O Orçamento do Estado (OE) moçambicano para o próximo ano não prevê aumentos para os funcionários públicos e antevê um crescimento económico de 5,5 por cento, disse o vice-ministro da Economia e Finanças, Amílcar Tivane.
“Criámos provisões no OE para o Governo gerir a política salarial, mas pretendemos assegurar a estabilização da massa salarial”, disse Amílcar Tivane, em entrevista à Lusa em Marraquexe, à margem dos Encontros Anuais do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial, que decorreram semana finda em Marrocos.
“Já fizemos aumentos substanciais para classes com rendimentos médios e esperamos ter devolvido poder de compra, não prevemos aumentos significativos em 2024”, disse o vice-ministro, na semana em que o Conselho de Ministros aprovou o documento que será debatido na Assembleia da República até Dezembro.
Segundo o governante, “a decisão sobre um aumento pode ser feita, mas os aumentos não devem desviar a trajectória da massa salarial”, que Moçambique quer manter no nível em que está.
O cenário macroeconómico aponta para um crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de 5,5 por cento, mais 0,5 pontos que a previsão do FMI, que estima uma expansão económica de 5 por cento em 2024, com a dívida pública a consumir quase metade da receita fiscal.
“A meta de 5,5 por cento está em consonância com os progressos que temos visto no sector extractivo, em particular no gás natural liquefeito, mas não é induzida apenas pelas dinâmicas do sector do gás, há também sectores como a agricultura e a indústria transformadora”, disse Amílcar Tivane, admitindo que, apesar do crescimento económico, a dívida continua a ser um dos principais problemas do país.
Segundo o vice-ministro, o Governo dedica “um pouco mais de 40 por cento da receita fiscal ao serviço da dívida, que cresceu muito e absorve uma proporção cada vez maior do que é o espaço fiscal que devia ser canalizado para investimentos no desenvolvimento do país, e daí o esforço de consolidação” que é preciso assegurar.
“O Orçamento está estruturado para perseguir os objectivos de política económica e social do Governo, fundamentalmente a criação de condições de incremento de espaço fiscal para apoiar investimentos que possam acelerar o ritmo de recuperação da economia moçambicana, que foi flagelada por múltiplos choques nos últimos anos”, concluiu Amílcar Tivane, salientando que as medidas de consolidação orçamental serão feitas principalmente do lado da despesa.
Refira-se que os estados membros do FMI concordaram em aumentar as suas contribuições e em dar a África um terceiro assento no seu Conselho Executivo, anunciou no sábado o Fundo Monetário Internacional em Marraquexe, Marrocos.
Os responsáveis do FMI instaram os seus membros a aumentarem o financiamento das instituições, para que possam apoiar melhor os governos na luta contra a pobreza e as alterações climáticas.
“Unimo-nos sobre a importância de impulsionar o crescimento inclusivo e sustentável, avançando nas nossas agendas climáticas e digitais. Mantemos um forte apoio aos esforços para resolver as vulnerabilidades da dívida. Comemoramos o encerramento da lacuna de financiamento do Fundo para Redução da Pobreza e Crescimento para continuar ajudando os membros mais vulneráveis”, disse Nadia Calvino, Presidente do Comité Financeiro e Monetário Internacional (IMFC).
Estes pontos estavam entre os objectivos declarados das reuniões anuais do FMI e do Banco Mundial, que terminaram ontem, domingo. Actualmente, a distribuição de quotas favorece as economias avançadas, particularmente os países europeus, em detrimento dos grandes países emergentes, liderados pela China e pela Índia, que há vários anos apelam a uma reforma do sistema.
Mas embora os países ocidentais digam que, em princípio, estão abertos à ideia, na verdade estão relutantes, temendo que o papel da China no FMI seja reforçado.
“É hora de solidariedade. Mas a solidariedade, quando há tanta tensão, é difícil de construir. E ainda assim conseguimos fazê-lo. Estamos a terminar as nossas reuniões com quatro objectivos que estabelecemos para nós próprios antes das reuniões, todos alcançados”, concluiu Kristalina Georgieva, Directora-Geral do FMI.
