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Carta de Opinião

quarta-feira, 08 maio 2019 05:55

Atravessando a baía com uma mulher maconde

À memória de Faustino Vanomba e Kibiriti Diwane, tombados para sempre na minha cidade

 

À  Biti Akuvava, minha amiga em Mueda

 

Sentou-se levemente no mesmo banco de madeira partilhado por seis pessoas em que uma delas sou eu. Estamos embutidos numa barcaça precária que daqui a pouco vai deixar a cidade da Maxixe, lugar que à noite, visto da outra margem, parece Las Vegas. Está cheio de luzes por todo o lado. Brilha na ilusão de óptica para recompensar a realidade materializada pela vertigem. Maxixe é também pousada do diabo, onde ele se instala amiúde para contar as notas de impulsão sob a guarnição dos punhais  que reverberam por sobre a mesa.

 

É maré vaza, e os bancos de areia ressurgem, entretanto sem a beleza dos tempos, para acolher a sobra dos flamingos  e das gaivotas dizimados pela ignorância e pela fome e pela ganância também. Tudo aquilo é sombrio. Parece uma mulher sáfara. Ou várias mulheres estéris estendidas numa paisagem criada para arrebatar. Não está lá ninguém para a apanha do carangueijo e da ameijoa, varridos pelas mãos e pelos ventos. Aliás em mamas sem leite as crianças não choram. Sabem que não haverá mamada.

 

No interior da embarcação que leva perto de setenta pessoas o silêncio é uma canção que só se ouve por dentro do coração. É um bálsamo leve. Cada um escuta a sua música na escala diatónica insondável. Alguns ouvem as melodias com os olhos fechados, outros dão vazão à vista e absorvem todo aquele espectáculo único dos coqueiros que se erguem na terra, fazendo-me lembrar a fase inicial do filme de Francis Coppola, Apocalipse now. Outros ainda, para a queima do tempo, vão navegando pelo mundo servindo-se  da internet instalada nos seus celulares.

 

Não há golfinhos para nos escoltar como havia antigamente nos tempos da juventude do Mangoba, nem os barcos à vela que passeavam em eternas regatas levando vidas e destinos de um lado para o outro. Esses elementos vitais do paraíso diluíram-se. Os homens já não se encavalitam em ombros cansados de humilhação. Há um êxodo da alma. Faltam os olhares profundos e cansados dos marinheiros que gritavam, em apelo aos passageiros,  Maxixêêêêê! Do outro lado também, as vozes esvairam-se no tempo. Já não ouvimos aquele cantante sewiiiiiiiiiii! Quer dizer, como dizia o poeta, “para cá da porta, nada! Para lá da porta, também nada”!

 

Não há dúvida de que tudo isto é uma metáfora. Parecemos baratas assustadas depois do transbordo, aqui por sobre a plataforma da ponte-cais de Inhambane onde acabamos de ser cuspidos. Somos um cacho que vai-se desfazendo, cada um para o seu ramo onde vai repousar e preparar novo voo. Ninguém sabe o que vai acontecer amanhã. Não há certeza de nada, mesmo com todas as armas que levamos no regaço. Tudo à nossa volta é uma incógnita, como esta mulher que agora comunica ao telefone em liberdade.

 

Ela fala com sotaque de ximaconde. Assusto-me por dentro ao ouvi-la na voz de tenor. Olho para ela, e no lugar das tatuagens que eu podia esperar, sobresaem lindas  sardas cobrindo um rosto jovial. Está no auge da vida. Parece uma gazela longe dos felinos festejando o raiar do sol nas savanas. Faz-me lembrar a Biti Akuvava, antiga bailarina de mapiko agora rendida ao flagelo da idade.

 

A melodia da língua ximaconde embevece. Um maconde falando português, empresta à língua de Camões, também nosso troféu de guerra, uma áurea particular. Parece o próprio mapico a ser dançado por sobre a ponte que une as margens do Rio Tejo. E eu estou aqui, escutando discretamente esta mulher com lindas sardas no rosto. Na cidade de Inhambane. Minha musa.

terça-feira, 07 maio 2019 07:58

Sobre Direitos, Liberdades e Obrigações...

O bom senso é um "elemento central da conduta ética, uma capacidade virtuosa de achar o meio-termo e distinguir a acção" – Aristóteles

 

Noutra definição, diria que “bom senso” é "uma qualidade que reúne as noções da razão e da sabedoria, caracterizando as acções que tomamos de acordo com as regras e costumes adequados para determinado contexto”. Numa época em que muitos de nós descobrimos os nossos direitos, e entusiasticamente usámo-los como sempre com tendências de abusar até que algo drástico aconteça, e começamos a ser mais prudentes. Esquecemos, por exemplo, que todos os direitos têm limites e obrigações.

