resultou na consolidação da implantação dos Núcleos Provinciais do GMD e da estratégia nacional de participação da sociedade civil nos processos de governação, sendo o PARPA a porta de entrada.
Desse evento retenho um momento que aos olhos de hoje classifico de grande alcance estratégico e que teve influência significativa no trabalho que a sociedade civil moçambicana viria a desenvolver. No primeiro dia, depois da apresentação sobre o PARPA - na verdade sobre o que devia ser um PRSP (Poverty Reduction Estrategy Paper), na linguagem do Banco Mundial - a sessão termina com a pergunta: de onde começar para monitorar o PARPA?
Uma vez que a participação na elaboração do PRSP/PARPA não seria possível pois o documento já havia sido elaborado e submetido ao Banco Mundial no âmbito do alívio da dívida, a leitura foi de que a participação não se esgotava no processo de elaboração. Aliás, um dos requisitos de um PRSP/PARPA era de que fosse um documento rolante e dinâmico o que abria espaço para novos “inputs” no seu processo de implementação.
Na noite desse dia e porque teria que apresentar no dia seguinte a proposta da estratégia do GMD para a participação em todas as fases do PRSP/PARPA compulsei um dos documentos do Governo e nele estava escrito que para a implementação e monitoria do PRSP/PARPA não se produziria nenhum documento adicional e que para o efeito seriam usados os documentos operacionais anuais do Governo: o Orçamento do Estado (e o seu relatório anual de execução) e o Plano Economico e Social (e o respectivo balanço anual). Adicionei este item na apresentação da estratégia do GMD e pouco antes de terminar uma mão já estava no ar: era o suspeito do costume, Anastácio Matavel.
Em poucas palavras e no seu tom de imperador, Matavel disse que doravante tudo passava por nos concentrar nos documentos anuais de governação e de que urgia conhecer profundamente tais documentos. No final da sua intervenção foi ovacionado em cadeia nacional. Foi algo como o primeiro tiro para o início efectivo da participação da sociedade civil na monitoria da governação. Um momento histórico que recorda um outro: o do tiro de Alberto Chipande que deu inicio a luta de libertação nacional.
E foi do tiro de Matavel a gênese de um programa nacional e ambicioso de divulgação e formação rumo a monitoria anual do PARPA 2001-2005 (PARPA I) e tendo como horizonte a participação efectiva da sociedade civil na sua revisão e elaboração do que seria o PARPA II (2006-2009) em 2005. E neste exercício e outros da sociedade civil que se seguiram contou com a mão crítica e a sabedoria de Anastácio Matavel, em particular no comando da província de Gaza, sendo o fundador e o impulsionador-mor da cidadania nesta província.
Na passada segunda-feira, dia 07 de Outubro, volvidos 18 anos do nosso primeiros encontro e por coincidência na hora do almoço e na companhia de um amigo, recebo uma chamada que me informa que o Anastácio Matevel foi baleado por volta das 11 horas na cidade de Xai-Xai e que veio a perder a vida duas horas depois no Hospital Provincial. Eu ainda permanecia em linha e o amigo que estava comigo – depois de “googlar” sobre o baleamento de Anastácio Matavele – mostrou-me o resultado: era de facto Anastácio Matavel. O “Parpa” como carinhosamente nos tratávamos em homenagem ao nosso primeiro encontro.
Da última vez que falei com o amigo Anastácio Matevel foi no mês de Junho passado. Liguei para ele depois de acompanhar uma notícia televisiva sobre assuntos internos de funcionamento do FONGA, o Fórum de ONGs de Gaza que ele liderava. Do outro lado da linha o habitual “Viva Parpa”. E porque ele sabia a razão da minha ligação tratou de dizer que tudo estava a funcionar dentro da normalidade, tendo até citado algumas actividades em curso. Era o Matavel no seu melhor.
