Moçambique vive um cãos político e social, bem como um cenário de violência e brutalidade policial contra os cidadãos indefesos, nos últimos dias, em particular, desde o bárbaro assassinato do advogado Elvino Dias e de Paulo Guambe, mandatário do Partido PODEMOS, na cidade de Maputo, na madrugada do dia 19 de Outubro corrente, num contexto de crise político eleitoral, aliás, considerado de excessivamente fraudulento por vários actores políticos, sociais e em especial pelo povo, concretamente os jovens e grupos mais pobres da sociedade moçambicana.
Sem vergonha, nem ética profissional e respeito pela dignidade humana que deve caracterizar a Polícia da República de Moçambique (PRM) e as Forças de Defesa e Segurança (FDS), a Polícia está, intencionalmente, de forma recorrente e firme, a praticar execuções sumárias, ameaças, agressões físicas, detenções arbitrárias, baleamentos, com recurso a armas de fogo e uso de gás lacrimogéneo contra os cidadãos indefesos, independentemente de se tratar de manifestantes ou de estarem em situação de manifestação contra os resultados eleitorais e contra o hediondo homicídio do advogado Elvino Dias e de Paulo Guambe, respectivamente, mandatário do candidato às eleições presidenciais, Venâncio Mondlane, e mandatário do Partido PODEMOS.
Simultaneamente, os manifestantes do Partido no Poder, a FRELIMO, nas suas marchas de celebração da alegada vitória eleitoral, gozam, não só de plena e forte protecção das instituições da Administração Pública e da justiça, como da forte e incondicional protecção policial. Em bom rigor, a Polícia até usa balas verdadeiras e envereda pelo uso desproporcional do gás lacrimogéneo para dispersar e afugentar os filhos “ilegítimos” de Moçambique, o povo pobre e vítima da má governação que contesta os resultados eleitorais e os assassinatos supra referidos, para não atrapalharem a celebração dos alegados vitoriosos destas eleições gerais, a FRELIMO e seu candidato à Presidência da República, conforme ficou evidente no passado fim-de-semana, com destaque para sábado, dia 27 de Outubro corrente, sobretudo no Distrito de Mecanhelas, na Província do Niassa.
Em menos de uma semana a Polícia exibiu e praticou em demasia a violência e brutalidade policial, sem qualquer tipo de impedimento ou de chamada de atenção por entidade competente, seja de sua gestão ou direcção, seja da fiscalização interna e externa da sua actuação.
Mais do que isso, é que a Polícia avisou, publicamente, que vai repelir qualquer tentativa de manifestação e decretou tolerância zero contra o exercício da manifestação, o que veio a acontecer. Mas nenhuma instituição de justiça tugiu ou mugiu para impedir qualquer acto de barbaridade contra os cidadãos ou violação dos seus direitos e liberdades fundamentais. Curiosamente, a prática ensina que repelir e tolerância zero para a Polícia significa violência e brutalidade policial que se traduz em execuções sumárias, ameaças, agressões físicas, detenções arbitrárias, baleamentos, com recurso a armas de fogo e uso desproporcional de gás lacrimogéneo contra os cidadãos indefesos.
A PRM e as FDS violentam e brutalizam os cidadãos em geral, com a excepção dos “cidadãos” da FRELIMO, perante inércia tanto das instituições de justiça, como da direcção desses órgãos de Polícia e segurança do Estado, com destaque tanto para o Presidente da República, na qualidade de Comandante-Chefe das Forças de Defesa e Segurança e garante da Constituição da República, por um lado, como para o Ministério Público, enquanto garante da legalidade e detentor da acção penal, em especial em crimes públicos como os praticados pela Polícia. A Comissão Nacional dos Direitos Humanos e o Provedor de Justiça são as outras instituições relevantes que devem, dentro das suas atribuições e competências legais, tomar posições sérias e agirem de forma firme, contundente e urgente contra a actuação da Polícia.
Se assim aconteceu e está a acontecer, então o presente artigo coloca as seguintes questões: Quem controla os agentes da PRM e FDS para actuarem dentro do quadro constitucional em vigor em Moçambique? Quem efectivamente responsabiliza a PRM e FDS pela violência e brutalidade policial contra os cidadãos? Será que a resposta está a ser empurrada para a prática da justiça popular ou justiça pelas próprias mãos?