 

Os Direitos do Homem vêm plasmados nos Livros Sagrados, com maior detalhe no Quran. Contemporaneamente, os Franceses fizeram a primeira Declaração em 1789. Por outro lado, o poder é uma percepção que os outros têm de alguém, de um grupo, de uma classe profissional e ou de um país. A história diz que sempre que esse poder foi usado de forma abusiva, o mesmo lhe fora reduzido ou retirado.

 

Os regimes de África, em particular o de Moçambique, têm vindo a beneficiar-nos de novo de Liberdades e Direitos, que os nossos antepassados já tiveram e que o regime colonial lhes condicionou. Para muitos, em particular os mais novos, as nossas monarquias e outros poderes "tradicionais" eram também respeitadores de direitos e liberdades dos seus cidadãos, obviamente no referido contexto.

 

Enganam-se os que pensam que esse privilégio é uma originalidade do Ocidente. Pelo contrario, os ocidentais, de forma geral, foram os últimos a integrar no seu modelo político-social os Direitos e Liberdades. Porém podemos aprender com a cultura ocidental, por ser aquela que nos está mais disponível, que o ponto de equilíbrio entre Direitos e Obrigações é como o fiel da balança, sempre em movimento a procura do ponto justo. Sendo as sociedades dinâmicas, compreende-se que as mesmas estejam permanentemente em disputa. Convém recordar que os nossos direitos terminam onde começam os direitos de outros. 

 

Inspirou-me partilhar com o caro leitor esta reflexão, porque os nossos políticos e governantes, e de uma forma geral os servidores públicos, usam e abusam da confiança que lhes foi depositada, numa clara violação do contrato social, manifestando falta de qualidades e virtudes, e quando estas aparecem denota-se a ausência de Bom Senso. 

 

Na maioria dos partidos políticos, confissões religiosas (novas), autoridades policiais, magistrados, jornalista, ONGs, ordens profissionais, servidores públicos, associações económicas, entre muitas estas organizações têm um papel decisivo no desenvolvimento das sociedades e, pelo facto, têm um enquadramento legal, com Direitos e Obrigações pelos quais assinam contratos e muitos fazem Juramentos. O abuso dos Direitos e Liberdades fez e fará que os respectivos beneficiários sejam limitados, prejudicando a maioria da classe e a sociedade no geral.

 

Não devemos permitir que um colega de profissão se exceda no uso dessas liberdades sob risco de a maioria ser penalizada. Lembro-me recentemente da tinta que fez correr a condenação pública, através da imprensa irresponsável e sensacionalista, de gestores de uma instituição financeira, que viriam a ser despronunciados ou ilibados pela Justiça das referidas acusações.  Se a imprensa e a comunicação social no geral têm o direito e a liberdade de publicar, os visados têm direito ao seu bom nome e reputação. A forma irresponsável como alguns órgãos de comunicação social prestam um mau serviço de informação ao público, perante o silencio dos demais da classe, fará aquilo que já aconteceu noutros países: penalizar os fazedores da imprensa livre, de forma geral. Esta máxima aplica-se a todas as outras profissões e serviços públicos. Os que exercem o Poder devem utilizar argumentações e atitudes racionais, para poderem fazer julgamentos e escolhas assertivas, de acordo com os usos e costumes da nossa sociedade.

 

Trabalho, ética, conhecimentos e Bom Senso precisa-se...

O recente evento climático ocorrido na zona Centro do país com maior incidência na cidade da Beira, é um exemplo claro da lentidão com que o País caminha para o desenvolvimento sustentável inclusivo. O IDAI, para além das 603 mortes registadas, destruição de diversas infraestruturas, destampou por um lado um debate (antes esquecido) sobre a necessidade de um sistema de gestão ambiental estruturado e funcional. Por outro lado, colocou á prova a capacidade das nossas instituições em lidar com temáticas ambientais.

 

Nesta minha curta reflexão, lanço um olhar crítico sobre a fragilidade das nossas políticas públicas ambientais, encarnadas na perspetiva centralizada o que se reflete na limitação dos governos locais para dar resposta eficaz aos desafios causados pelos desastres naturais e definir estratégias rumo ao desenvolvimento sustentável. Antes porém, é importante mencionar que nas duas últimas décadas, a problemática ambiental e municipal vem sendo abordada de forma conjunta, principalmente porque se supõe que o Conselho Municipal é a autoridade mais próxima da população e também porque é a entidade territorial e demográfica onde é estabelecida de forma directa as relações entre a sociedade e o ambiente. 