Embora a distribuição dos votos não tenha sido alterada, o FMI concordou em expandir o seu Conselho de 24 para 25 membros, para dar um assento adicional à África, que até agora detinha dois. As reuniões realizaram-se no continente africano pela primeira vez desde 1973. (AIM)
O retalhista de produtos alimentares SPAR Group (SPPJ.J) está a explorar a possibilidade de importar ovos de vários países da África Austral, numa altura em que o pior surto de gripe aviária na África do Sul atinge o abastecimento de ovos e ameaça o fornecimento de carne de frango. Todavia, o sector privado nacional diz não ter capacidade de satisfazer a demanda da África do Sul.
A África do Sul enfrenta actualmente um surto de gripe aviária de alta patogenicidade (GAAP), uma gripe aviária que se espalha rapidamente num bando infectado, causando uma elevada taxa de mortalidade, noticiou há dias a Reuters. De acordo com a agência de informação, os produtores alertaram sobre a escassez de carne de frango, depois que milhões de frangos foram mortos pelo surto.
Enquanto isso, o grupo SPAR está a trabalhar em estreita colaboração com seus fornecedores e parceiros para garantir o stok e também a colaborar activamente com os maiores fornecedores e a explorar novas oportunidades para garantir um fornecimento consistente de ovos e reduzir ainda mais o risco.
“Esta estratégia de diversificação inclui discussões com vários países da África Austral para potencialmente importar ovos”, afirmou o gerente do Grupo SPAR na África do Sul, Jacques Roets, citado pela Reuters.
Dos vários países da Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral (SADC) está Moçambique que tem a vantagem de partilhar fronteira com a África do Sul. Todavia, questionado sobre se o empresariado nacional estará à altura de satisfazer a demanda do país vizinho, a Confederação das Associações Económicas (CTA) mostrou muitas reservas.
Em entrevista à “Carta”, o vice-Presidente do Pelouro de Agronegócio, Nutrição e Indústria Alimentar na CTA, Yacub Latif, disse que os agentes económicos moçambicanos não estão em condições de agarrar a oportunidade de fornecer carne de frango e ovos à África do Sul, pois não produzem o suficiente mesmo para abastecer o mercado interno. “Contudo, há empresas que podem fornecer carne de frango e ovos, mas não vão satisfazer a demanda”, observou o empresário.
Latif acrescentou que, perante o défice na produção interna, o país tem recebido muita carne de frango e ovos importados de vários países, com destaque para África do Sul. Nesse âmbito, o nosso interlocutor deixou claro que a crise na África do Sul vai também afectar o mercado nacional.
Sobre a falta de capacidade de produção e de abastecer o mercado e ficar com excedentes para exportar, o empresário apontou, de entre vários factores, as dificuldades de acesso ao financiamento e o seu elevado custo, bem como as questões que afectam a competitividade ao longo da cadeia de valor, como o custo da ração.
Como solução, defende que o Governo crie um Fundo, à semelhança do programa SUSTENTA, virado para o sector avícola, que seria o catalisador do desenvolvimento da avicultura nacional. “Nós não pedimos apoios financeiros, não somos mendigos. O que queremos é ter um financiamento acessível, cujas taxas de juro estão abaixo de 20% para fazer negócio”, afirmou a fonte.
Além de financiamento, a fonte disse que propôs ao Governo a construção de incubadoras, matadouros, fábricas de ração e de aviários com equipamentos cuja matéria-prima seria local, em cada província, promovendo o conteúdo local. O avicultor defende ainda a massificação de acções de formação para os novos actores acerca das potencialidades do sector e de formas como produzir frango e ovos, bem como a aposta na criação de novas associações e cooperativas, como instrumento de agregação de valor.