Na despedida ele disse e repetiu que os anos de combate cívico tornara-o resiliente a intempéries internas e externas. Infelizmente a sua resiliência não cobria a resistência a uma tempestade de balas. E de balas perdemos o Imperador (da cidadania) de Gaza e um activista de dimensão nacional e além-fronteiras.
Saravá, Imperador Anastácio Matavel!
- Não levas o guarda-chuva?
- Para quê!
Lá fora já se começam a ouvir as primeiras notas daquilo que daqui a pouco pode vir a ser o descer da música da chuva. Há um prenúncio. De longe os trovões ribombam, lembrando enormes tambores metálicos vazios rolando por sobre o asfalto, empurrados pelos operários exaltados por Samora Machel.
- Viva a classe operário-camponesa!
- Vivaaaaaaaa!
Os relâmpagos são o sinal do maestro, e logo a seguir entra em acção a orquestra. Sustentada nos trovões. É bela esta canção. Indepedentemente da tragédia que pode vir depois de todas as claves. Mas enquanto não vem o dilúvio, deixem-me dançar por dentro este rugido de Deus.
O céu está negro. Enclausurado em si mesmo. De quando em quando rasgado em longas fendas pelos raios que depois caem por entre os coqueiros que também dançam como eu, no palco do vento, sem perceberem que toda aquela exuberância pode vir cá abaixo, em derrocada. Eu também, posso sucumbir aqui mesmo. Como todos aqueles que não obedeceram ao Noa. Mas eu quero sair.
- Amor, leva o guarda-chuva!
Sou relutante. Já aconteceram muitas vezes estes sinais, em dias sem memória, e nenhuma gota de chuva caíu. Hoje também pode-se repetir isso. E seria uma grande maçada andar com esse acessório num dia sem chuva. Posso parecer um maluco. Não, eu não levo o guarda-chuva. Não vai chover!
Por causa da baixa temperatura (22 graus de máxima e 15 de mínima em Inhambane), visto uma gabardina de ganga, forrada por dentro. Na cabeça trago um chapéu, não propriamente à Tomaz Salomão, mas provavelmente à Pablo Neruda, ou à um italiano qualquer da máfia siciliana. Meus pés estão enfiados confortavelmente em duas sapatilhas de marca, que ainda matêm o ritmo. Tudo isso adquirido nas xicalamidade, e a sensação que tenho, vestido assim, é de leveza.
Dou um beijo à minha companheira, que traz um guarda-chuva na mão, insistIndo, e eu volto a recusar amavelmente.
- Não se preocupe, amor, não vai chover.
Voltei a beijá-la, e desta vez não resisti ao impulso de abraçá-la profundamente. Ela também abraçou-me profundamente, no mesmo instante em que trovejava fortemente, agora muito perto de nós, por cima da nossa casa. Senti o amor verdadeiro que vem da parte dela. Dado a um sabujo que sou, que não aceita o protector que vem do carinho de uma mulher mansa.
Largo suavemente o corpo quente de uma criatura cândida, e sinto que ela deseja ainda manter-me no seus braços. Mas eu tenho que ir. Saio sem olhar uma única vez para trás. Meto as mãos nos bolsos do casaco e recebo em retorno uma imensa paz de espírito. Caminho despreocupado. Nem os relâmpagos, nem os trovões me impedem de andar. Livre. Nem o céu negro, que não me assusta, mesmo sabendo que posso ser executado pelo mínimo sopro.
Passo pela licheira da Mafurreira e vejo um homem na gandaia, também desinteressado como eu. Quer lá saber dos relâmpagos e dos trovões! Mesmo que chova, qual é o problema? Deixa chover. A chuva não vem de Deus? E eu, não venho de Deus? Então, eu e a chuva somos irmãos do mesmo sangue. Vamos nos abraçar.
Não passam cinco minutos desde que saí de casa e lá está a descarga. Forte. O céu negro liberta em catadupa todo aquele vapor cumulado. Sou apanhado em cheio. Nem para trás, nem para frente. E em menos de trinta segundos já estou ensopado. Danado. E não me resta mais nada senão voltar para casa, onde a minha mulher, vendo-me entrar no quintal como um pintainho por demais molhado, vem a correr ao meu encontro, sem o guarda-chuva. Abraçou-me, ali mesmo, debaixo das fortes bátegas, e disse-me assim, és maluco, meu amor!