Portanto, parece que se está perante um Estado Polícia em que a PRM e as FDS controlam o Estado a seu bel-prazer e se sobrepõem a quaisquer outros do Estado, incluindo os órgãos de justiça, nomeadamente o Ministério Público e os Tribunais que demonstram temor reverencial em responsabilizar a polícia pela violação dos direitos, liberdades e interesses legalmente protegidos dos cidadãos.
Por: João Nhampossa
Human Rights Lawyer
Advogado e Defensor dos Direitos Humanos
Jurisconsulto em Litigância de Interesse Público
Ao segundo segundo dia de paralisação geral, manifestações e confrontos entre populares e as unidades de Intervenção Rápida (UIR) e de protecção da Polícia da República de Moçambique - Maputo, Matola e outras cidades capitais do país sofreram um apagão no serviço de internet móvel. O apagão ocorreu ao princípio da tarde de ontem, sexta-feira (25), e prevaleceu para além das primeiras horas de hoje, sábado, no fecho desta edição. O serviço foi restabelecido ao nascer de um tímido sol desta esta manhã. Subitamente. Tal qual foi desligado, por ordem política.
O facto de haver concorrência para o cargo de Prresidente da República significa o reconhecimento implícito do pluralismo político no país. O pluralismo, na sua essência, não significa que quem pensa diferente é, por inerência, contra os outros. Significa apenas que essa pessoa tem desejos e anseios diferentes, mas que têm o bem comum no centro das suas preocupações. A diferença de opinião é, no fundo, a celebração da força vital que percorre as veias de Moçambique e faz do país um espaço verdadeiramente histórico, isto é um espaço de aprendizagem, de mudança de opinião e de adaptação. É frágil toda a nação que depende da unanimidade para justificar a sua existência.
Levou muito tempo para entendermos a importância do reconhecimento do pluralismo. Na verdade, o reconhecimento é apenas formal. Ainda falta muito para interiorizarmos a sua importância para o devir do país. A forma como a Luta de Libertação foi narrada produziu no imaginário dos principais actores políticos não só a ideia de que a unidade de propósitos era crucial para se lograr a independência como também alimentou o sentimento de que pensar a independência de forma diferente era pôr em causa o próprio projecto de independência. Joana Simeão e Uria Simango são alguns dos exemplos mais destacados de moçambicanos que pagaram com a sua vida o preço dessa narrativa.
A abertura formal do sistema político não mudou significativamente esta maneira de pensar. A polarização criada pelas circunstâncias em que se chegou à abertura do sistema político fez com que todas as forças políticas continuassem a privilegiar uma narrativa política alicerçada na ideia de que quem não está connosco, está contra nós. Parte da criminalização do Estado que caracteriza Moçambique hoje explica-se desta maneira. Foi porque a governação foi cada vez mais vista não apenas como gerir o país, mas sim como gerir o país de modo a impedir que qualquer outra força política algum dia cheirasse o poder. As redes neo-patrimoniais que isso alimentou não tinham necessariamente como objectivo garantir o assalto privado aos recursos públicos. Tinham como objectivo concentrar tudo nas mãos daqueles que se consideravam – na verdade, que se consideram – os únicos com legitimidade para governar o país no melhor interesse de todos.
Daí que parte da sua estratégia política tenha também consistido no enfraquecimento da oposição. O uso consequente da força da lei para limitar os movimentos da oposição, o abuso da maioria parlamentar para ignorar os pontos de vista da oposição, a inviabilização económica e financeira da oposição através da concentração dos recursos do Estado no partido no poder, tudo isto configurou um cenário parecido com uma estratégia consciente de trivialização do pensamento diferente. As únicas concessões feitas foram as que se tornaram necessárias para não levar a oposição – sobretudo a oposição armada – ao abismo do desespero como aconteceu amiúde com o malogrado líder da Renamo.