 

O caso da Beira, inicialmente caracterizou-se por uma sequência de “conflitos de poder/atribuições” entre/do Município, Governo provincial e Governo central onde pela deficiência da nossa institucionalidade ambiental era visível a limitação do Conselho Municipal em implementar um “plano maestro” da sua autoria e ao mesmo tempo, apoiado pelo marco normativo as grandes decisões para a reconstrução da Beira continuam dependentes do Governo Central. Uma posição que contrária às diversas perspetivas defendidas por especialistas da área, documentos das Nações Unidas, incluindo Valdivieso (2018) que defende que as autoridades Municipais são as que melhor podem dar respostas pós eventos climáticos, já que é a entidade que melhor conhece as necessidades dos Munícipes e a estrutura do seu território, podendo o governo central estar sujeito às propostas desta entidade local.

 

Nesta mesma linha, a Agenda 21 também defende a necessidade da participação plena das autoridades locais no estabelecimento de disposições ambientais e na planificação e execução de políticas nacionais ressaltando a importância dos governos locais na implementação das políticas de desenvolvimento.

 

Com esta reflexão, não pretendo invalidar a grandiosidade das acções que estão sendo levadas a cabo pelo Governo Central desde a ocorrência do IDAI, mas sim alertar sobre a necessidade de uma interação inclusiva e de interdependência entre este e as entidades locais, especialmente numa Cidade como a Beira - com uma longa e reconhecida história de gestão Municipal. O recém-constituído Gabinete de Reconstrução Pós- Ciclone IDAI, não deverá funcionar como um organismo “impositor” emanado de um plano de acção que ignora a perspectiva do Conselho Autárquico para a reconstrução da Beira. A título de exemplo, em países como Chile, propenso a desastres naturais, as comissões de reconstrução são formadas sob uma base local e dirigidas pelo Alcalde (Presidente do Município) da região afectada contando na sua estrutura com membros do Governo Regional e Central como fiscalizadores da acção local. 

 

Ora, se o conceito de desenvolvimento sustentável se refere ao bem-estar social inclusivo, então é importante que se criem condições que possam levar ao alcance dessa meta, e isso passa por estabelecer e assumir o município como a “entidade central”, representativa e mais próxima da população afectada. Sendo esta, a entidade que melhor conhece as necessidades e inquietudes dos seus munícipes, bem como os melhores mecanismos para estabelecer um diálogo eficaz. Não se pode alcançar com êxito um desenvolvimento sustentável inclusivo com decisões de nível global, para problemas locais.

 

Belarmino Augusto Lovane. 

No Dia Mundial da Liberdade de Imprensa celebramos o papel essencial de uma imprensa livre, não só como meio de transmissão de notícias fiáveis e exatas, mas também como pilar da democracia. A qualidade dos processos democráticos está ligada ao estado da liberdade de expressão, bem como à liberdade e ao pluralismo dos meios de comunicação social. Não há democracia sem uma imprensa verdadeiramente livre.

 

Meios de comunicação social livres, diversificados e independentes, que assumem a grande responsabilidade de garantir que as notícias transmitidas ao público são verificadas e corretas, constituem a própria base de uma sociedade aberta e pluralista. O jornalismo de investigação desempenha um papel de fiscalização necessário, que ajuda o público a responsabilizar os governos e as instituições, a todos os níveis, pelas suas ações e obrigações. No entanto, constatamos cada vez mais tentativas para reduzir o espaço de que dispõem os meios de comunicação social livres, sendo também comprometida de forma sistemática a sua credibilidade, e demasiados jornalistas perderam a vida ou colocaram-na em risco por terem exposto verdades inconvenientes.

 

Este ano, a 26.ª comemoração mundial aborda os desafios que os meios de comunicação social enfrentam atualmente nas eleições em tempos de desinformação, bem como o seu potencial para apoiar a democracia, a paz e a reconciliação. A desinformação tem um elevado potencial para influenciar negativamente os processos democráticos e os debates públicos em todo o mundo, e a União Europeia não é exceção.

 

É por esta razão que lançámos o «Plano de Ação da UE contra a Desinformação»(*), que reforça a resposta europeia para aumentar a resiliência das nossas sociedades contra a desinformação. O plano procura melhorar a deteção da desinformação, a coordenação e adesão das ações da União e dos Estados Membros, a mobilização do setor privado para cumprir os seus compromissos, a sensibilização do público e a capacitação dos cidadãos. Uma democracia saudável assenta num debate público aberto, livre e justo e é nosso dever proteger este espaço e não permitir que seja difundida desinformação que alimente o ódio, a divisão e a desconfiança em relação à democracia.