Quatro Pontos de Ordem
Aqui escolho olhar para campanha eleitoral moçambicana, mais uma vez, como dialética, como debate, como troca, como fluidez, como um momento não exclusivo dos partidos, como um momento não adquirido dos partidos, mas como um momento do povo, dos vários seguimentos da nossa sociedade, onde juntos na diversidade, se diga o que se almeja e o que se espera para o próximo mandato, que mais uma vez irá impactar e imperar nas nossas vidas.
Tendo passado os meus últimos dezanove anos dentro da academia moçambicana, a saber: Universidade Pedagógica - Delegação de Nampula, Universidade Pedagógica Delegação de Quelimane[2], e outras fora do país, como estudante, depois como 'docente', assim por diante, e agora de forma feliz como estudante, irei com este manifesto com base nesta pequena experiência, e com base num viés naive, começar por esta área.
Meus senhores[3], Daviz Simango, Filipe Nyusi, Mário Muquissinse e Ussufo Momade e demais partidos, prestem atenção:
Estudante Sem Bolsa Familiar
Em Moçambique não existe esta coisa que muitas tratam como se de lepra e doença contagiosa se tratasse, ou seja, quando procuras saber, as testas das pessoas mudam de formato, olham para ti como se fosses uma extraterrestre e estivesses a falar de coisas de outro mundo, como se tu já estivesses no futuro e nas entrelinhas te dizem, ‘não'.
Pois é, num país assimétrico nas questðes de paridade quantitativa entre mulheres e homens, num país desigual e sem equidade de género, num país past and copy das questões de género e feminismo, num país carente uma uma abordagem e prática '‘local’' das questões de ser mulher e ser homem, num país de calças versus capulanas[4], num país de DHABUNO MUTHABWA[5], ou seja, ' vocês mulheres agora estão a piorar (quando estas ficam fartas de estar na condição do silêncio), num país onde as narrativas ' formais ' falam de políticas de género, falam de fosso entre as calças e as capulanas perante os níveis de Mestrado e Doutoramento. Neste país, existe uma prática tóxica e nociva para aquelas mulheres que depois de venceram as barreiras de ordem estrutural e social, são confrontadas com um Estado, com uma instituição pública, que concede como bolsa para tu e tua '‘família’ irem estudar fora, se for para Europa (aqui o nosso Estado entende Europa como sendo um único país, ou seja, não importa o país, o valor é o mesmo), um valor mensal de 769 euros, ou seja, ao câmbio de dia 67,2 (compra) e 68,54 (venda), seriam 52.707,26 mt[6].
Para o contexto moçambicano este valor é muito, ou seja, 52.707,26 mt, para os contextos onde se a pessoa estuda fora de Moçambique este valor é aquele cinto super apertado, ora vejamos, para pagares as tuas contas básicas, que naturalmente 'mamam' a bolsa toda, isto é, para pagares a renda da casa, a água, a luz, o gás e a internet, tens que ir ao ATM e levantar o valor para poderes pagar.
Levantas o valor com o teu cartão multibanco da tua conta moçambicana, ou seja, cartão moçambicano, assim como a conta moçambicana, aqui fora não tem expressão, olha que em termos estéticos são cartões idênticos, (Millennium BIM ou Millenium BCP ou BCI ou BPI ). O que significa isto para o bolso do estudante bolseiro que recebe a bolsa em Metical, pois é, em Metical para pagar contas em Euro?
Não sei em que ano e em que contexto esta tabela de bolsas de estudo foi definida, mas ela não tem mais a cara e o rosto para o século XXI, ou seja, se a bolsa individual o estudante vive stressado (stress negativo), pelo facto do valor apertar e bem a sua cintura e cinto, como acham que fazem os estudantes que ousam em estar fora do país com as famílias, geralmente com menores?