É neste contexto que o Artigo 74 (Partidos políticos e pluralismo) se reveste de muita importância. Ele contém duas disposições: 1. Os partidos expressam o pluralismo político, concorrem para a formação e manifestação da vontade popular e são instrumento fundamental para a participação democrática dos cidadãos na governação do país; 2. A estrutura interna e o funcionamento dos partidos políticos devem ser democráticos. A primeira disposição constitui não só um reconhecimento do próprio pluralismo como também é uma instrução para que quem governa o faça com atenção para o facto de que as pessoas que nele votaram são apenas uma parte do pensamento diverso que faz o nosso país. A implementação prática dessa instrução consiste em criar condições para que as decisões governamentais beneficiem sempre da assessoria que a crítica que vem da oposição presta. Consiste também na integração da oposição no Estado – não por via de postos diplomáticos – mas sim por via de responsabilidades de gestão de instituições públicas. Acima de tudo, a implementação requer que quem governa abandone o hábito nutrido pela Frelimo de criar grupos de choque na esfera pública, cuja única função é implicar com que diz o que pensa.
Só é guardião da verdade encontrada na constituição quem está aberto ao pensamento diferente e sabe nutri-lo.
O “loose cannon” voltou a disparar. Nesta semana, o venancismo convocou novas “manifs” para repudiar o cruel assassínio de Elvino Dias e Paulo Guambe, atingidos os dois por 25 balas no conjunto, faz hoje uma semana. Depois da violência de rua desta quinta-feira, VM7 reafirmou, a partir de lugar desconhecido, que sua meta são 25 dias de “manifs”, com a consequência nefasta da paralisação da vida económica e social nas principais cidades de Moçambique. Sua mensagem, disse ele, visa também denunciar as eleições fraudulentas e a perfídia da classe política.
O grande dilema de Venâncio é a escolha do estilo da sua acção política, designadamente a opção entre uma postura de Estado, mais comedida e cuidadosa perante o desiderato da protecção das propriedades pública e privada, num movimento de moderação do seu radicalismo; e uma postura dita revolucionária, de luta sem quartel, quase espalha-brasas, arregimentando toda a sua falange de apoiantes, maioritariamente jovens marginalizados e sedentos de emprego e pão.
Para VM7, abraçar agora uma postura de Estado contrasta com sua determinação de tomar o poder já. Mas há quem pense que, diante da presente conjuntura eleitoral, ele podia orquestrar um recuo estratégico, táctico, pois parece quase certo que suas possibilidades de sucesso nas próximas eleições são enormes – tal como fez Adalberto Júnior, o líder da Unita em Angola. Mas VM7 não está disposto a esperar; ele quer tudo já. Por isso, ele optou pela “revolução” urbana.
O problema desta postura dita revolucionária é que ela arrasta o intolerável da destruição da economia e da propriedade privada. Por mais que VM7 convoque manifestações pacíficas, apenas de cartazes em punho, o mais provável é surgir juventude pronta para queimar pneus, afrontando de peito aberto uma Polícia debilitada na sua moral, esfomeada ela também, mal equipada, mas pronta para matar e não proteger. Uma revolução com este pendor de violência diminui o carácter messiânico da sua jornada política. Seus apelos a “manifs” pacíficas não estão a surtir efeito. E com a violência agora subjacente, ele perde o apoio de boa parte do pequeno e médio empresário e das classes médias urbanas também sedentas de mudança e alternância democrática, mas num registo de paz e serenidade.
O grande paradoxo destas “manifs” de VM7 é aquilo que é chamado de “o paradoxo do pão”. O pomo da reivindicação é, simplificando, a falta de pão em todas as casas marginalizadas da moçambicanidade. A rapaziada venancista reivindica pão nas suas casas, mas, no êxtase da revolta, destrói a cadeia de fornecimento desse mesmo pão que lhe dará forças para, no dia seguinte, enganar novamente o estômago para responder aos apelos do venancismo. Na “manif” de quinta-feira, industriais da panificação em Maputo foram severamente afectados, reduzindo as entregas; e na manhã de sexta-feira, revendedoras de pão nos bairros, que também foram vandalizadas e roubadas, imploravam para que recebessem remessas de pão nas suas bancas para revenda. E é provável que ontem, sexta-feira, a “manif” tenha perdido gás porque boa parte da rapaziada acordou sem pão em casa.