Para que a gripe aviária na África do Sul não atinja o país, o Governo emitiu, através do Ministério da Agricultura e Desenvolvimento Rural (MADR), a 06 de Outubro corrente, uma nota proibindo a “importação de aves domésticas e selvagens, bem como carnes frescas ou congelados destas aves, pintos de um dia, ovos férteis e de consumo, produtos avícolas para uso na alimentação animal ou para fins agrícolas ou industriais”.
Aliado a este apelo, o nosso entrevistado exortou os avicultores para a necessidade de reforço de medidas de segurança nos seus aviários, nomeadamente, proibir a entrada de pessoas não autorizadas e exigir a desinfecção de equipamento de protecção para o pessoal que tem acesso aos aviários. Na África do Sul, a gripe aviária afecta principalmente as províncias de Gauteng, North West, Western Cape, Mpumalanga, Free State, Kwazulu Natal e Eastern Cape. (Evaristo Chilingue)
Uma delegação moçambicana chefiada pelo Governador do Banco de Moçambique, Rogério Zandamela, participa em Marrakech, no Reino de Marrocos, de 09 a 15 de Outubro corrente, nas Reuniões Anuais do Grupo Banco Mundial (BM) e do Fundo Monetário Internacional (FMI), em Marrakech, no Reino de Marrocos. Esta é a primeira vez em 50 anos que as reuniões anuais do FMI e do Banco Mundial são realizadas no continente africano, num contexto da falta de desenvolvimento significativo, apesar de décadas de programas económicos por parte das duas instituições. A situação é aliada ao coro crescente de críticas de que as nações mais pobres estão sub-representadas nas duas instituições.
As Reuniões Anuais do BM e do FMI reúnem Ministros das Finanças e do Desenvolvimento, Governadores de Bancos Centrais, Organizações Internacionais, executivos do Sector Privado, representantes de organizações da sociedade civil e académicos para discutir assuntos relacionados com financiamento concessional, bem como as opções para fazer face às vulnerabilidades crescentes da dívida e o seu processo de reestruturação.
A transição energética para energias mais limpas com vista a reduzirem as emissões de carbono; as perspectivas económicas mundiais, a erradicação da pobreza, e a inovação nos meios de pagamento e segurança da infra-estrutura tecnológica fazem igualmente parte da agenda do encontro de Marrakech.
A delegação moçambicana participará de diferentes encontros, com destaque para as Reuniões Estatutárias, incluindo a Constituência Africana no Banco Mundial e no Fundo Monetário Internacional; a Plenária das Reuniões Anuais; a Palestra de Alto Nível sobre Desenvolvimento de Capacidades para o Empoderamento Económico de África no meio de Choques Compostos; a Reunião do African Caucaus; e a Reunião dos Ministros das Finanças e dos Governadores dos Bancos Centrais da Commonwealth, incluindo encontros bilaterais com destaque para Departamento Africano do FMI.
O Governador do Banco de Moçambique participará ainda como Orador na Mesa Redonda sobre Insustentabilidade da Dívida Soberana no Sul Global. À margem das Reuniões Plenárias, o vice-Ministro de Moçambique, Amílcar Tivane, participa do Seminário sobre Minerais Críticos para Transição Energética com vista a partilhar a visão do país para a sua exploração e aproveitamento.
Para o presente ano, o tema central das Reuniões Anuais é “Acção Global, Impacto Global”, em torno das incertezas quanto aos compromissos da comunidade doadora internacional para financiamento das actividades e iniciativas das agendas globais de desenvolvimento que visem minimizar, bem assim reverter a acção climática, o aumento da dívida externa, redução de recursos domésticos e a consequente desaceleração das economias emergentes e das nações mais desenvolvidas.
No global, prevê-se a presença de 12 participantes, incluindo 190 delegações lideradas pelos ministros das Finanças e governadores dos bancos centrais, bem como executivos do sector privado em todo o mundo.
O Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial reúnem-se em Marrocos semanas depois de um poderoso terramoto ter matado quase três mil pessoas e causado 11.7 biliões de dólares em danos, e ter ameaçado inviabilizar o evento. No rescaldo do terramoto, o FMI aprovou um empréstimo de 1.3 mil milhões de dólares para ajudar a reforçar a sua preparação e resiliência contra desastres naturais. As últimas reuniões anuais do FMI e do Banco Mundial realizadas em África tiveram lugar em 1973. (Carta)
As reuniões anuais do Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional (FMI) devem ocorrer em Marrakech, Marrocos, até dia 15 deste mês. A cidade e o país ainda estão a recuperar-se de um terremoto devastador no início de Setembro. De acordo com o economista guineense Carlos Lopes, professor da Mandela School of Public Governance da Universidade de Cape Town, hospedar essas reuniões no continente africano pela primeira vez em meio século sob tais circunstâncias carrega imenso simbolismo, servindo como uma demonstração de resiliência.
As duas instituições estão cada vez mais a enfrentar questões sobre a sua relevância para enfrentar os desafios globais actuais. Uma de suas respostas foi comprometer-se a desempenhar um papel mais proeminente na resposta climática global.
O apelo à reforma do FMI e do Banco Mundial é particularmente urgente para África, onde os países exigem maior acesso ao financiamento público e privado e alívio da dívida. Um sistema financeiro transformado é essencial para apoiar o crescimento sustentado que beneficie a todos e que reforce a resiliência climática.
Para o professor Carlos Lopes, infelizmente, muitas fontes de financiamento, incluindo as do Banco Mundial e do FMI, não atendem adequadamente às necessidades específicas das nações africanas.
Para ser eficaz, o apoio financeiro à África deve ter várias qualidades: acessibilidade, confiabilidade, adequação e sensibilidade à vulnerabilidade climática do continente. Também deve ser adaptável para lidar com as persistentes crises de dívida e os desafios de liquidez enfrentados por vários países africanos.
Várias propostas políticas foram apresentadas, algumas dos próprios países africanos. Alguns estão estabelecidos num relatório recente com o qual me envolvi pela African Climate Foundation sobre a reforma da arquitectura financeira global.
O Grupo Consultivo Africano e o Caucus Africano dentro do FMI e do Banco Mundial, diz Carlos Lopes, estão a expressar expectativas significativas sobre os resultados de Marrakech. Isso reflecte o optimismo cauteloso entre os africanos, cansados de promessas não cumpridas ao longo dos anos. As decisões tomadas em Marrakech serão um teste decisivo da vontade do FMI e do Banco Mundial de reformar.
A África é tratada injustamente
O continente africano possui oportunidades promissoras para energia limpa e é rico em recursos minerais essenciais para a transição ecológica. No entanto, o financiamento muitas vezes o ignora ou se concentra nas exportações em vez da transformação económica local.
Impor uma abordagem política uniforme aos países africanos só piorou as crises, limitando o seu espaço político. Por exemplo, a África deve passar por processos longos e rigorosos para justificar porque precisa de recursos para apoiar certos projectos verdes. Essa adesão a princípios macro-económicos ortodoxos específicos é menos rigorosa quando aplicada aos países mais ricos. Mas é inflexível para países africanos vulneráveis.
O relatório recente da African Climate Foundation identificou inúmeras falhas no financiamento, bem como as razões pelas quais a África sofre mais do que a maioria para acessar a liquidez. Descobrimos que grande parte do financiamento é direccionado para esforços de mitigação, como o aumento da área de florestas. Há pouca atenção à adaptação, que é uma prioridade para o continente. A mitigação tende a ser mais lucrativa para financiadores e credores.
O professor Carlos Lopes chama atenção para o comportamento das agências de classificação que elevaram as taxas de juros para os países africanos. Isso forçou a maioria dos países a fundamentar as suas necessidades de financiamento além do razoável, apesar de ter as menores taxas de inadimplência na dívida de projectos de infra-estrutura em todo o mundo.