 

A UE está a promover meios de comunicação social livres e justos, não só a nível interno, mas também a nível mundial, nas nossas relações com países terceiros, nomeadamente através do financiamento de projetos específicos que reforcem o jornalismo de qualidade, a liberdade de imprensa e o acesso à informação pública. Com o jornalismo livre sob pressão crescente, a UE reitera a sua determinação em defender a liberdade de imprensa e dos meios de comunicação social dentro das suas fronteiras e em todo o mundo.

 

(*) Alta representante da União Europeia, por ocasião do Dia Mundial da Liberdade de Imprensa (3 de Maio de 2019), que se celebra amanhã.

terça-feira, 30 abril 2019 06:40

Evocando Deus com o corpo à mostra

O membro do júri disse que estavam bem vestidas, por isso deu a nota máxima. Eu esperava o contrário. Uma repreensão. Gravosa. A princípio pensei que fosse ironia. Enganei-me. Era a verdade em si. Ou seja,  alguém privilegiado na cadeira do julgamento exaltava mulheres com partes sensíveis do corpo à mostra, cantando canções Divinas. Ou pelo menos inspiradas na Palavra. Ainda por cima em público. Exultando. Os vestidos não têm mangas. Nem alças. Começam de onde começam os seios, dando liberdade total à imaginação corporal de quem vê aquilo. A parte inferior, para além de ser curta, acima do joelho, liberta uma racha que pode ser perturbadora. Quer dizer, ficamos sem saber se aquelas senhoras estão ali para nos transmitir mensagens do Criador, ou para nos oferecer o espectáculo  da fisionomia.

 

Não estou a dizer que as pessoas estão proibidas de vestir de acordo com as suas vontades. Nem pouco mais ou menos, mesmo sabendo que o  corpo não nos pertence em absoluto. Não estou a dar qualquer dica de como as mulheres devem proceder para respeitar a sua intimidade. O que eu acho é que em determinados lugares e circunstâncias, seria de bom senso que elas examinassem cuidadosamente a sua endumentária. Até porque num festival de  grupos corais, as letras que suportam as canções são  maioriatariamente inspiradas na Bíblia. Evoca-se Deus nesses eventos, e Deus merece todo o respeito e vénia, mesmo ao nível das roupas que vestimos.

 

Mónica Malambique, minha vizinha, bebia ao nível dos alcoótras. Era  fumadora inveretada. Ia à Igreja todos os domingos glorificar à Deus, exalando os cheiros da bebida e do tabaco, incomodando quem estivesse perto de si. Um dia uma amiga, farta de tudo aquilo,  disse-lhe assim, Mónica, achas que Deus pode esvaziar-se em ti com os cheiros emanados dessas porcarias que andas a consumir? Nesse estado, minha irmã, estás a perder o teu tempo, a tua vinda para aqui é vã.  

 

Na verdade o Altíssimo não habita onde há cheiros de vícios. As mensagens de Deus também, quando transmitidas por uma mulher vestida de determinada forma, podem perder o  valor, por mais bela que seja a voz. Quer dizer, de um ser feminino trajado daquela maneira, mesmo cantando parábolas celestiais, eu não sei se Jehová vai-se aproximar.  Pode ser ainda verdade que tudo isto seja uma má imitação de outras terras e de outras culturas, como aqueles que obrigam as negras a emagrecer para participarem numa passagem de modelo, quando é dado irrefutável que a elegância da negra está na fartura de carnes.

 

Mas tudo isto pode significar que estamos em delírio. Senão as mulheres não seriam consagradas  bispas e autorizadas a subir ao altar para proferir sermões, com  os homens a escutarem cabisbaixos, quando Deus determinou que a cabeça da mulher é o homem. E se assim é, como é que uma mulher vai pegar na bíblia para orientar o povo? Isso no mínimo é um vitupério. Por isso não admira que essas mesmas mulheres vão aos concursos corais vestindo mini-saia. Ainda por cima para cantar a Bíblia. E todos nós batemos palmas.