Isto significa que a meta das 25 “manifs” de VM7 é uma miragem. Isso nunca vai acontecer. Sua revolução não tem estrutura logística para manter seus apoiantes tanto tempo na rua. Aliás, eles dependem de haver comida para a barriga. Com a vigência da vandalização da economia, o pão desaparece das mesas. E ninguém faz luta de barriga vazia. Ou seja, as “manifs” só terão sangue nas veias se a economia funcionar. Tal como no rescaldo das autárquicas: VM7 queria tanto estender suas “manifs” por longos dias, mas a Renamo tirou-lhe o tapete, e ele perdeu seu élan reivindicativo.
Por outro lado, o sumiço de VM7 é, ele próprio, desmobilizador. Tradicionalmente, grandes líderes revolucionários não somem para esconderijos insondáveis, mesmo após um golpe fatal na véspera. Um bom líder acusa o golpe, mergulha no pranto, mas logo a seguir enxuga as lágrimas e enfrenta novamente o inimigo.
O sumiço de VM7, mesmo depois ter sido ostensivamente visado por invólucros de gás lacrimogéneo na sequência imediata do assassinato de Elvino Dias e Paulo Guambe, não caiu bem em círculos que o apoiam, nomeadamente entre franjas da classe média urbana zangadas com a Frelimo, e que preferiam que ele continuasse dando o peito às balas até às últimas consequências. Daí decorre a questão de saber se ele vai fazer a mobilização das 25 “manifs” refugiado em “parte incerta”.
Por outro lado, o corte da internet ontem foi um golpe profundo no seu principal vector de comunicação e mobilização. O regime de Nyusi, nos derradeiros dias da sua decadência, está disposto a ir até às últimas consequências para cortar-lhe as pernas.
O país está polarizado entre o radicalismo de Venâncio e a autocracia do martelanço de Filipe Nyusi, que atribuiu esta estonteante vitória eleitoral aos alegados feitos do seu segundo mandato, desastroso tal como o primeiro. O radicalismo do regime evidenciou-se também na forma tenebrosa como suas tropas atiraram contra os manifestantes, matando e ferindo sem contemplações.
Como disse, o regime parece pronto para ir até às últimas consequências para se manter no poder. A relutância da CNE em averiguar as incongruências do processo de votação – que ela própria identificou – não permitindo a transparência nas etapas cruciais do apuramento, enquadra-se nesse radicalismo. Esta polarização entre o campo de VM7 e a ala Frelimista de Filipe Nyusi repercute-se também na sociedade e até nas famílias, nomeadamente nos grupos de WhatsApp. O país está profundamente dividido.
Então, o que fazer diante desta polarização extrema?
A nosso ver, as principais confissões religiosas têm agora uma oportunidade para mostrar seu serviço em prol da defesa do povo moçambicano, promovendo o diálogo entre as partes. Tanto a Frelimo como o VM7 têm de assumir que, se o radicalismo prevalecer, quem perde não são seus egos, mas a totalidade da Nação. Isso significa que o movimento de moderação tem de ser assumido pelos dois campos; não se pode exigir que VM7 modere seu radicalismo sem que a Frelimo também mostre uma abertura para a mudança.
Mas que “quid pro quo” é razoável para VM7 “baixar a bola”? Um Governo de Unidade Nacional? Duvido que esta Frelimo tenha a maturidade do ANC para enxergar longe e assumir que é preciso abrir mão de parte do excessivo poder que exerce sobre o Estado e a sociedade, perpetuando seu monopartidarismo numa democracia encapotada.
No entanto, na quinta-feira, na sede do partidão, diferentemente da narrativa fraudulenta de Nyusi, que agora recorre sempre à metáfora do jogo de futebol para falar de uma competição eleitoral com arbitragem proveniente das suas hostes, Daniel Chapo recuperou a velha perspectiva da inclusão, de que a Frelimo sempre falou, mas aplicou de forma hesitante, minimalista.
O grande desafio para a Frelimo (e para Chapo) é começar já a revelar em que consiste tal inclusão, quais os seus verdadeiros indicadores; se ela envolve apenas o alargamento do tachismo a uma meia dúzia de políticos da oposição, através da distribuição de cargos no sector empresarial do Estado; Ou se isso envolve a mudança da política.
A luta de VM7 – e é aí onde ele busca a força motriz do apoio popular – não é por tachismo...é uma luta contra as desigualdades e contra todo o laxismo e corrupção desenfreada que tem conduzido celeremente Moçambique ao abismo. Uma inclusão deve envolver reformas políticas profundas, uma partilha programática que muda radicalmente o estado caótico da gestão do bem público. Sem isso, nada feito!