Quando falas e negoceias a bolsa familiar na instituição, olham como se de um capricho se tratasse, porque tal Fulano e tal Fulana, já passaram por isso, ou seja, já sofreram, porque 'ela/e(s)' não pode(m) sofrer, ou melhor, '‘no nosso tempo nós sofremos, porque eles não podem sofrer’'. E mais estudar dentro ou fora de país tratasse de opção, ora vejamos;
Quando a pessoa termina os estudos, dentro ou fora do país, engrossa os dados estatísticos de Moçambique, isso se não tiveres a sorte de aparecer um Boisse (Chefe), que vai te dizer o seguinte, ‘você só estudou graças ao partido’, nas entrelinhas você pensa ‘possas, este tipo está a dizer o que’.
Sobre este assunto, senhores candidatos e partidos, vamos parar de ter pesos e medidas, ou seja;
Que tal, senhores candidatos e partidos, lutarem e lutarmos para:
Pensão de Sobrevivência
Pensão de Sobrevivência na função pública perante o cenário onde o funcionário tenha perdido a vida, os menores só terão direito, caso o falecido tenha descontando 5 anos, não tendo descontando cinco anos, os seus dependentes não tê direito. Porque gostamos de complicar? Acham mesmo que o falecido escolheu a morte? Acham que ele devia ter dito a morte para esperar nove meses ou um ano de um mês para ele completar os cinco anos de desconto? Acham que os menores merecem não ter apoio do Estado na ausência do seu progenitor?
Senhores candidatos e partidos, porque não dar o direito automático a Pensão de Sobrevivência a quem de direito, ou seja, a partir do Visto do Tribunal Administrativo, visto que a pessoa não escolhe morrer e muito menos quando de uma morte precoce se trata. Stélio Gadaga, esta é a pensar em ti, para que a Alicia, Tessália, e mais crianças, possam ter a Pensão de Sobrevivência até aos 18 anos.
Academia without the box
Prezados candidatos, vamos nos próximos cinco anos, e assim por diante pensar e sonhar com uma academia moçambicana emancipada. Como se faz isso?
Com base na libertação das mesmas das entranhas políticos partidários. As academias são instituições ‘autônomas’, como fica esta autonomia sem liberdade?
Uma academia que toma as decisões a pensar no seu colectivo, nos seus órgãos colegiais, na comunidade universitária, uma academia naturalmente aberta para o debate de ideias, onde todos cabem nela, com ou sem cores. Uma academia de portas abertas para a política, para os partidos políticos e para os políticos, caso estes queiram vir debater com ela. Que o capital político não venha dar ordens, não venha mandar, não venha dizer em que deve e o que não deve estar no debate académico, mas que venha na condição de participante. Uma academia onde o reitor saiba que as decisões por ele tomadas devem refletir o colectivo não o individualismo.
Senhores candidatos, para tal o capital político precisa primeiro libertar-se da academia, para depois poder libertar ou ajudar a academia a liberta-se. A voz político partidária não pode ser o status quo na academia, o status quo na academia deve ser a liberdade e autonomia.
O académico não pode sentir medo, o académico deve sim ter respeito, chega a ser deprimente e surreal quando chegamos ao nível tão baixo onde o académico, pensa que a solução para seus problemas e vergar-se ao som e as batidas do partido. Não pode ser normal no seio académico a venda de consciência por um cargo e depois colocar-se numa posição onde de forma recorrente será recordado o seguinte que depois o partido vai dizer você ‘cuidado com tua boca’, a boca não é para ser controlada na academia, na academia a boca é para liberta-se e se possível para cantar ao ritmo das demandas da sociedade.
Os académicos que quiserem fazer a vida política, que estão na vida política, que o façam, mas que não caiam na política por desespero, a nossa política não pode ser um bastião de desesperados. A nossa política deve ser um lugar de salutar e com pessoas e visões progressistas, pessoas de qualidade. Mas não caiam na política por acharem que a política é a escada, não façam isso, isso é deprimente, academia deve significar liberté, a verdadeira emancipação quotidiana.