Os fluxos estão a ser prejudicados por termos restritivos, comercialização de financiamento climático, altas taxas de juros, compromissos não cumpridos de financiamento climático, mercados de carbono anti-éticos e especulativos, declínio da assistência ao desenvolvimento no exterior e rotulagem do mesmo dinheiro que "financiamento climático".
A agenda de reformas
Os países africanos estão activamente envolvidos na agenda de reformas. Por exemplo, a declaração da Cimeira Africana do Clima em Nairobi propôs formular a abordagem ao investimento climático no continente e consolidar uma posição africana unificada sobre o financiamento climático no caminho para a COP28.
Várias outras propostas também estão a ser consideradas. Neste âmbito, inclui-se uma revisão abrangente do sistema de cotas do FMI, com a potencial inclusão de uma terceira cadeira dedicada à África. As cotas do FMI reflectem o tamanho relativo de um país na economia global. Eles são usados para determinar a estrutura financeira e de governança do fundo.
Inclui-se também uma reavaliação do uso de Direitos Especiais de Saque (SDRs). Os SDRs são usados pelos países membros do FMI como parte de suas reservas cambiais. Dada a participação marginal da África, as partes interessadas estão a exigir ao FMI para realocar US$ 100 biliões para aliviar as pressões de liquidez após a COVID-19.
O FMI poderia também tomar medidas adicionais, ajudando a lidar com a dívida, através da suspensão das sobretaxas. As sobretaxas do FMI são taxas destinadas a desencorajar o uso prolongado de fundos do FMI. Mas isso coloca um fardo injusto sobre os países pobres que precisam de recursos.
Um clube de devedores soberanos - ou parcerias semelhantes - entre países devedores também pode ser benéfico. Tal clube ajuda a aumentar a posição de barganha para obter empréstimos a juros baixos.
Enquanto isso, o Banco Mundial enfrenta o seu próprio conjunto de desafios. O banco deve concentrar-se em fornecer financiamento mais barato e disponibilizar mais fundos como parte de sua busca para integrar sustentabilidade, resiliência e inclusão no Roteiro da Evolução.
Também deve reavaliar o seu modelo operacional, facilitando o acesso dos fundos dos países africanos e dando-lhes mais voz na alocação de fundos. O banco deve explorar abordagens inovadoras para apoio financeiro e desenvolver novos instrumentos financeiros adaptados às necessidades em tempo real dos mutuários, por exemplo, apoiando a agricultura inteligente.
Num artigo publicado no ″The Conversation″, o professor guineense Carlos Lopes lembra que o relatório da African Climate Foundation mostra que a arquitectura financeira global diminui a soberania fiscal da África e a capacidade de pagar pela própria acção climática.
Por outro lado, o sistema tributário internacional perpetua desequilíbrios históricos de poder. Favorece os interesses comerciais das nações ricas e empurra a África para as margens. Implementar regulamentos financeiros mais robustos e transparentes é essencial para aumentar o número de participantes e instrumentos no mercado financeiro. Mas isso deve ser feito por meio de melhores regras que promovam uma variedade de serviços financeiros e reduzam seu custo.
A legislação global para proteger as bases tributárias das economias africanas de incentivos fiscais e brechas legais usadas por corporações multinacionais poderia combater a saída de capital da África através do sistema bancário internacional.
Além disso, conclui Carlos Lopes, o desafio dos fluxos financeiros ilícitos deve ser repensado, pois a responsabilidade dos países que recebem esses fundos foi negligenciada. (The Conversation)
O início da votação na capital do país foi caracterizado por enchentes e lentidão, uma situação que deixou enfurecida boa parte dos eleitores que decidiu exercer o seu direito de voto logo nas primeiras horas.
Uma ronda feita pela “Carta” por algumas Assembleias de Votos instaladas na zona cimento do Município da Cidade de Maputo constatou haver Escolas que registavam longas filas e alguma desorganização. É o caso da Escola Primária do 1° e 2° Graus 16 de Junho, onde vimos filas longas e alguma desorientação dos eleitores por falta de assistência.