Entraram na cidade com pólvora e chumbo e balas, cantando canções jamais ouvidas debaixo das luzes fluorescentes. Traziam consigo a euforia e o entusiasmo, e ainda o sangue quente da morte e da vontade de vencer. Vibravam, por dentro e por fora, como se a guerra tivesse chegado ao fim para que a paz prevalecesse. Mas as armas, embora repousadas à tiracolo, diziam outra coisa. Continuavam com os carregadores cheios e os dedos suados dos guerrilheiros, tremiam muito perto dos gatilhos. Sendo assim, significa que alguma coisa vai acontecer logo a seguir, mas ninguém foi capaz de ler os sinais, e fazer algo para evitar que o sangue voltasse a jorrar nas matas e nas estradas.
Cantávamos todos em harmonia. Em júbilo. Em celebração. Sob batuta de Samora Machel que ia à frente e dizia, “tiyendi pamodzi (vamos juntos)! E na verdade seguimo-lo, enchendo estádios e praças e todos os lugares por onde passasse, sem saber que onze anos depois de anunciar a vitória no vale do Infulene, num diz de chuva branda, ininterrupta, ele, o Samora, apagar-se-ia para sempre.
Depois o tiyendi pamodzi esvaziou-se e, em vez de continuarmos a ir juntos ao encontro da luz, com a vitória agarrada nas mãos de todos, os companheiros de Samora separaram-se de nós. Corremos na mesma pista da maratona mas quem chega são eles. Fumamos a mesma cannabis mas quem apanha o voo são eles. Estão felizes como os animais da selva, quando morreu o leão que rugia nos palanques da realeza. Estão grávidos de dinheiro e fartura. Esqueceram-se dos milhões de braços e, mais do que construírem uma pátria deles à parte, venderam o país inteiro, que é de todos nós.
É verdade! Está a anoitecer outra vez, para que se dê lugar ao piar dos mochos e ao triunfo dos demónios. No fundo nunca amanheceu na nossa terra, para além dos poucos dias que se seguiram ao desfraldar da bandeira que alimentava as nossas utopias. Fomos dados o cheiro da liberdade, mas quase no mesmo dia começaram a ser construídas novas masmorras. Deceparam-nos as asas. E agora estamos a verter novamente o nosso sangue na luta pela regeneração!
Mas é mentira, eles estão com medo de nós os pobres. Sabem que a nossa luta é irreversível. Sabem também que estão entre rios que avançam imparáveis contra os seus falsos baluartes. Não dormem nas noites de insónias onde as vozes do povo ecoam cantando as canções da nossa luta, “povo no poder! Povo no poder!
Estão abalados. Sabem muito bem que chegou a hora de repetir a metáfora de Samora Machel, “se o fruto não cai por si, é preciso abanar a árvore”. É por isso que nos matam. Mas todas as armas que têm e usam, serão em vão. O dia deles chegará como as ondas que não voltam para trás!
O sinal da derrota deles é esse, são as mentiras. São as sementes do terror que semeam em todo o lado. Mas, como rezam as páginas da história universal, desde antes do nascimento de Jesus Cristo, quem semeia ventos colhe tempestades. É infalível. Eles colherão, na safra da sua saga, as pedras que continuam a semear. Então, nesse dia, será proclamada a derrota vergonhosa dos heróis. E içada a nossa nova bandeira.
O número nove decorre da data das eleições, 9 de Outubro de 2024. No texto, e em jeito de contributo, algumas notas sobre o processo eleitoral do país tendo como meta eleições livres, justas e transparentes.
1. Apelos públicos: foram vistas várias personalidades de relevo a fazerem, e têm feito a cada pleito, pronunciamentos públicos a sensibilizarem o cidadão para que este se recenseie e vote. Nestes apelos, deviam dedicar algum tempo a gestores do processo eleitoral, incluindo os Membros das Mesas de Votos (MMVs), para que pactuem com a ética, transparência e integridade em todo o processo eleitoral. E que nos pronunciamentos abranjam também o apuramento e a validação dos resultados. Neste campo, as confissões religiosas, por serem um promotor e garante dos valores éticos e morais deviam ter um papel mais activo, sobretudo na sensibilização das respectivas comunidades, destacando para os seus eventuais membros que participem na gestão do processo eleitoral.