(outro prisma sobre o IDAI)

 

O ponto de partida para que quase todos os quadrantes do mundo, hoje, preocupem-se com o meio ambiente, foi a Revolução Industrial ocorrida no final do século XVIII. Com a evolução da indústria na diáspora europeia, coadjuvada pela frenética pressão das ideias liberais e de acumulação do capital, abriu-se um precedente na história da deterioração dos ecossistemas pela acção humana. A contaminação de rios e do ar por poluentes; o despejo de produtos químicos nocivos; o smog em Londres, conhecido como "a névoa matadora" e, mais à frente, os bombardeamentos atómicos das cidades de Hiroshima e Nagasaki, realizados pelos Estados Unidos contra o Império do Japão; foram acontecimentos que, pela magnitude do seu impacto, fizeram brotar a consciência sobre a necessidade de se assumir uma forma de estar dos países sem, no entanto, prejudicar as gerações vindouras. 

 

Houve entre os anos 1970 e 1990 uma série de acordos, convenções e leis, que surgiram com a finalidade de tornar o crescimento económico menos nocivo ao meio ambiente. Este assunto beliscou atenção de ambientalistas como Rachel Carson e da comunidade científica que preocupada com único objecto de estudo (meio ambiente), concluiu que o principal factor da deterioração da atmosfera é a acção humana com foco na industrialização. Ela é responsável pelo acelerado aquecimento do planeta dada a alta concentração de gases do efeito estufa – dióxido de carbono (CO2), metano (CH4) e óxido nitroso (N2O). A grande herança destas acções nocivas foi a destruição da camada de ozono que traz os perigosos raios ultravioletas do Sol que atingem a superfície da Terra. Acções nocivas dos países do ocidente tiveram impactos sobre o meio ambiente em solo africano. Evidências mostram que, sendo África o continente que se localiza nos dois principais hemisférios, quer a destruição do ozono, quer a o agravamento do efeito estufa, têm impactos directos sobre sua temperatura e afectam a saúde, o meio de vida, a produtividade agrícola, a disponibilidade de água e a segurança geral do povo africano. Sobem os níveis do mar pelo aquecimento global e, por conseguinte, ocorre a erosão costeira. As secas, o stresse causado pelo calor e as enchentes levaram à redução da produtividade nos campos de cultivo e na pecuária. As doenças trazidas pelo aumento da temperatura,  ilhas de calor e pela baixa qualidade do ar. Estes problemas causados à agricultura e pecuária por conta da agressão aos ecossistemas pelo ocidente abriram outro precedente em África. Os povos africanos, sobretudo os rurais, passaram a exercer maior pressão sobre o meio como queimadas descontroladas à busca de alternativas de subsistência. Isto pressupõe que os fenómenos atmosféricos que assolam África pela sua vulnerabilidade, não teriam igual impacto se os países ocidentais industrializados não tivessem indiscriminadamente agredido o meio ambiente ao longo da história. 

 

Sucede que várias conferência já foram realizadas sobre o meio ambiente e desenvolvimento. Desde o “Eco-92” ao COP21, os países industrializados vem prometendo ressarcir aos países de economias periféricas pela noção do impacto das suas acções sobre os estados afectados sem quaisquer culpas. A Agenda 21 que estabelece a pertinência de cada país comprometer-se a refletir, global e localmente, sobre a forma pela qual organizações e todos os sectores da sociedade poderiam encontrar soluções para os problemas ambientais, não mereceu o devido respeito se observarmos o que a história registou enquanto atitude por parte de quem realmente tem obrigações. Os países do "primeiro mundo" não ressarciram os periféricos. As acções observadas, mais do que serem insuficientes e incomparáveis às enxurradas de doações à Notre-Dame que quase se engasga pelo entulho pecuniário, quando deviam ter um carácter de cumprimento de obrigação, vestiram traje de filantropia. A honestidade intelectual manda dizer que Moçambique é parte integrante dos povos afectados pelas acções dos países ocidentais industrializados. Recentemente, em Março de 2019, Moçambique foi violentamente atingido pelo ciclone IDAI que se mostra até hoje com sinais indeléveis. Das reacções vindas do exterior, sobretudo dos países industrializados, tiveram na íntegra uma catalogação altruísta. A honestidade, justiça e “desbranqueamento” da história não foi tão forte ao ponto de nenhuma força externa ter feito menção ao cumprimento de dever. 

 

Ora, este tratamento dividiu opiniões na esfera pública. Uns prestaram vénia à atitude e outros como o escritor angolano José Agualusa assumiram tal atitude como algo que não estivesse além das obrigações dos países industrializados. Uma espécie de reconciliação com a história. É precisamente esta posição de Agualusa com qual me identifico, a dívida ocidental que nunca foi paga à “plebe” e o injusto “ruído” da filantropia.

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