Ao nosso jornal, Montel Hazel, um dos eleitores que se encontrava na fila, disse existirem, aliás, salas vazias em que os escrutinadores se davam ao luxo de sentar porque não recebiam eleitores.
“Neste local não há ninguém para encaminhar os eleitores, eles começaram a trabalhar às 07h00 e já são 09h00 e, até agora, ainda não fui atendido. Eu vivo aqui próximo à escola e devido à lentidão fui duas vezes à casa e quando retornei vi que a fila não anda”, contou.
Encontramos ainda Sandy Canji, acompanhada pelo seu esposo e filho de três anos. Aborrecida, exigia prioridade ou que fossem criadas condições para pelo menos ter um local para os eleitores sentarem e aguardar o momento de votar.
Nesta Escola, havia alguma agitação, com alguns eleitores a exigirem aos observadores para que ajudassem a organizar a fila dos idosos e que definissem a partir de que idade a pessoa é considerada idosa, pois havia casos de pessoas com 50 anos que já estavam a invadir a fila dos idosos. Entretanto, a agitação não merecia alguma atenção da Polícia que, nas suas palavras, só podia intervir em casos de agressão física.
A nossa reportagem seguiu até à Escola Secundária Josina Machel, local onde o Chefe de Estado e os Líderes dos dois principais partidos da oposição depositaram os seus votos. Aqui, o cenário não era diferente, pois, encontramos várias salas com enchentes, sendo que, numa delas, havia confusão, protagonizada, sobretudo por idosos, que viam os seus direitos desrespeitados pelas altas individualidades, pois, os órgãos eleitorais priorizavam estes em detrimento das pessoas da terceira idade.
“Penso que aqui deviam ter criado condições para haver uma sala para a votação das altas individualidades. Eu cheguei aqui às 07h00 e já são quase 10h00 e, até aqui, não consegui votar, mesmo estando na fila dos idosos. Ou melhor, já nem sei se esta fila existe porque há uma grande confusão. O presidente da mesa de voto sempre sai e escolhe o mais idoso e deixa os que ele acha que não são, por isso todos decidimos nos aglomerar na porta para exigir que nos deixem entrar”, revelou Filipe de Morais.
“Acho que se devia parar o processo nesta sala e organizarem melhor a fila e só daí podemos dar continuidade. Aqui nada anda, nem a fila dos idosos e nem a fila normal, até grande parte de nós está a pensar em desistir porque os escrutinadores estão aqui a criar um ambiente para desistirmos”, disse Jilon Jualson.
Escalamos ainda a Escola Primária 03 de Fevereiro, onde ficamos a saber que o processo de votação arrancou às 07h00, mas tal como noutras escolas, existiam longas filas, embora os eleitores garantissem que o processo era célere.
“Cheguei aqui às 09h00 e tenho prioridade porque estou grávida, mas por causa do número de idosos aqui existente, já passa uma hora e ainda não consegui votar. O processo está a andar, não como gostaríamos, mas eles estão a fazer o seu máximo para que não seja lento”, disse Vanda Moura.
Já na Escola Secundária da Polana, local onde também votam diferentes titulares de órgãos de soberania e órgãos públicos, a organização é um pouco diferente dos outros locais, pois, logo à entrada, é possível ver alguns escrutinadores responsáveis por dirigir e indicar as mesas de voto para quem tenha alguma dúvida. Porém, o cenário de enchente e lentidão também caracterizava as diferentes Mesas de Votos.
Em duas mesas de voto encontramos filas enormes, eleitores em pé há mais de duas horas e a cada minuto um grande número de pessoas que desejam votar. “Estou aqui desde as 08h00, a nossa fila é a mais longa e é a que menos anda. Não sabemos o que está a acontecer lá a frente, mas posso arriscar em dizer que aquele pessoal que está aqui a trabalhar contribui para a lentidão e, para piorar, temos que aguentar isso em pé”, detalhou Bernardo Foquisso. (M.A.)