2.Campamha eleitoral: é triste a ῎sujeira eleitoral῎ feita decorrente da afixação de material de campanha nas urbes e não só. Para contornar, seria importante que se criassem regras, sobretudo quanto aos locais e materiais que devem ser usados, evitando assim que a ῎sujeira eleitoral῎ não se repita. Ademais, o financiamento para a campanha devia ser dividido em três partes, sendo a última condicionada à limpeza ou retirada da via pública do material usado na campanha pelos próprios protagonistas.
3.Horário de funcionamento das urnas: o horário oficial de 11 horas (07H00 – 18H00) de funcionamento das urnas constitui um obstáculo, incluindo o de arrastar o processo de votação e apuramento pela noite dentro e por mais de 24 horas. Seria prudente e vantajoso que fosse revisto para oito horas (06H00 – 14H00).
4.Publicação dos editais: não faz muito sentido o apelo para ῎votar e ir para casa῎ e o resultado da votação ser apenas afixado na parede da assembleia de voto do recinto de votação. A prevalecer este apelo recomenda-se o mesmo referido pela Missão de Observação da União Europeia: que a publicação dos editais também seja feito na internet e em tempo útil.
5.Acusações de incitamento à violência: a vulnerabilidade e a falta de integridade e transparência do processo eleitoral, sobretudo na sua fase crítica - a votação e apuramento de resultados - também devia constar do rol das acusações do Ministério Público como incitamento à violência. Alcançar o que dita o slogan da Comissão Nacional de Eleições - Por Eleições Livres, Justas e Transparentes – pode constituir um grande contributo para que não hajam tais acções de incitamento à violência, saindo assim do léxico eleitoral em Moçambique.
6.Justiça pelas próprias mãos: os que se sentem lesados pelos resultados do apuramento eleitoral, ora acusados de recurso a meios considerados de incentivo à violência, são também parte de uma sociedade em que o cidadão comum não espera pela intervenção das autoridades diante de um acontecimento ou algo que o lese ou cause danos. As causas para o efeito são conhecidas, sendo a falta de confiança nas instituições a mais apontada. Resgatar ou criar esta confiança é um caminho.
7.Recensear e não votar: causa muita estranheza que boa parte do eleitorado se tenha recenseado e não tenha ido votar. Caso para perguntar: o que leva um cidadão a iniciar a sua participação (recenseando) e não a concluir (Indo votar)? Uma franja de analistas argumenta que estes não enxergam a utilidade e benefícios do voto. Há também quem diga que o interesse é mais o de acesso a um documento de identificação – o cartão eleitoral – e que o habilite a outros direitos ou benefícios na sociedade. Urge reflectir.
8.Nível de participação: o nível de participação/aderência dos eleitores no dia de votação constitui um forte sinal da mensagem que o eleitorado queira transmitir. Infelizmente este indicador (o nível de participação) não é manchete e nem abre o telejornal. Urge que se façam estudos sobre este assunto, o que também passa por haver desagregação de informação sobre quem vota (jovens, mulheres, adultos, idosos, etc) cuja fiabilidade dos dados requer o que tem faltado nas eleições do país: eleições livres, justas e transparentes.
9.Benefícios do direito de votar: tenho ouvido que ῎desta vez não vou votar῎ ou mesmo que ῎não vejo nenhum benefício em votar῎. Eu voto desde as primeiras eleições e não porque tenha escolhas entre os candidatos, mas, e sobretudo, porque acredito, e é um benefício, que as eleições são o meio mais justo para a conquista do Poder. Descredibilizar este processo, incluindo o não ir votar, abre espaço para que a conquista do poder seja por outros meios. Uma saída é tornar a votação massiva, sendo este desideracto, ora em falta, um ingrediente essencial para a consolidação democrática no país.
PS.Este texto foi escrito antes do bárbaro assassinato do advogado Elvino Dias, assessor jurídico do candidato presidencial Venâncio Mondlane, e do mandatário nacional do partido que o suporta, o Podemos. Junto-me às vozes que condenam o acto e no apelo que se faça a justiça e de forma célere.