Caros candidatos, o que podem fazer como estadistas, e os partidos que são influentes na assembleia da república é políticas públicas (não como um favor) bem robustas e estruturais no que toca a política de ensino, pesquisa, publicação e extensão, antes de nos internacionalizarmos, vamos organizar bem a casa. Sem deixar de lado a formação de quadros, se queremos no ensino superior o nível de Mestrado e Doutoramento como requisito para lecionar, que o façamos a pensar em mulheres e homens, como bolsas familiares.
O que também podem fazer é incentivar que a nossa academia pense no lugar na cultura dentro dela. Para que possamos ter uma academia glocal, onde o saber local é valorizado, mas, que ela não deixe de comunicar com o saber global.
Política como Ética
Prezados candidatos e distintos partidos, a sociedade precisa acreditar na política e nos políticos. Para tal, vós tereis que trabalhar para existência de partidos com narrativas frescas e refrescantes, com narrativas progressistas, com estórias e história sim, como referências, mas não como dogma, partido que não deia ordens na academia, partido que não deia ordens no povo, mas sim uma relação social entre ambos, com respeito no lugar do medo e silêncio. Partidos naturalmente tolerantes.
Uma política que usa com peúgas e botas, e não uma política que usa as botas e depois procura pelas peúgas. Como seguimento social precisamos muito da política, assim como o político precisa deste seguimento, ou seja, são os dois lados da mesma moeda. Isto é, não só precisamos do político, como também precisamos do cidadão, da cidadania, da liberdade, e de todo aquele que se prestar ao serviço da política que o faça sobre um juramento ético e não materialista, empatia, alteridade e tolerância. O político não pode ser o status quo da sociedade, status quo é o cidadão, o povo, as mulheres, os homens, o político vem ao reboque destes e muito bem-disposto a servi-los. Os benefícios devem estar mais próximo possível do povo e não o inverso.
Bilhete Jovem (até aos 25 anos)
Nos pouquíssimos dias que faltam de campanha, vamos juntos pensar num Moçambique melhor para os adolescentes e jovens. Por exemplo, Podemos começar pelo bilhete jovem. Quer seja por via aérea, via terrestre, dentro e fora da província. Não falo de promoções, mas sim de uma prática com um grupo de políticas pro-jovens.
Prezados candidatos presidenciáveis, Daviz Simango, Filipe Nyusi, Mário Muquissinse e Ussufo Momade, e demais partidos extra-parlamentares, os manifestos eleitorais, a campanha, os candidatos, os partidos precisam aprender a Pensar Moçambique como prioridade, como status quo, como pilar, antes e depois das cores, ou seja, Pensar Moçambique without the box.
Homo oeconomicus e Homo politicus
Prezados Candidatos
A radiogradia actual moçambicana não deve ser percebida e analisada fora do ethos comportamental e percepcional do povo. Ou melhor,
As massas funcionam como um barómetro relevante nas questões de governamentabilidade.
O novo por excelência nas memórias colectivas causa estranheza, resistência, e pode causar falta de percepção, mas precisamos entender e aceitar esta nova forma de ser e estar em Moçambique, ou melhor, precisamos perceber este Moçambique pluridimensional, rico pela diversidade e não pelo consenso.
Penso como a actual conjuntura social, económica, política, ou se aceitarem homo oeconomicus e homo politicus, (re)socializaram ou mudaram o ethos do cidadão moçambicano. O desafio reside na maneira como o homo politicus reage a esta mudança e social change (culture change).
O questionar o binómio homo oeconomicus e homo politicus pelas moçambicanas e pelos moçambicanos, fazem parte de uma evolução social, histórica, política, ideologia e cultural normal na actual conjuntura do país.