Passam mais de cinco horas desde que iniciou, nas 65 autarquias do país, a votação, no âmbito da realização das VI Eleições Autárquicas, agendadas para esta quarta-feira, 11 de Outubro de 2023.
Dados colhidos pela “Carta” na manhã de hoje indicam já terem sido registados os primeiros casos de ilícitos eleitorais, nas cidades da Beira (Sofala), Nampula, Gurué (Zambézia) e na vila de Catandica, na província de Manica.
Na Beira, o primeiro caso foi registado no bairro da Cerâmica, onde o Vice-Presidente de uma das Mesas de Voto foi flagrado com boletins de voto já preenchidos a favor do partido no poder, Frelimo. Na mesma autarquia, até às 09h30m, havia Assembleias de Voto que ainda não tinham entrado em funcionamento no bairro de Inhamizua.
Já na cidade de Nampula, um membro da Mesa de Voto foi detido, após ajudar um agente da Unidade de Intervenção Rápida (UIR) a introduzir 10 boletins de voto já preenchidos a favor da Frelimo, na Escola Primária Completa Comunitária 1º de Janeiro.
Ainda na terceira maior cidade do país, houve registo de tumultos na EP1 Belenenses, devido a lentidão dos Membros das Mesas de Votos (MMV) no processo de identificação do número de inscrição dos eleitores, facto que tem originado longas filas.
Em Gurué, na província da Zambézia, há registos de tumultos, protagonizados pela Polícia. Em causa está a apreensão, pelos membros da Nova Democracia, de urnas cheias de votos já preenchidos a favor da Frelimo, naquela autarquia do país. Após ser accionada, a Polícia abriu fogo contra os cidadãos, o que causou pânico geral.
Em Catandica, província de Manica, foi flagrado um delegado de candidatura da Frelimo com três boletins de voto a favor do partido no poder, na Escola Básica de Sanhathunze. Na vila de Marracuene, província de Maputo, há relatos de haver eleitores cujos nomes constam em mais de uma Mesa de Voto, na Assembleia de Voto instalada em Mumemo-15 de Agosto.
Ainda em Marracuene, há relatos de haver bloqueios ao registo/credenciação de delegados de candidatura dos partidos da oposição. Situação idêntica é relatada no Município da Cidade da Matola, província de Maputo, onde houve igualmente demora na afectação dos Membros das Mesas de Votos, indicados pela oposição.
Em declarações aos órgãos de comunicação social, após exercer o seu direito cívico, Carlos Matsinhe, Presidente da Comissão Nacional de Eleições, recusou-se a comentar estes factos, alegando que os moçambicanos devem se concentrar no dia da votação e não nos momentos que antecederam este momento.
“Não há razões para termos quaisquer dúvidas de que o processo está bem organizado e pode ser realizado com muito sucesso”, defendeu o Bispo da Igreja Anglicana.
Refira-se que o fantasma da fraude assombra as VI Eleições Autárquicas desde o decurso do recenseamento eleitoral, fortemente contestado pelos partidos da oposição, após o registo de casos de recenseamento clandestino de eleitores, com envolvimento de gestores do STAE e de líderes do partido Frelimo.
Lembre-se, por exemplo, da demissão do Director Distrital do STAE de Ribáuè, na província de Nampula, por comandar um recenseamento eleitoral ilícito em casa de um membro da Frelimo, na calada da noite. Recorde-se também da criação de um grupo de WhatsApp, pelo Director Distrital do STAE da Beira, com a intenção de bloquear o recenseamento de membros da oposição. Neste caso, o indivíduo nunca chegou a cessar funções.
Aliás, três dias depois do fim do recenseamento eleitoral, a Renamo exigiu, em conferência de imprensa, a anulação e auditoria do processo, alegando que, durante os 45 dias de registo dos eleitores, milhares de moçambicanos, identificados como membros da oposição, foram impedidos de se recensear. Igualmente, disse que a Frelimo transportou diversos cidadãos de distritos não autárquicos para recensearem-se em distritos com autarquia, como forma de encher as urnas. (Carta)