Em nome do povo precisamos agir de forma cristalina e nobre, pois o povo merece, não só pela bio-política e pelo bio-poder, mas porque sem o povo não seremos nada
Por uma Posição (nós) e Oposição (outros) Tolerantes
Prezados candidatos, vamos fazer um pequeno exercício
Em política e na política, existem duas figuras o Eu (nós) e o Outro (eles), ambos com uma comunicação, com um comportamento, com uma tradição, com uma 'disciplina', com uma cultura do eu perante o outro, alicerçada na percepção do outro como diferente. Procede? Sim. Deveria? Não.
Pois, o eu na teoria, na sociedade, na política, no governo, deveria ter uma obrigação moral com o outro e o outro deveria ter a mesma obrigação com o eu ( Martha Nussbaum). Mas a prática social e cultural entre e o eu e o outro no lugar de ser eu-outro, persiste em ser eu e outro.
O eu e o outro pressupõem uma comunicação ética e empática, enquanto categorias das nossas relações inter-grupais, pois só somos eu e eles porque existe uma relação com o outro, mas, o que acontece quando:
Mas, em política é importante perceber que o lugar do eu e do outro não são tácitos, o eu de hoje pode fluir para o outro e o outro pode fluir para o eu.
A origem do totalitarismo numa sociedade pode estar associado ao emergir de uma política no seio de uma pequena elite, à uma forma de degradação dos direitos dos cidadãos e ao emergir de uma forma de governação associada a uma ideologia de medo, de terror e de silêncio. Direitos humanos, direito a ter direito, liberdade para ser e estar na sociedade e a liberdade de expressão são alguns dos cavalos-de-batalha num cenário de crise de valores e cidadania (Hannah Arendt,).
Sem deixar de lado the psychology of dictatorship, (Fathali M. Moghadam), chama a atenção para esta forma de psicologia com a qual podemos conviver sem ganharmos consciência da mesma, pois, os comportamentos, as atitudes e as práticas que emergem no seio da política e da sociedade em momento de crise e de social change, são responsáveis pelas reacçðes das elites políticas às mudanças e às pressões.
Pode a Posição (nós) e e Oposição (outros) estabelecer uma relação inter-grupal nos diferentes partidos, no parlamento e no governo, baseada num continnuum?
Chamo aqui atenção para a Psicologia do Silêncio instaurada no seio da nossa sociedade. Se falas, és do contra, se falas, és da oposição, se pensas diferente, não és patriota, não és nacionalista, e as redes sociais aparecem neste contexto como uma contra-cultura onde as pessoas encontraram uma fuga ou um espaço de liberdade. Pois, para a Psicologia, é importante que as pessoas tenham um espaço para falar, para serem livres, mesmo que seja no espelho da casa de banho, ainda que este seja aquele espaço único onde podes dar um grito de liberdade.
Que realmente possamos ter um verdadeiro governo inclusivo e sem cores, onde o que deve contar não são as ideologias, mas sim a taxonomia de Bloom, ou seja, saber ser, saber estar e saber fazer com pilares na nossa plural cultura e nossa elástica moçambicanidade.
E mais, não tenham medo de trabalhar com 'vosso inimigo', visto que o importante é o encontro de ideias que ele tem para desenvolver Moçambique, a tal 'construção do consenso'.
[1]O Engraxanço e o Culambismo Português in http://www.citador.pt/textos/o-engraxanco-e-o-culambismo-portugues-miguel-esteves-cardoso
[2] Falar destas duas casas é nostálgico
[3] Infelizmente aqui não há como escrever 'Senhoras e Senhores'
[4] Género, Poder e Gestão do Ensino Superior: os gestores usam calças (masculinidade) e as gestoras usam capulanas (feminidade), 2013.
[5]DHABUNO MUTHABWA: (re)definindo o papel das mulheres no campo político
“As donas da Zambézia, as donas da campanha, as donas das eleições! E donas do pós-15 de Outubro?”
[6] https://ind.millenniumbim.co.mz/pt/Paginas/homepage.aspx